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quarta-feira, 20 de junho de 2012

Argonaútico – O último anjo #Agentes do Caos

Esta é a estória de uma coisa que ouvi antes de ir embora, antes de começar a viajar por aí e pelos outros. Sou o Panda Vermelho, o ser que recebeu a pela de djin e que a cada vez que matava alguém ou algo, tomava a coisa para si... Porém, eu sempre – desde que me tornei humano – me perguntei se isto era bom ou ruim... Quando era um ser racional, ou quando era criança, eu não tinha isto, porém, agora tenho... Mas, me perguntava se, eu fosse uma ”coisa ruim”, eu deveria ser a pior, não? Afinal, aprendo com a destruição, eu Sou a Destruição...
 Só que um dia, eu o achei... Tinha sentido algo estranho entrando numa cidade em que passava com minha Kombi, era uma vibração fraca, estranha... Desci a rua daquela cidade mineira antiga e empoeirada... Era noite, era escuro e tenebroso era o ar, típico, mas, não assustador...
 As luzes do farol vão correndo pelas esquinas e meus olhos vão acompanhando até aonde posso ver... De repente, ele está lá, desço do carro
Corro
Entrando pelas vielas escuras vou seguindo aquela coisa assustada, vejo restos de sangue no chão, vou chegando perto, mais perto, ali está ele!
...
-Então, o que é você?
O ser me pergunta. Magro, seco, de terno azul, dentes horríveis, no entanto, parece ainda meio-humano; meio-ser que me perguntava quem eu era, ao qual não liguei e perguntei:
 -Quem é você? – Ele estranhou, tinha falado comigo um inglês mal-falado, pensava que não entenderia esta língua, que tolo, é uma língua fácil, ao menos, pra minha idade.
-Meu nome é Fiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii, sou um Argonaútico, uma Nave de Guerra do Clã KLKLKLK
-... Seu nome é um assobio? – Eu fiquei surpreso, nunca havia visto aquilo... A quem não sabe, aquilo não era uma simples onomatopéia, é toda uma língua antiga, uma coisa mais velha, que nem eu poderia supor o que queria dizer, o que, por consequência, quebra a coisa da minha idade que disse ali em cima.
-Sim, criatura. – Eu não estava na forma de humano, mas, de semi-humano, com minha cabeça de Panda Vermelho e pelos, mas, talvez ele estivesse mais assustado pela catana que estava a segurar embainhada ainda na mão direita.
-Meu Mestre disse que isto é língua de Anjo ou Demônio, o que você é? Pensei que estavam extintos... Desde que os Invasores tentaram dominar a Terra pela primeira vez e usaram as Máquinas Angélicas para matar a todos vocês...
-Sabes muito, muito mesmo... Quem é teu mestre? –Me perguntou a criatura-anjo.
-O Dragão Branco... Sei que você sabe que ele é um dos antigos donos das Máquinas... – O anjo, no alto de sua feiura, me olhou e comprimiu os olhos secos, ele era realmente horrível...
-Sim, eu sei.
Ficamos em silêncio, ele estava encostado numa parede, havia uma luz num poste. Tudo era frio, estava um dia frio naquelas bandas, entrava na minha pele, mesmo peluda, o que era estranho.
-O que há? Não irá tentar me matar? –Perguntei finalmente.
-Você quem está com a espada. Eu não sou idiota... Qualquer um que saiba e tenha tido os mestres que você teve, merece algum respeito...
-Mas, o que faz aqui, anjo? –Falei sorrindo para ele. Algo que sempre tinha desde que me tornei humano era metidez, um tipo de soberba ao ser obedecido deste jeito que ele fez, porém, como não fui criado com leis para reprimir isto através de caretas ou frases de auto-flagelação, era um ser metido “ao natural”.
-Eu? Bem, eu estou aqui... Na verdade – o anjo sentou num paralelepípedo na rua – eu vim para morrer...
-Como? Vocês morrem... De velhos?
-Acredite, meu caro, acredite... Poucos anjos morrem de velhos, assim como os demônios... Acho que só conheci um que havia conseguido isto, um amigo meu... Enfim, eu voltei aqui para pegar isto
Ele me mostrou um pequeno cordão, ao qual se prendia um pequeno boneco.
-Isto foi de um humano ao qual chamei de filha, uma vez... Eu tinha um problema dos anjos... Eu tenho uma síndrome, um tipo de doença que se chama: “Acorde”. Fico algumas décadas ou séculos dormindo, depois, acordo e vou ficando cada vez mais velho, mais doente... Era um tipo de defesa da espécie em alguns de nós... Pena que isto fazia com que eu perdesse meus amigos, perdesse contatos... Inclusive, acabei aqui em Varginha uma vez e fui confundido... Foi engraçado... Enfim...
-Tudo bem... – Fiquei calado, pois, a Morte era algo que não entendia muito, ao menos, nesta minha fase mais humana; virei-me, caminhando para a kombi – Vou deixar que um velho morrar em paz...
-Hey! Garoto... – Me berrou o velho.
-O que há?
-Você já ouviu uma história de alguém que esteve nos campos de batalha contra as Máquinas Angélicas? – Me disse o senhor, com esperanças... Percebi que ele tinha bigodes, era estranho, a pele seca, com bigodes...
-Ouvi do meu Mestre... Como já disse, o Dragão Branco...
-Sim, sei quem é seu mestre... Porém, o Aluno já sou o que era seu Mestre?
-Ele veio das Estrelas... Isto estaria bom, não?
-Hahahahaha – riu o velho anjo – Mas, então, você me parece um ser poderoso, porém, alguém poderoso sem curiosidade, como já vi muitas vezes na minha longa vida, não vale nada.
Fiquei um pouco com raiva, mas, ouvi ele. Falou-me o senhor que tinha ajudado, durante a Guerra há milênios atrás, um certo ser de pele muito branca... Ele não era nada mais nada menos que um dos colegas de meu mestre, ao qual morava na Índia e se chamava Vedas. Ele havia contado, como o anjo fazia para mim, sobre a história de seu povo, do por quê estava ali... Disse que, quando estivesse para morrer, que o anjo contasse também aquilo; em troca, o Vedas disse que o anjo iria sobreviver aquela guerra e até oito milênios depois, e assim, o velho ganhou a sua doença:
-Sim, foi uma idiotice... Mas, já me arrependi, viver com arrependimentos é mais difícil e tolo que aceitar o erro e continuar, mesmo que isto – lá dentro da gente – seja uma mentira... – Me disse ele, quando em contou isto.
-Então, quem é Vedas? Quem é o Mestre Dragão Branco?
-O que conto para ti, meu caro, é algo sobre muita coisa... Porém, não cabe num único dia, numa única fala... O nome da história que contarei para ti, é sobre: Wille - o Povo Azul

