sexta-feira, 1 de abril de 2011

Voando num balão #Agentes do Caos

  Que dia ruim.
 Estou aqui, no meu balão, voando pelas terras, sempre indo e vindo pela ali e por aí; tenho uma luneta, um brinquedo de gato e um caderno escrito a caneta nanquim. Vejo os prédios sendo erguidos, assim como as grandes nuvens estratus, aquelas só horizontais, todos castelos, muralhas, um pra cima outro pra baixo;
 E eu continuo indo
 Caderno de nanquim, prum semi-analfabeto, uso pra lembrar, ele me lembra moça morena, e pequena loira, a morena era professora, letrada na Polônia, me mostrou o balão -meus pés- e me deu uma jóia, pequena pérola loira que cabia no mundo dos meus braço e que eu levantava e fingia que voava... Acho que eu é que me divertia. Perdi meu caderno de nanquim.
 Brinquedo de gato, pro velho de cinco dezenas de idade, uso pra brincar, lembrar do tempo em que cuidava de leão, fazia jogos e pulava com nariz vermelho e cara branca, na prisão mental duma lona era o mais triste e mais "alegrante" dos atores simples e pobres da terra, simples e pobre, da qual fiz parte. Cuidei de leões, o brinquedo de grandes gatos, como um osso de borracha, já perdi o gosto do brincar, quando tem um descuido, quando esquece algo e deixa pra lá -na mente esquece algo-, perde quem amou... Se há amor, já aqui não há.
 Com a luneta eu vejo o mundo, as coisas que podemos ver, ouvir, falar dele é o que vivemos, nada de imaginar mundos... Eles imaginam mundos e são apenas mais uns, ou outros que morrem por aí... Eu não imagino mundos, eu os vivo. Vemos castelos nos conjuntos de prédios, nas águas dum rio vejo veias, sangue da terra, nuvens como grandes colunas, coisas que sustentam um céu vazio, pra mim vazio.
 Três pequenas peças, três pequenas chaves, três pedras num rio fundo.
                                                                               *
  Era numa sexta, de manhã e frio, sempre frio, não? Enfim, estava sentado no meu escritório lendo o novo gibi do Capitão Marreta, tudo tranquilo e mórbido. Tocou o telefone:
 -Nick, detetive particular!
 -Hey, Nick, preciso de você!
 -Não trabalho com estas coisas, se quer isto, ligue pros números das moças colados nos orelhões!
 -Não é isto, idiota!
 -O que é?
 -Dizem que você tem uma habilidade, um segredo que consegue guardar e que usa pra alguns trabalhos... Preciso...
 Desliguei o telefone. Sai, apertei o botão do elevador, luz vermelha pra cima, luz verde pra baixo, fui pro terraço... Cheguei lá, subi mais uns lances de escada, sai no último nível do prédio, fiquei olhando do alto toda a extensão da cidade que podia ver dali -estava cercado por uma muralha, pra fora, se pudesse ver, veria serras e favelas, um mar, praticamente; talvez eu estivesse numa ilha e não soubesse, talvez cada lugar se comunicasse como uma ilha, mas, não sei, ninguém acredita mais em sonhos, parecem apenas re-memórias, eles são só coisas que temos a noite... Porém, ninguém dá atenção ao que sonha, ninguém lembra o que sonhou as vezes por não querer lembrar o que viveu.
 Pulei, voei e não senti a queda, estava na minha banheira preta, meu velho carro beberão numa estrada vazia, segui reto, sempre reto, até encontrar o que procurava: um balão. Eu o segui e ele percebeu, vi nele o sinal no braço direito, ele corria pelo ar, eu, pela terra. Fomos assim por uns dois, três, até quatro quilômetros; chegávamos na cidade, preciso pará-lo!
 Pá! Com a 45 acertei o balão, ele começou a cair, cair e cair...
 O sol estava chato, era nove da manhã e minha testa suava a água salgada, olhei pro campinho de futebol -alguma periferia qualquer, daquelas que você vê na tv e vive nela, mas age como se vivesse em outro lugar, imaginar o seu espaço como "algo melhor" (afinal, o que você acredita é melhor mesmo)-, pessoas se reuniam em volta dele, olhavam o que acontecera, eu fiquei berrando pra darem licença e olhei pra dentro da cesta da máquina voadora: nada tinha.
 -Mas, que porra! -Gritei. Estava quase lá, quase peguei ele dessa vez.
 Pisei em alguma coisa, olhei, era uma nanquim, fiquei feliz e procurei na cesta, tinha um ossinho de peixe de borracha, devia estar perto, muito perto: dois de três! Tava com duas peças dum vaso de porcelana quebrado! Tava quase lá!
 Eu iria conseguir! Peguei e entrei no carro; meu serviço era pegar um sonho, uma mera lembrança, que fugira dum poderoso ser, um cara estranho que usava máscara de gás, sempre... Eu era Nick Charlie e estava na cola dum fantasma; você não acredita e não gosta, acha que ficção é só mais baboseira e o mundo real é mais interessante, mas até que o real pare de parecer fantástico e eu consiga ver este reflexo -que as vezes é um saco- vou continuar a ver como se estivesse num balão de hélio sobre céus e muralhas, pode ficar com a realidade se quiser, porque na maioria das vezes ela é só sua, então, não seria ela a sua ilusão?


 MUSIQUETA DA POSTAGEM

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