Eduardo Van Dick tinha um problema, seu processador estava quebrado.
Era uma manhã fria, mas o sol viria e toraria toda a lataria dos enormes aranha-céus vivos de Beirute, quando todos estaria atrasados para seus café-da-tarde, porém não poderiam ainda terminar seus turnos nas fábricas de dados. Eduardo não estava entre eles, ele era um acadêmico, ou o que restou deles, neste mundo louco de ciborgues, beatrônicos e animais-humanóides, ele escrevi com certa irregularidade para um Diário do Fim do Mundo, uma faculdade disposta a recolher algumas peças de conhecimento em Humanidades para depois enviá-las para a Grande Mãe Data, que escolheria o que significava para a vida fraterna ou não.
Porém, Van Dick tinha o problema de estar quebrado, ele não sabia o porquê. Se foi a sua noitada jogando Dom Dons ou a comida gordurosa processada em tonéis de carvalho, nada disto parecia responder seu principal problema:
-Meu processador parou, Tio - disse o jovem magrelo
-O quê? - riu o forte homem negro a sua frente, seu tio Amálio estava ali para buscar alguns quadros com fotos, valiam fortunas nos hipersites - Você está errado, Eduardo, isto é impossível... Como você está aqui, andando e falando se ele está quebrado?
-Não sei... Mas, olha só - abriu o peito e próximo do estômago, nada lá, nem um tipo de luz, barulho ou bugiganga louca, apenas o mais puro silêncio.
-... Olha, é melhor chamarmos alguém, talvez a polícia
-Sério? É tão grave?
-Bem, eles cuidam disto... Você deveria contar a sua mãe e...
-Não, tudo bem, eu chamo, obrigado tio!
Van Dick chamou a polícia, com a pouca coragem que tinha, apenas depois de perguntar a mesma coisa para uma colega e comentar com um professor. Duas horas depois, andando pela grama do campus politécnico, ele vê dois policiais, uma Quero-quero humano e um ciborgue:
-Olá, senhor... Eduardo Van Dick (eles usaram o scanner nas miras foscas no meio de suas testas). Estamos aqui para levá-lo
-O quê?
-Sim, o senhor possui problemas de manutenção - disse o ciborgue, sabendo que era difícil que um cara de metal como o jovem confiasse em um "mudado". - Será tudo coberto pelo Estado.
-... Bem, então, está bem... Que a Grande Mãe me guarde!
-Amém! - responderam, estranhamente, ambos
Eduardo foi sendo levado para uma nave urbana, porém, quando ele ia saindo, viu uma moça, uma moça-coelho de lindas formas, porém, jovem e cabelos azuis, ressaltando mais as poucas coisas animais. Ele a olhou se sentiu a paixão, que todo o dia tinha por alguém nos autotrens, sempre diferente, Eduardo pensou ter achado a resposta, pensou que o processador tinha funcionado e...
Entrando dentro do veículo, dirigiram por algum tipo de autoestrada estranha, que os repórteres não mostravam... Senti alguém me olhando, creio que estou sendo vigiado.
O rapaz passou por uma triagem e, nu ao mostrar seus ainda poucos implantes ciborgues, foi trazido para dois Guardiões de Data. Eles eram normais, digo, pessoas normais e olharam o herói, dizendo:
-Não há mais nada no seu processador. Isto é uma mentira e você será multado por perder o tempo do Estado.
O jovem Eduardo arrependido e humilhado, voltou pra casa, ficou uma semana de cama, um pouco triste, mas, pode voltar pro emprego... Como se nada tivesse acontecido.
...
Eu sei o que houve, meu nome é Felícia Van Dick e eu sou a sua esposa. Ele não se lembra, o mundo não se lembra bem, mas, a mãe sabe, aqueles dois também e o futuro nestas páginas...
Sinto uma mão robô me apertar o ombro. O Caçador-vermelho
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sábado, 10 de fevereiro de 2018
quinta-feira, 3 de agosto de 2017
Carta ao leitor
Toda a história tem um fim
Um ponto
O primeiro verso, primeira sílaba
das últimas linhas, parágrafo dos últimos capítulos
É falsamente o mais difícil
Lê-lo o é
Saber dele o é
O autor nunca parece tocar na verdadeira obra
Um conto, uma poema, um romance
É no leitor que, palavra por palavra esperada, sentida
Corta na carte e traz
Pingo por pingo
A verdade daquilo que passou
O sol é uma estrela de milhares
O som do pássaro canta
Aonde o crepúsculo daquele apaga
E nas primeiras gotas de chuva
O autor a pena desce na mesa
Olha no horizonte e se espanta
Nunca poderei eu completar a minha obra
Pois, nunca leitor de nós
Serei.