segunda-feira, 11 de junho de 2012

A intrépida aventura do Soldado Itamar & Johan #Agentes do Caos

MUSIQUETA DA POSTAGEM


 Enquanto ele arrumava o quepe em sua cabeça, as ideias pulavam dos olhos, faziam tremer a língua.. Não era mais o mesmo que antes... Não era só o sangue que cobria o corpo do soldado - fazendo com que ele tivesse que perder mais tempo ao limpá-lo depois -, não era só a Guerra Contra os Inimigos da Nação que o incomodava... Era outra coisa, outras coisas de dentro de sua pele que não tomava banho já fazia dias e que o deixava com um cheiro de coisa velha...
 -Itamar! Venha aqui, vamos limpar isto tudo! - Chamou o Chefe, com seu bigode loiro e roupa negra.
 E lá ia o sargente Itamar, segurava uma perna, jogava na vala, outra pelo braço, mais uma queda na vala,
 Pof!
 Faziam eles quando caiam na terra, era estranho... Era o mesmo barulho que faziam os corpos dos soldados que também eram jogados na mesma vala, um lugar sem nome, sem lápide, apenas aqueles cinco soldados iriam lembrar daquele lugar, entre eles, Itamar, e claro, o Chefe.
 -Chefe, - comentou o sargento ao jogar um jovem corpo - por que estamos a jogar isto nos buracos?
 -Como assim, Itamar? Temos de enterra-los... São humanos...
 -Oras, meu Chefe, por que não eram humanos quando nós metralhamos? - E Itamar jogava mais um corpo
 -Meu caro, isto é diferente... Enquanto estavam vivos, eram nosso INIMIGOS, logo, não eram humanos...
 -Mas, então, agora, que estão mortos, eles o são?
 -Sim, pois os inimigos mortos são humanos...
 -Mas, se estão mortos, por que não deixamos eles aqui? Estou me sentindo meio mal... Não sei, estou suando demais... - Falava o soldado, que com as camisas já ensopadas, em nada parecia com os outros membros do Exército da Liberdade, que estavam bem, por ser um dia frio e por nenhum dos mortos terem reagido, o que traria algum cansaço
 -Ora, Itamar - pôs a mão no ombro do soldado o seu superior - não podemos deixar os corpos a vista pois, apesar do Inimigo ter se tornado humano quando o matamos, ele ainda é nosso inimigo, seus corpos são a prova de que existiram, o que não podemos deixar que seja mostrado depois...
 Por um momento, Itamar parou, virou-se e olhou para o comandante, disse:
 -Então, nós os enterramos para que nunca mais nos ataquem?
 -Sim
 -Então, nós os matamos duas vezes?
 -... Sim, exatamente, Itamar, nós matamos estes civis inimigos de nossa Nação e também suas Memórias, seus Histórias, suas Lembranças... É assim, meu caro, apenas assim, que Vencemos e que a  Humanidade Caminha pra adiante...
 -... Sobre os corpos dos outros?
 -Não, sobre os nossos corpos, que um dia viram poeira... E esta poeira voa, pelo ar...
 -... -Itamar ficou quieto, engoliu seco. Virou-se para trás, ao ouvir o colega falar:
 -Itamar! Tem mais dois aqui!
 Já contavam mais de 20 corpos jogados na vala. O soldado estava cansado, pegou nos pés daquele corpo, achou engraçado, ou melhor, curioso, tinha botas muito bem lustradas, deveria ser um soldado muito asseado... Pena que sua face estava queimada, e o sargento não ligou em ficar olhando os mortos, mesmo os do seu exército... No entanto, ao ver a face daquele jovem, ele lembrou-se de perguntar ao superior, que estava sendo numa pedra, comendo uma manga:
 -Mas, senhor, por que enterramos nosso homens junto com o Inimigo?
 O comandante sorriu e disse:
 -Oras, pequeno Itamar, porque nós morremos com eles, em uma guerra, sempre morre uma parte de nós...
 O jovem soldado não entendeu, porém, começou a fitar o velho bigodudo, ele sorria, sorria de um jeito estranho e assustador... Seus olhos, estavam dilatados, muito para algo comum...  Ouvia seu colega reclamar e reclamar... Mas, ele não ligava, o soldado não ligava e., pensativo, olhou novamente para o corpo com cara queimada...
           Ele tinha um belo colar no pescoço, de Santa Rosa dos Marinheiros Perdidos, um colar tão belo que o fez lembrar daquele... Daquele...  Que ganhara de sua mãe...
  Tocou o seu pescoço o soldado... Não havia colar ali... Não havia colar ali!
 Virou-se, ao ouvir uma gargalhada que dizia:
 -Oras, pequeno Itamar, porque nós morremos com eles, em uma guerra, sempre morre uma parte de nós...
 -O quê... -Disse o jovem, que via apenas o comandante rir e rir, falando:
 -Oras, pequeno Itamar, porque nós morremos com eles, em uma guerra, sempre morre uma parte de nós...
 -O que há aqui?!!! - Largou o corpo o jovem, ele fitou bem a face do morto, ninguém mais se mexia, todos os outros estavam paralisados, pareciam todos mortos; a face agora se revelava para o jovem Itamar como sendo a dele, ao qual, no desespero, ele ouviu algo do comandante:
 -... Sempre morre uma parte nós... Ou até, nós mesmo!
 Itamar olhou para o comandante, ele o retribuiu.
 Seus olhos estavam azuis, seu bigode caiu da cara, como se postiço, estava inchado...
 Um desequilíbrio, o jovem caiu na vala
 Os corpos pareciam agarrar-lhe... Itamar gritava, gritava...
 ...
 Então, o silêncio.
 ...
 "Abri os olhos, e lá estava eu: Itamar, morto"
 O jovem sai da vala, com dificuldade. A sua volta, ninguém o percebe e todos continuam a levar os corpos e jogar no buraco. Seu uniforme sujo e úmido, todo aquele frio, toda aquela cena... Tudo parece que sumiu de atormenta-lo... Ele olha para frente, na pedra aonde deveria estar seu comandante, seu exemplo de vida, ou em vida: nada vê dele, apenas uma criatura, um ser grande,
 um cão, creio que siberiano, negro ou muito azul, apenas abaixo do pescoço é branco
 as roupas são de soldado, porém, com um manto negro
 ele o olha com cara silenciosa, o soldado tenta ter pânico, mas, não consegue
 não consegue sentir nada...
 -E nem vai sentir nada mesmo... -Diz a criatura - Está vendo aquele pequeno toca-discos?
 Ao lado esquerdo do cão gigante, um gramofone, ou algo assim...
 -Sim, estou...
 -Ele está segurando tudo que você sente, não adianta ficar muito alarmado ou algo assim... Ainda deve ter umas seis horas de gravação...
 -... - Itamar fito tudo aquilo, é tudo tão estranho, pois seu corpo esta pesado, ele está um paquiderme de peso, mas, não consegue dizer muito... Não consegue sentir nada... Nunca havia percebido como sentir algo era importante, nunca mesmo... Pensou ser apenas importante estar no controle de suas emoções por toda a vida e, agora, morto, vê que nunca talvez tenha sentido nada...
 -Quem... Quem é você?
 -Eu? - Disse o cão siberiano - Me chamo Saibret, Johan Saibret e tenha um bom dia...
 -... O que...
 -Sou um Rei da Morte, ou melhor, um Ceifeiro, algo do gênero... Sabe?
 -Um anjo? Você é um Anjo do Senhor? Estou morrendo ou no Purgatório?
 -Hm... -Pôs a mão no queixo, o cão de nome Saibret - Faz tempo que não converso durante o meu serviço, então, não sei a quantas anda a Humanidade... Não sei do que você está falando... Desculpe!
 -Como assim?! -Disse o jovem, que não conseguia aumentar a voz - Como você não conhece o Nosso Senhor? Como nunca leu as Escrituras Sagradas do Livro Vermelho? Como não há aquela Luz no Fim do Túnel que..
 -Desculpe, meu amigo... - Interrompeu o ser - Você por acaso conhece o homem-macaco Goku? Conhece Sefiratis? O Senhor Reiza-Fu? Calixto? Imperatriz Andrômeda? Comodoro Oasis?
 -... Hm? Não... Mas...
 -Então, façamos assim, cada um tem os seus amigos e não precisamos misturar, ok? Um dia marcamos algo... -Levantou-se o cão, tirou de trás da pedra uma bolsa de couro, abriu e ficou mexendo nela - Mas, agora, tenho algo que fazer com você...
 -O quê... O quê... Espera!
 -Sim? -Virou-se novamente Johan e olhou Itamar, que lhe perguntou:
 -O que diabos quer comigo? O que está havendo aqui? Eu não consigo nem chorar, nem espernear... Simplesmente, não consigo...
 -Viver? Sim, não consegue fazer nada disto pois está morto, ou melhor... - O cão tira da bolsa de couro um pedaço de metal que na ponta tem uma enorme lâmina de gelo - Você está quase morto...
 -Como? Por isto eu carregava meu corpo? Aquelas perguntas, aquilo tudo que mostraram os primeiros parágrafos desta história...
 -Bem, veja bem... Tudo isto, aquele velho senhor e seus questionamentos, tudo isto era você, Você tinha as Dúvidas, morreu com elas, precisava solucioná-las... O que fiz foi respondê-las, pelo que eu via em seus olhos... Nada pessoal... - Riu o ser, ao qual o jovem disse:
 -Mas, se eu estou quase morto, por que, por que você está aqui? É do Inimigo?
 -Não, não pensa pequeno... Eu sou um Ceifeiro, me alimento de gente como você... Desculpe as palavras, mas, você está morto, basicamente... O que fiz é capturar seus últimos momentos vivo, seus últimos momentos em que seu cérebro ainda esta conservado e não apodreceu... E, bom, se você está vendo esta lâmina de gelo aqui, é a que usarei pra terminar de te matar...
 -O quê? Agora?! Mas, como assim?!!
 -Olha, não é agora... Não teria sentido, não é? - Sorriu o cão - Eu, antes de te matar, preciso fazer uma coisa, preciso me alimentar... E faço isto da seguinte forma: quero que você diga um desejo.
 -O quê? Como assim?! Você é um tipo de gênio?
 -Não, não sou... Sou algo entre um gênio e o que vocês humanos chamam de esperança, ou arrependimento... O que faço é realizar esta última coisa, em troca, fico um pouco mais vivo...
 -... Apenas isto? Tudo isto pra apenas um último desejo?
 -Sim, apenas isto.
 -E se eu não quiser? Se eu desejar ficar vivo?
 -Olha, se você quiser voltar a ficar vivo vai voltar no seu corpo morto, totalmente ferrado... Não adiante pedir pra que eu te dê um corpo novo, pois isto é uma trabalheira e este tipo de coisa não é tão fácil de conseguir... E, claro, se você não quiser, basicamente eu não te mato, deixo este disco aqui do meu lado tocar eternamente... Até que alguém me mate ou o quebre, você vai ficar neste estado de nunca sentir nada, mas, desejar tudo, até sentir... Vai ser um quase humano, um quase fantasma, um quase morto... Vai ser um ser tão incompleto que, basicamente, apenas será uma música que sempre se  repete na existência...
 -...  -Itamar olhava para baixo... - Posso ter qualquer coisa? De tudo?
 -Sim, de tudo... Menos ficar vivo.
 O jovem Itamar olhava para baixo, olhava para tudo e todos, olhava para mim e para você... O que pedir, o que fazer...
 E, então, ele olha para a tela, olha para este escritor que está a descrever esta história que ele mesmo viveu... E diz:
 -O que eu faço?
 -... Não sei. -Respondi - Tudo que você pedir talvez o leitor desta história não ache digno... Ele está cansado, de todo o sangue que ela traz... Os sustos, a ficção, etc.
 -Ora, eu não ligo pra nenhum leitor! O que eu, Itamar, posso fazer?
 -... Apenas você, personagem, pode decidir... Como qualquer um de nós, meros mortais...
 -... Então, é isto?
 -Sim, é isto.
 ...
 -Saibret, eu já sei o que eu quero...
 -Diga, Itamar...
 -Quero poder ter escrito minha própria história, quero poder ter feito isto... Eu quero ser o escritor...
 Johan Saibret, o Ceifeiro - um dos últimos de sua espécie - sorriu com os dentes pontudos e disse:
 -Itamar, mesmo eu sendo um Ser Velho e já tendo sido um Agente do Caos, nunca vi algo tão difícil de realizar como escrever a própria história, de novo...
 -Então, deixe que se faça a Aventura... Deixe que a segunda chance venha...
 -Bom, se é de uma chance nova, talvez isto eu possa fazer... - E Saibret golpeou com a massa o corpo do jovem soldado...
 ...
 E agora, em um som constante de umidade nos meus ouvidos, eu escrevo esta história... De como eu tive a chance de escrever o que poucos puderam... De ver o que deixaram, de falar o que queriam... Afinal, de ser livre...
 E, assim, nesta carta, conto sobre a minha morte, sobre a minha aventura, sobre eu mesmo... Só que sobre o meu fim... E apenas, isto, cinco páginas me resumem, como resumem a todos nós.
 Itamar se despede com um: "-Até logo"