Um ponto
O primeiro verso, primeira sílaba
das últimas linhas, parágrafo dos últimos capítulos
É falsamente o mais difícil
Lê-lo o é
Saber dele o é
O autor nunca parece tocar na verdadeira obra
Um conto, uma poema, um romance
É no leitor que, palavra por palavra esperada, sentida
Corta na carte e traz
Pingo por pingo
A verdade daquilo que passou
O sol é uma estrela de milhares
O som do pássaro canta
Aonde o crepúsculo daquele apaga
E nas primeiras gotas de chuva
O autor a pena desce na mesa
Olha no horizonte e se espanta
Nunca poderei eu completar a minha obra
Pois, nunca leitor de nós
Serei.
quinta-feira, 15 de outubro de 2015
Cartão postal
Sempre desvio o olhar quando uma pintura me fita, ou foto ou qualquer coisa cria da nossa repetição.
-Qual repetição, kappa?
Aquela que sempre queremos ter, quando fotografamos e pintamos, ou mesmo olhamos putaria na internet ou cartões de banco. É nossa necessidade de guardar coisas, típica da sociedade pós-industrial e blá blá blá blá
-Olhava para ele, mas, não entendia mais o que ele dizia...
Como é? O que está falando Efigênia?
-Não mais sabia se o que sentia era amor, ou simples enjoo de seus papos intelectuais, suas ligações a noite para me pedir desculpas ou minhas carícias por ter xingado o seu trabalho pífio.
... Bem, como continuo em meu devaneio, creio que apenas a Literatura é a real das artes, a maestria da expressão, talvez, com algo do teatro, mas, bem pouco e sem esta celebração capitalista. Quando eu estava indo ao Museu Municipal vi uma bela pintura de Solano do século XV, da Renascença, linda, ao lado, uma escultura à la Duchamp, crítica da sociedade, incrível, fenomenal!
-Mas, você preferiu ir a um museu do que vir receber da volta da casa de meus avós?
É interessante como a gigantesca magnificência dos temas, das cores, das voltas do pincel buscando a perfeição de uma fotografia - ao qual os jovens hoje tem em suas câmeras portáteis - conversava com aquelas formas incríveis e contestadoras daquele pinico. Representação e crítica! Ao mesmo lado! Isto sim é a busca pelo secreto do ser humano!
-Raul... Parece que não me escuta mais! Meus avós tinham morrido!
E então, atravessando a rua paralela com a central, vi algo que me deixou consternado, um grupo de jovens dançando estas danças novas, danças de negros vindas dos ianques. É detestável como a Cultura Nacional é imbuída destes falsos ídolos, como nós, tupinambás, podemos querer que nosso lugar no Palco das Nações seja respeitado se nem isto, se nem esta capacidade de criar nacionalmente e valorizar, conseguimos? Aonde estão Chico? Betânia? Pedro de Lara? Benito de Paula? Aonde está O BRASIL?
-Vó Maria e Vô José, morreu um na terça e outro na quinta... Enterro no domingo, volta na segunda... Incrível história, parece algo de filme, né?
Interessantemente, a produção da cultura ou da verdadeira erudição, parece, a mim, o verdadeiro caminho para a criação de uma nação de íntegros homens, não mais bandidos, não mais mulheres solteiras com crianças ranhenta pelas ruas, não mais bolas batendo na minha janela. E não vamos falar como nós não podemos nos defender.
-... Olho para sua face, Raul, e apenas vejo um homem velho
... Desculpe, o quê? O que disse Efigênia?
-Você, com suas teorizações, seus sonhos de escritor, seu trabalho medíocre nos Arquivos Públicos, é tudo tão estranho... Aonde está a África? Aonde está a Itália? Aonde estão os sonhos de ir para a Guerra e voltar com uma medalha azul? Não mais entendo você Raul, você ficou velho, perdeu os sonhos
Apenas sonho com um Brasil melhor, algo como nação! Um projeto maior que minha vida, uma justiça para todos!
-E aonde está a justiça se nem mesmo você consegue falar comigo?
Como?
-... Adeus, Raul, por favor, não atenderei mais nossas ligações
... E ela saiu daquela mesa de lanchonete
E, pela primeira vez em meses eu disse:
-Efigênia!
Ela saiu, correndo. Percebi então, e só então, que era apenas uma ilusão de minhas memórias falando comigo e mesmo este Eu Narrativo que estou usando agora, mesmo ele, era apenas uma doce fuga. Incrível como o mundo das idéias preenche os espaços vazios quando estamos vazios, e incrível como o que eu sinto e sentia por ela naqueles tempos era intenso.
Porém, acabou. Efigênia não existia, ela era apenas meu motor de ideias, que em algum momento entre o ali e o acolá eu suprimi pela vida adulta. Crescer significa deixar estas coisas pra lá, e estou deixando...
Então, mais que de repente, me veio de súbito uma última ideia:
-Será que... Talvez
-...