domingo, 8 de abril de 2012

Númeno #Agentes do Caos

 MUSIQUETA DA POSTAGEM
http://www.youtube.com/watch?v=VXa9tXcMhXQ



-Estou dormindo melhor hoje dia, talvez sejam os remédios...
 Nosso herói toma uma cápsula de comprimido azul, numa metade, vermelho, noutra pequena parte. Segue escapando pelas trilhas das ruas sujas que o levaram a acontecer o que aconteceu...
 Neste verão chuvoso de 1807, o céu é cinza e a manhã logo nos brindará com teu beijo, porém, nada disto importa para aquele apaixonado... Amante das coisas da cabeça e do corpo em curvas de uma tal Senhora Marié, ele corre por alguns lugares em busca de alguém que queira seus conhecimentos sobre as ciências nascentes da Engenharia dos Vapores e para plantações de tomates, realmente, isto em um lugar como a Batávia é realmente difícil, afinal, aqui já há um excesso de construtores, desde daqueles que fazem gigantescos moinhos até aqueles que inventaram chapéus capazes de suportar as chuvas, que ali, são constantemente responsáveis por encharcar as botas e capas...
 De repente, o jovem que está pensando nestas coisas da vida vê um anúncio numa parece suja e molhada, é um papel velho, mas, dá pra ler, mesmo ele sendo germânico e muitas vezes não entendendo nada desta língua das holandas...
 “Precisa-se de jovem que queira voar”
 Em um momento de luz de sua mente, ríspido como um fósforo que naquela época não existia, ele toma de assalto aquele folheto e sonha com tempos lindos, de campos de tulipas azuis e beijos apaixonados como nos romances que ele lia na juventude e que, sem sentido muito prático naquela época – como talvez, toda a nostalgia é quando estamos a realiza-la -, hoje se tornava sua “tábua de salvação”, seu motivo pra sonhar, até de viver, em certo ponto do desespero provocado pela sincera e confiada taça de vinho vienense...
-Agora, veja só, nada mais me faz dormir... – E ele, com dificuldade, se levanta... Agarra vosso braço de metal, amarelado pelo tempo, encaixando em seguida no ponto entre o osso do ombro e um vão... O lampião funciona bem, acesso, pode-se ver a pá enorme do Moinho Vertical Nº3, da nave direita, enquanto ele gira, gira e rodando, leva mais uma vez que ele se lembre das coisas de algum tempo...
 Era um lugar fantástico! Realmente para ele... Um lugar cheio de vida e pessoinhas caminhando de um lado para o outro...
 Era em 30 distintos cavaleiros, entre jovens, velhos, militares derrotados em guerra, sonhadores, uma mulher gorda, todos ali chamados pelo cartaz ou amigos, que o leram ou estavam ali... Recepcionados por um senhor de roupas sóbrias e bigode, além de um monóculo, todos se maravilharam e acharam o lugar fantástico (como se pode ver no parágrafo anterior) que era aquele local, as Oficinas Münchensen. Seguiram uns dez minutos com a narração entusiasmadas do senhor de roupas sóbrias até que um servente de carpinteiro, um funcionário realmente longe da personalidade que estava ali, mas, que nenhum dos visitantes que estavam ali sabiam ou queriam saber quem era, o chama-se:
 -Bom dia, senhor Almirante Münchensen!
 Imediatamente, o distinto senhor chamou um homem que os acompanhava, um sujeito mal-encarado e com uma mala nas costas, o disse, em francês:
 -Mostre a saída a este senhor de língua que não cabe na boca, por favor...  –Virou-se para o grupo- Vejam só! Ele estragou minha surpresa! Sim, eu sou o líder deste projeto magnífico de engenharia e arte, coisas que talvez se confundam... Muito prazer, senhores, meu nome é Münchensen, o décimo Conde da Ordem Hospitalar da Espada Azul!
 Todos os presentes o aplaudiram, menos o mal-encarado que levaram o aprendiz educado para um canto afastado, dentro da floresta negra, e mexia na sua bolsa tranquilamente com uma mão, enquanto agarrava o moço com a outra pelo braço. Nosso jovem herói estava maravilhado pela desenvoltura e vivacidade do Conde, que achava ser um ser muito velho e chato... Como todos os nobres de sua terra... No entanto, era este senhor de roupas sóbrias muito vivo e explicava com entusiasmo, as vigas que se levantavam do chão daquele enorme descampado e era acompanhado com estranhas pedras encrustadas nelas, fazendo um mosaico de formas grotescas para os olhos daqueles ferrados que não lhes deixava nem mesmo ouvir um tiro... Ou, podem ter sido os martelos e maretas... O que importa, é que nosso herói estava maravilhado e a história é dele, não do educado servente de carpintaria que acabara de ser baleado na floresta e iria ser deixado para os lobos e corvos, por ter em sua boca de trabalhador, ter proferido o nome do distinto Conde sem a sua autorização.
 E a empatia entre o velho Münchensen e o jovem era tamanha, que ele conseguiu apertar sua mão, porém, antes disto, ele teve de passar mais de duas semanas, carregando de um lado para o outro, as estranhas pedras negras que chegavam de caixas com símbolos indecifráveis para as línguas civilizadas – chamadas na época-, ou seja, de algum lugar do Oriente. O aperto foi rápido e sincero, pois, o jovem, com seus conhecimentos da novíssima Engenharia do Vapor, havia indicado uma falha estrutural numa caldeira indicada, no projeto do 2º chefe da sessão, como da nave direita, d’algo nomeado como Moinho Nº 3, seja lá o que isto seja... O responsável, claro, foi levado para o bosque de árvores negras e lhe foi mostrada a saída, como o servente; nosso herói, promovido ao seu cargo no dia seguinte, teve felicidade por ter seu trabalho reconhecido...
 -Hoje, não vou conseguir dormir mesmo! –Disse, enquanto andava de um lado para o outro dentro da cabine... As nuvens passavam no lado de fora, estava frio e as caldeiras pareciam com problemas, pois, oras se é uma caldeira, por que não esquenta o resto da estrutura?! Tendo estes pensamentos, até quis colocar a faixa que o dava o título de Vice-chefe Geral da Ala Direita, mas, não, sentou-se na cama novamente... Olhou o relógio e viu que já eram três e sete da manhã e ainda não estava dormindo... E dormir bem era algo que não fazia há tempos...
 Passaram-se três meses... As obras não andavam e o Conde cada vez mais vinha até os trabalhadores fiscalizar e promover promoções para gratificar os que mais se esforçavam... Nosso herói estava progredindo bem, porém, não compreendia como os Engenheiros eram tolos, usando materiais tão banais quanto pedras negras e madeiras moles pra montar aquelas estupendas estruturas de trinta metros... Já estavam feitas quatro das seis quando houve o tal atraso... Alguma guerra sobre uma pedra fumável ou algo assim, uma planta, não se sabia direito, só que era por um cachimbo que se fumava, estava atrasando o envio do Oriente das rochas, além disto, o povo Libelungo, donos das terras distantes d’onde vinham as madeiras, começava uma revolta furiosa contra sua Metrópole; ou seja, tudo era caos no projeto original e o Conde ficava cada vez mais pálido e raivoso...
 -Então, houve aquele dia... –Lembrou o jovem, enquanto desmontava o braço que acabara de colocar, deixando um buraco seco no lugar...
 -Posso fazer uma sugestão? – Disse o herói de pouca idade, uns 18 ou vinte, não me lembro agora, enquanto o Conde passava perto dele, nervoso com um papel na mão – uma carta de oficiais ingleses amigos dele - neste, dizia que a guerra no Oriente tomava proporções catastróficas e que, se não tinha feito antes, fazer agora, o nobre encontrasse outra fonte da Pedra Negra -, ou seja, não era um momento bom... Mesmo na Festa de Anos de Münchensen.
 -O que foi moço? – Perguntou o velho olhando de cima a baixo o jovem corado com caneca de cerveja e de braços dados com a amada Marie, uma jovem loira de olhos castanhos como avelãs e decote de peras.
 -O senhor tem problemas com as pedras de nossa obra, não é, meu senhor? Pois, eu tenho a solução!
 -Em primeiro lugar, esta obra não é nossa, é minha, e escute mais, meu rapaz...
 -Os eslavos, principalmente os russos, nós podemos conseguir as pedras que precisamos deles! Ouça... Eu vivi numa terra distante daqui... Quando eles guerreavam com o povo tcheco, e meu pai era um destes bravos, na verdade, estavam em busca de um bem precioso, algo que a lendária Horda de Ouro dos Bárbaros Orientais havia deixado por ali, naquelas terras, algo que crescia como árvore, mas era rocha e...
 -Espere! – O Conde até esquecera-se de repreender o mancebo, rapaz, por tê-lo cortado a fala, porém, pensou e ouviu bem, pois, “algo que crescia como árvore, mas era rocha e...” o havia interessado. Detalho que, naquele tempo da obra, todos já haviam ficado impressionados com a rocha negra trazida do Oriente que, depois de dias exposta á chuva, crescia em ramos vertiginosos para e entre as vigas enormes de madeira, criando bases para as caldeiras, berço para os homens e pequenas pontas estranhas, que – naquela época chamaram de naves- mas, que hoje, chamaríamos pela palavra “asas”.
 E o jovem herói trouxe para todos a sua ideia, todos os engenheiros e chefes ficaram impressionados com a rapidez do rapaz, até mesmo o Conde, surpreso, sabia que aquele rapaz tinha futuro, até mesmo na nobreza... Nobres ao qual ele servia e era servido, aos quais deveria mostrar a “tal máquina fênix” que poderia voar destruir coisas, como já previra o padre De Gusmão, o cavaleiro da Ordem da Cruzeta Da Vinci e tantos outros Renascentistas, que hoje, mais que sonhadores, nos pareciam visionários, mas, como todo “aquele que vê”, fora queimado na fogueira de alguma igreja ou rei por estas terras ásperas que eram o mundo naqueles dias de escuridão. Algo, verdadeiramente, deveria ser feito sobre ele...
 -Deveria ter deixado que tudo se explodisse... Sim, deveria... –Disse o jovem triste, olhado para a pequena pintura de Marie, já amarelada pelo tempo. Ele abre a gaveta, acha um convite do casamento dela com o Conde, também atingido pelo tempo, amassa, joga fora... Olhando para a janelinha entre as nuvens, lembra-se:
 -Bom dia, Pierre! – O nosso jovem herói cometeu dois erros, o 1º, foi virar-se de costas para o malvado Pierre, o homem mal-encarado da nossa história, enquanto este pegava um porrete e o desacordava, já o 2º, foi ter tido uma ideia que salvou a construção da Nave-Transmundo Fênix, a maior coisa a levantar voo até a criação dos cargueiros, nos anos 40 e 50... A criatividade, às vezes, dá apenas aos seus donos uma glória pós-mortem e, até em alguns casos, como este, até pra outro autor... Ou seja, o nosso amado Conde.
 Aí, só luzes e pequenos fragmentos ocorrem na mente do jovem, enquanto este corre pelos corredores da Nave, silencioso, porém, vai de pés descalços...
 O malvado Pierre o leva para a floresta, lhe dá dois tiros, um nas costelas e outro no ombro, as duas pistolas estraçalham seu membro, ele começa a morrer rapidamente... Porém, algo ocorre pra que não...
 Gritos de Münchensen... A cara de um homem pálido à sua frente, muito pálido e assustador... Sente que coisas o atravessam, enquanto é carregado para algo semelhante a uma carroça, mas, não é o homem pálido... Vê de relance o que é. Algum ser amarelo, um anão, algo assim, algo estranho...
                      Depois, só dor, ouve-se algumas coisas entrando pelas costelas e, finalmente, seu braço não dói mais, nada mais dói... Sente formigamentos na face, talvez, por acidente, uma parte dela se perdeu, nunca se soube...
 Silêncio, muito silêncio e... Bem, depois, só história de como um sujeito foi se virando para arrumar as peças da sala de máquinas da “Maior Maravilha do Mundo Moderno”, a Nave-Transmundo de Münchensen... Depois de vinte anos, casado e pai de uma filha chamada Sicília, o distinto Conde era um endividado em fuga num mundo de guerras entre seu país e os faladores de francês... Até o malvado Pierre, desertara e caçava seu antigo senhor... Resumido a dono de um circo voador, a gigantesca construção de cerca de 40 centípetas (aprox. 400 metros), era um alvo fácil, mesmo para um girador de alavancas e engrenagens, como era nosso jovem... E ele caminhava em direção ao velho...
 Sua face não mudara, sua face tinha uma chapa de ferro e cobre no lugar da bochecha direita, um braço de metal e uma couraça pesada... Havia ficado forte, mas, mesmo assim, abrira a gaveta e pegara a pistola que roubara de um bandido na última parada do “circo”, só por precaução, levava aquilo, pois, sabia que o velho Münchensen sempre teve uma língua mais poderosa que seus punhos...
 Nosso herói esperara por tanto tempo que esquecera de muitas coisas que viveu... Ele lembrava apenas destes dias de peão de obra, ele lembrara disto agora pouco, pois mesmo com pílulas azuis e vermelhas não conseguira dormir... Pensava até o dia de ontem, um sábado, que era um órfão da Bavária, resgatado pelo Conde e “reconstruído”, melhor e mais forte que qualquer um... Porém, não...
              Não era ele isto...
 Ele nem sabia que era mais... Ele se esquecera até mesmo de que a foto de Marie que sempre guardara era da amada, não de sua mãe... Enfim, sem nome também estava...
            Disto, no entanto, não poderia ficar sem! Matar e vingar sem nome não é “matar e vingar”, pois, como nas Artes, sem um nome para ser lembrado, de nada adianta a caminha e pincelada...
 E, durante a andança no corredor estreito de pedra negra, olhou para a arma e viu escrito nela “Númeno”, pois o “n” estava riscado devido ao desgaste da arma, já que ela era numerada, e havia uma sequência logo após...
 Então, nosso jovem herói tinha um nome para vingar, seu nome era Númeno. 