-... Olá, meu nome é Raul e eu gostaria, gostaria de pedir algo a você autor deste conto: que eu seja apenas uma ideia e que Efigênia saia daquela foto, amarelada pelo tempo, mas ainda de camisa xadrez mostrada. Por favor, tranque a mim neste texto e liberte ela, como um último ato de amor.
-...
Então olhei em volta do meu escritório, e minhas mãos estavam sumindo, na janela, na luz matutina no quintal, eu vi Efigênia. Ela sorriu pra mim, piscou e disse
-Eu venci?
Não mais podia responder, o autor me matou, o texto acabou e o ponto final.
-Qual repetição, kappa?
Aquela que sempre queremos ter, quando fotografamos e pintamos, ou mesmo olhamos putaria na internet ou cartões de banco. É nossa necessidade de guardar coisas, típica da sociedade pós-industrial e blá blá blá blá
-Olhava para ele, mas, não entendia mais o que ele dizia...
Como é? O que está falando Efigênia?
-Não mais sabia se o que sentia era amor, ou simples enjoo de seus papos intelectuais, suas ligações a noite para me pedir desculpas ou minhas carícias por ter xingado o seu trabalho pífio.
... Bem, como continuo em meu devaneio, creio que apenas a Literatura é a real das artes, a maestria da expressão, talvez, com algo do teatro, mas, bem pouco e sem esta celebração capitalista. Quando eu estava indo ao Museu Municipal vi uma bela pintura de Solano do século XV, da Renascença, linda, ao lado, uma escultura à la Duchamp, crítica da sociedade, incrível, fenomenal!
-Mas, você preferiu ir a um museu do que vir receber da volta da casa de meus avós?
É interessante como a gigantesca magnificência dos temas, das cores, das voltas do pincel buscando a perfeição de uma fotografia - ao qual os jovens hoje tem em suas câmeras portáteis - conversava com aquelas formas incríveis e contestadoras daquele pinico. Representação e crítica! Ao mesmo lado! Isto sim é a busca pelo secreto do ser humano!
-Raul... Parece que não me escuta mais! Meus avós tinham morrido!
E então, atravessando a rua paralela com a central, vi algo que me deixou consternado, um grupo de jovens dançando estas danças novas, danças de negros vindas dos ianques. É detestável como a Cultura Nacional é imbuída destes falsos ídolos, como nós, tupinambás, podemos querer que nosso lugar no Palco das Nações seja respeitado se nem isto, se nem esta capacidade de criar nacionalmente e valorizar, conseguimos? Aonde estão Chico? Betânia? Pedro de Lara? Benito de Paula? Aonde está O BRASIL?
-Vó Maria e Vô José, morreu um na terça e outro na quinta... Enterro no domingo, volta na segunda... Incrível história, parece algo de filme, né?
Interessantemente, a produção da cultura ou da verdadeira erudição, parece, a mim, o verdadeiro caminho para a criação de uma nação de íntegros homens, não mais bandidos, não mais mulheres solteiras com crianças ranhenta pelas ruas, não mais bolas batendo na minha janela. E não vamos falar como nós não podemos nos defender.
-... Olho para sua face, Raul, e apenas vejo um homem velho
... Desculpe, o quê? O que disse Efigênia?
-Você, com suas teorizações, seus sonhos de escritor, seu trabalho medíocre nos Arquivos Públicos, é tudo tão estranho... Aonde está a África? Aonde está a Itália? Aonde estão os sonhos de ir para a Guerra e voltar com uma medalha azul? Não mais entendo você Raul, você ficou velho, perdeu os sonhos
Apenas sonho com um Brasil melhor, algo como nação! Um projeto maior que minha vida, uma justiça para todos!
-E aonde está a justiça se nem mesmo você consegue falar comigo?
Como?
-... Adeus, Raul, por favor, não atenderei mais nossas ligações
... E ela saiu daquela mesa de lanchonete
E, pela primeira vez em meses eu disse:
-Efigênia!
Ela saiu, correndo. Percebi então, e só então, que era apenas uma ilusão de minhas memórias falando comigo e mesmo este Eu Narrativo que estou usando agora, mesmo ele, era apenas uma doce fuga. Incrível como o mundo das idéias preenche os espaços vazios quando estamos vazios, e incrível como o que eu sinto e sentia por ela naqueles tempos era intenso.
Porém, acabou. Efigênia não existia, ela era apenas meu motor de ideias, que em algum momento entre o ali e o acolá eu suprimi pela vida adulta. Crescer significa deixar estas coisas pra lá, e estou deixando...
Então, mais que de repente, me veio de súbito uma última ideia:
-Será que... Talvez
-...
-...
Então olhei em volta do meu escritório, e minhas mãos estavam sumindo, na janela, na luz matutina no quintal, eu vi Efigênia. Ela sorriu pra mim, piscou e disse
-Eu venci?
Não mais podia responder, o autor me matou, o texto acabou e o ponto final.
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