Mirroir é a última que morre #Agentes do Caos

 “-E daí que você não consegue viver consigo mesmo?
 Sou obrigado a ficar assim também?
 Sou?
 Miserável, pequeno ser desprezível!”
...De todos os seres do mundo deles, este era o último que ele esperava que fizesse isto, pois, com vontade, corto-te a face esquerda com uma lâmina cega de fazer a barba; sigo com golpes certeiros no braço direito e, logo após, mais dois nas costas...
 Porém, a ira ainda não é suficiente... Saio da casa de madeira afastada da cidade em que nós nos escondemos depois de roubar o Tesouro, perto do caro, apoiada sobre as rodas, a escopeta...
 BUM! – Para o alto, o medo em sua face é terrível, mesmo pra mim... Mas, continuo firme em meus passos de volta pra casinha... Uma pequena caseta que um dia chamei de lar...
 Beijo a sua face com o cano quente da arma, há um grunhido e tentativa de correr... Porém, havia amarrado a sua perna com as algemas que usava nas minhas amigas prostitutas... Ela não podia se livrar de mim...
 Havia gritos e correria no Quartel Generalé, podia ouvir dali os carros do Exército de Rosas vindo para me pegar, no entanto, não estou nem aí pras estas “pirações de doido” – como disse minha filha uma vez.
 Olhei pros teus olhos, temerosos, cara com marca vermelha da queimadura em bolha, a ira aumentava... Aumentava e aumentava... Apenas o peito cheio de costelas aguentava e segurava meu coração de pular em cima dela e se transformar em bicho estranho, escroto, cheio de dentes e veias, tomando teu pescoço branco e certamente sem sangue e sim algum elixir gelado que faz este tipo de criatura sobreviver em nosso amado mundo sombrio e sujo... Aliás, eu tava sujo de pó de brita, desde que correra como um louco daquela maldita padaria, aonde, atrás de um quadro, achei o meu Tesouro...
                         Aquele que ela roubou...
 Ela vai morrer por isto, pois, com seus cabelos loiros e olhos verdes me seduziu a fazer coisas terríveis, como foi se casar, ter filhos, casa e trabalho bucólico como funcionário público de uma fabriqueta do governo das mulheres que dominavam este país hoje em dia... Maldita! Dei uma coronhada na mandíbula...
 Mirei, estava na hora...
 -Adeus, Madeimoiselle Mirroir...
...Corro pro caro... O sangue escorre no assoalho da casa, não escuto nada mais que os meus passos no volante em uma corrida alucinante pelo lodo do ato que fiz... No entanto, tudo tem um motivo aqui neste mundo, o meu não é nenhuma filosofia... O meu não está no sorriso de Sofia – a Sabedoria -, só está ali, dentro do porta-luvas...
 Eu o abro, lá está ele... Meu Tesouro.
 Um lindo reflexo sai dele, junto, a voz que me guia e me respeita, meu deus... Meu Deus!
 -Muito bem, agora me encontra, fez tudo certo e bem, me encontra agora, vem...
 Sigo a voz, mas, antes, com vontade estranha, coloco na minha face uma máscara de gás... Pelo meu pensamento, o tiro final da shotgun não me atormenta mais, mas sim, encontrar tal de deus Númeno, ele é ao qual devo entregar algo... Não sei, sinto que é algo que amo, talvez, pode ser... Não, não pode ser isto... O que amo...
 Viro pra trás enquanto levanto pedras e corro com o veloz carro de corrida...
 O sangue escorre e penso, num minuto rápido e já esquecido, no que fiz:
 -Adeus, minha Esperança, este meu Tesouro que pra todos um simples Espelho me mostrou o que és... Mesmo que exista apenas como parte, de mim
                                Só uma coisa que morre, mesmo que por último... 

MUSIQUETA DA POSTAGEM

segunda-feira, 12 de março de 2012

Sessão de cinema esquecida na película #Agentes do Caos

MUSIQUETA DA POSTAGEM


 Olhos-de-Espelho com touca negra vigia aquele que não lhe ajudou nunca, o grande Gumb. O homem acariciava seus bigodes de gato, mas, não estava planejando nada, a questão é que ele nunca planejava... Nem para a pequena Olhos, nem pra ninguém, ele não ligava... Este homem tinha perdido seu amor no Vietnã, com uma bala na cabeça que chocou em seu coração um ovo de serpente - sentimento de desgosto -, frio com o mundo, foi dada a ele a tutela da pequena Lúcia, que tinha olhos brilhantes como dois diamantes, mas, que não lhe desperatava carinho algum... Apenas não aguentava a sua existência, preferia os filmes, prefiria morrer ali, naquela sala de cinema
                 Os dois, aliás, estavam ali, na sala de cinema, e o filme, noir, na tela
 Havia uma última cena e tanto a menina de 13 anos, Lúcia, escondida na última fileira e com óculos grossos pra que seus olhos-de-espelho não refletisse tudo por ali (ou melhor, o canhão de luz que projetava os sonhos dos outros e até os dela, como já ocorrera quando tinha 6 anos e quase foi linchada, sem que Gumb nada lhe ajudasse), quanto Gumb, que parara de acariciar o bigode, ficaram estáticos, segurando a respiração, seus olhos estavam quase secos naquela cena, ela durou apenas alguns momentos, alguns instantes apenas, porém, tão grandes e absurdos que nenhum dos dois iria esquecer por suas curtas e degradantes vidas...
 O homem de chapéu e terno ao qual não lembro o nome do artista diz:
 -Então, é isto... Não?
 -Sim, é isto... Eu não posso aguentar mais... - Fala a moça de franja e vestido tubinho, comum nas épocas antigas, infelizmente não lembro o nome dela, mas, chamemos de Gi Paola, desculpem, mas escolho pelo nome de minha família porque... Bem, por que quero ser famoso uma vez na vida, oras! E todos não querem? - Você perseguiu seus sonhos até aqui, até a Suécia, eu vim contigo... - Fez a mãozinha da já famosa atriz Gi Paola um movimento engraçado, caricato até já, de tristeza e desolação
 -Eu tinha que fazer este doutorado era... Era... Meu sonho. - Silêncio.
 -... ... Seus sonhos eram diferentes dos meus, - ela olha para o espelho e a câmara também, continua - sou uma contadora, tinha um cachorro e queria uma vida tranquila... Queria ter uma vida... Com você...
 -Mas, eu te levei a outros mundos, eu te resgatei de se perder naqueles remédios que você se afundava, eu...
 -Com você... - Ela se vira e o fita - ...Eu não tenho uma vida...
 Uma triste melodia de violinos corta a sala de cinema, eu continuo a observar a tela e me esqueci de Gumb e Olhos-de-Espelho, ou Lúcia, se preferir, enfim...
 -Marie, você quer...
 -Sim?
 -Quer casar comigo?
 - ! - Todos na sala fazem isto, eu quase caio da cadeira
 -Mas, Ferdinand, iremos nos separar... E...
 -Sim, eu sei... Por isto mesmo... Eu não sou bom com as palavras e minha memória é fraca... Porém, você não pode passar por mim como se fosse apenas mais uma, você já foi pra mim, uma vida inteira, então, se eu tenho que te deixar, que te deixe sorindo por ter um anel na minha mão que sempre me lembrará de você...
 -Ferdinand...
 -Sim, Marie...
 -Por que você tenta ser perfeito numa hora destas? Por que sempre consegue fazer isto... - Ela o abraça, ele a tira de seus braços e olha para ela, a afasta e segue para a porta, a câmara registra sua face enquanto ele diz:
 -Ser perfeito não é tão bom assim, ao menos, eu sendo chamado disto, mesmo não me reconhecendo assim... A perfeição só nos traz uma única coisa, a solidão... E a solidão por ser considerado um homem perfeito é uma das que mais dói...
 Fecha-se a porta, ninguém se mexe
 -Ninguém se mexe! - Grita a jovem Lúcia... Sem os óculos, todos nós somos cegados pela luz que seus olhos refletem do projeto, tudo está claro e vejo que ela aponta uma arma para a cabeça de Gumb, enquanto está em cima da poltrona atrás dele
 Ele a vê, esta com os olhos cheios de lágrimas...
 -Não poderia nunca ser perfeito pra você... Não é, Lúcia?
 -Não, não poderia, jovem pierrot... Você nunca sorriu, nem chorou, apenas me deu ração feito um animal, apenas me tratou como se eu fosse um perdido, uma coisa sobresalente pra você, uma missão dura e áspera...
 -Não me chamo pierrot... Me chamo Ferdinand, o Gumb, como o do filme... Lucinha, sejemos razoáveis... Você estava tão lindinha ontem e - sua perna toca a perna com tênis de borracha da menina ... Era agora! A hora de agir!
 -PÁ!
 O tiro é oco e ele cai, imediatamente, a pequena sai correndo...
 Há um problema aí, ela não chega a lembrar que este filme seria transmitido na 7ª Comissão dos Policiais de Rio Bravo, eu sabia, pois era um. Ela sai e dá de cara com alguns, bate com coronhadas e pulos, consegue se desvincilhiar deles... O fato de não atirar me intriga, eu que vejo isto da porta do cinema, volto e toco no pescoço do gordo Gumb, ele vive, inesplicavelmente, ou melhor, por uma simples bala de borracha ao invés das de verdade, das que matam...
 Sigo ela até a porta do cinema que se lota de policiais, houve muito barulho de quem saiu da sessão e viu Lúcia, pois, o tiro mesmo, ninguém ouviu...
 Três, três homens a agarram, ela é jovem, não sabe largar a arma, não sabe fingir que está tudo bem, não sabe ser uma Marie que viveu com seu Ferdinand por quatro anos num país frio e nórdico apenas por... Não sei, amor? Ou qualquer coisa como é isto...
 Não a chance, nós a pegamos, finalmente...
                           Porém, não pode ser agora, não, não pode ainda Ferdinand fechar a porta e deixa Marie com seu peito na mão de uma tela em preto e branco! Meu braço desce firme na cara de um, de outro, Olhos-de-Espelho está livre e eles brilham como nunca, eu sorrio com isto.
 Mas, o que a horda de guardas não faz por ela, eles surgem de moitas e a agarram, sinto que também farão isto comigo, sinto seus bafos quentes a me torturar nas explicações de quem é o meu chefe, de quem é Serj Gógol... Eu sei que estes bafos são na verdade maçaricos, mas, não sabem que eu também sou um...
              Levanto a mão, dela brilha arco de luz, disto os olhos da menina se cegam, só há silêncio, eu estou em silêncio
                            Espero a última fala, a última cena derradeira
                            Talvez só esteja esperando outra coisa, talvez um passo em falso ou uma vida que borbulha... No mínimo, um pedido de casamento...
                                                                 *
 -Bom dia, Lúcia...
 -Bom dia, Homem que me ajuda sempre...
 -Esta bem?
 -Por que estou num banco de praça? O que é isto? Cadê meu gorro?
 -Aqui... - O homem chamado Rámon Gi Paola lhe dá o gorro encardido, diz com isto:
 -Você escapou duma bela enrascada, pelo que fez, poderia ir até pra fria GrindPunch...
 -Uma prisão de elfos das historinhas de Esopo? KSDKLKSLSDKSLDKSDL
 -Bem, até a próxima...
 -Hein, Homem-Estranho...
 -Sim, Olhos-de-Espelho...
 -Pode não me deixar mais num banco de praça imundo como este? Minhas costas doem e...
 -Então, a senhora, antes de tentar matar seus tutores, não me faça perder o final do filme!
 A menina sorriu com os dentes a mostra, pôs seu gorro e ficou ali, olhando os patos na lagoa, que se chama inteligentemente Lagoa dos Patos... Fui saindo sorrindo, daquele lugar, aquele sol matutino na mesma direção em que eu me dirigia parecia um final de filme, talvez fosse...
 Talvez o final feliz estivesse em continuar ali, sobrevivendo pelos olhos daquela menina...
 E a película em preto e branco que me perdi há muito tempo...

quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

O conto que diz quem Nós Éramos... #Agentes do Caos

 MUSIQUETA DA POSTAGEM



O conto que diz quem Nós éramos, nós, os que hoje chamam de Agentes do Caos.
 Minha mais longínqua lembrança que escrevo neste diário, enquanto sou professor nesta escola de bairro – ou seja, me disfarço -, é quando olhava minha irmã colocar seus prendedores de cabelo feito de osso. Ela se olhava num poço, numa água que era coisa rara naquela terra... Lugar seco e áspero, duro e cheio de seres estranhos... Nós éramos estranhos pr’aquela terra, talvez continuássemos a ser, ainda agora, ainda hoje, quando já nos chamamos Agentes do Caos.
 Meus pais morreram nas mãos de nômades, nós, morávamos ali, num pequeno vilarejo no meio da terra seca. Ficamos por alguns poucos anos até que ela colocasse aqueles prendedores de ossos nos cabelos e fosse conversar com um ser estranho, tinha túnica e a voz nunca me foi certa... Não lembro de sua face, nem o que era; sei que viajava, sei que viajou muito e já estava na casa dos quarenta, talvez, pois uma vez me contou que por quarenta luas percorreu de uma ponta a outra do Grande Deserto, vendo pedras, demônios, gênios e anjos.
 Estava convencido de algo aquele ser, e ele convenceu minha irmã e a mim... Prometida pra alguém ela estava, um simples carpinteiro imigrante das terras do sul, seu nome era Órgenes, um homem silencioso, quieto, pensativo... E que sempre desconfiei... Enfim, ele era forte e também se juntou a nós, éramos em quatro agora. Porém, eu ainda não sabia os mistérios que aquele ser sempre encapuzado dizia a minha irmã e seu noivo, só sabia que começamos a caminhar, andávamos e corríamos o mundo, buscávamos mais alguém que em nós acreditasse. Recebidos com paus e pedras, retribuíamos destruindo templos e virando ídolos de cabeça para baixo.
 Porém, houve um tempo em que chegamos muito ao sul e depois seguimos à Leste. Foi neste momento que vimos pela primeira vez o mar. Meus olhos, mesmo depois de séculos e até alguns milênios nunca mais se esqueceram daqui, daquele azul... Daquela imensidão, era semelhante o mar ao que eu sentia ali, estava feliz, eu era feliz... Talvez o mais próximo do que alguém poderia estar. Um garoto de doze anos que sorria...
           Mas, por que eu sorria? O que eu fazia ali?
 Éramos uns poucos, talvez uns dez, no entanto, ninguém via muito o chefe, ao qual chamávamos de Mestre, ao menos, durante a noite e momentos de descanso. Eu o vi uma vez indo dormir perto de algumas pedras, ao sopé de uma montanha... Lembro de tê-lo visto tirar a túnica e cobrir-se, porém, não lembro de seu corpo e se era mulher ou homem, isto nunca me importou, gostava dele, era bom comigo, não me fazia arriscar nas missões e não permitia que ninguém me batesse... Mas, ainda assim, Órgenes me batia as vezes, ele me treinava, junto com a minha irmã, nas artes de portas uma espada, de conversar com as coisas vivas, de ver o invisível e não acreditar nele...
 Finalmente, um dia perguntei ao Mestre:
 -Por que estamos aqui? – Ele respondeu:
 -Nenhum destes homens e seres acredita, eles desconfiam... É isto e nisto que acreditamos, cada um destes seres têm uma coisa pra se guardar, um pequeno segredo, uma coisa pra amar... Outra pra odiar... Não há deuses nem forças, nós temos dentro de nós mesmos o que precisamos, talvez seja isto que buscamos aqui... Entende, jovem Ulle?
 Meu nome não era Ulle, mas, agora era... Não sei, simplesmente entendi o que ele queria... Então, comentou comigo:
 -Amanhã, quando o sol estiver reto sobre nossas cabeças, fundaremos algo, faremos algo que ninguém fez ainda, que não vi em nenhuma de minhas viagens...
 Foi no horário e tempo que ele disse. Chamamos a todos, éramos em uns quinze naquele tempo...
 -Hoje, eu fundo com você uma coisa, os crentes nos mistérios invisíveis também o fazem, nós faremos igualmente... Fundamos a nossa Tribo, o Nosso Grupo...
 Todos se olhavam, havia tensão no ar...
 -Sei que nós estamos sendo perseguidos, que à Oeste os Povos do Olimpo soltam seus tentáculos e matam nosso irmãos próximo ao mar... Também sei que à Leste, as mãos dos Vedas caminhas e definham alguns de nossos amigos, ficamos entre eles nesta guerra contra os Demônios e aquele povo, fora os Anjos que no deserto nos cobram pedágio, a cada fonte de água... Ao sul o Reino dos Djins nos oprime a seguir suas leis de caravanas milenares, mesmo nos dando passagem, porém, eu sei de tudo isto e estamos prestes a dar um passo importante...
 -Senhor, deixe-me falar... –Comentou um homem das terras do Leste, seu nome era Kalla e era o mais poderoso de nossos arqueiros – Como iremos sobreviver? Não há aqui forças suficientes para competir com tais casas e clãs, estes seres são em número infinitamente superior a nós... O que faremos? Temos nossas forças, mas apenas dois braços, duas pernas e dez dedos...
 -Sim, eu te compreendo Kalla... Você é sábio em sua precisão, como tua flecha... No entanto, ainda não esta convencido da força que temos... É certo, não teríamos tamanha força se não fosse pelo que estou prestes a mostrar a vocês...
 O Mestre abriu a tenda, todos ficaram assustados. Era um homem-lagarto, pele esverdeada e olhos amarelados.
 -Que aberração é esta, meu Senhor? –Perguntou minha irmã, me colocando junto dela.
 -Este, a quem chamam de aberração, é Jaya... – Então, o ser lagarto puxou alguém de traz de sua túnica, uma menina, creio que da minha idade, talvez... Era linda, a pele era doce, só que os olhos amarelados tinham medo, estava assustada... – Ah, sim! Esta é Sinnix, uma companheira de nosso mundo de Jaya...
 -Nosso mundo? Como assim? – Perguntou o medroso Órgenes.
 -Eu, - falou a criatura, com voz rouca e parca – sou Jaya... Sou um viajante que estava perdido, caí neste mundo enquanto viajava em busca de água e comida... Sou de um povo das estrelas, um povo guerreiro e poderoso... Seu mestre me ajudou e com isto, ajudou toda a minha raça...
 -Nós, - disse meu Mestre – temos agora a chance de sobreviver... Jaya dará um aviso para seus companheiros de batalha virem para o nosso mundo... Eles chegarão aqui e nos auxiliarão na batalha contra as diversas casas, quando o caos e a descrença estiverem instalados, finalmente, teremos nossa Missão completa... O Caos vencerá...
 -Mas, senhor... – Disse Kalla – Confiar nestes seres? Como podemos fazer isto? Não temos força suficiente para aguentar ao poder dos outros povos e...
 -Continuar sobrevivendo? Kalla, tu sabes melhor que eu, as vezes não podemos apenas sobreviver... As vezes temos que ter um sonho... E persegui-lo, pois talvez seja a única coisa que nos reste...
 -Sim, um sonho... –Minha irmã e Kalla se entre-olharam, sentia nos dois algo, assim como Órgenes, que puxou com força o braço de minha irmã, ninguém além de nós viu aqueles movimentos, aqueles gestos... Eu não sabia que eles seriam tão importantes, não sabia que aquilo definiria tanta coisa...
 -Logo, para que seja dado o Aviso – disse meu Mestre -, três de vocês serão escolhidos para irem para o mais longínquo dos Nortes, atrás da fogueira que o sábio Zaratustra acendeu... Lá devem lançar este pó que  Jaya trouxe... Ele contém a centelha de mil estrelas... Quando aceso, os navios que caminha nas estrelas do povo de Jaya virão e nos auxiliarão... Porém, eu deixarei esta missão apenas para quem mais confio, não se sintam mal por isto, mas a missão é perigosa e terá de atravessar muitas terras desconhecidas, apenas estes que eu tocar o ombro serão aqueles que possuem o que estamos buscando, eu gostaria que todos fossemos, mas, será burrice da minha parte arriscar a todos...
 Então, meu Mestre fez com que eu me assustasse, ele me fez tremer nas bases, quando sua mão foi tocando os três escolhidos... Tocou primeiro em Kalla, disse:
 -Kalla, você veio de longe e conosco aprendeu a dar a suas flechas o tempo destruidor, a força de governar a juventude e a velhice, você, jovem de corpo e velho de coração, Kalla, eu te escolho...
 Foi, o Mestre e tocou o noivo queito e parado de minha irmã, Órgenes:
 -És o mais resistente, porém o mais vacilante de todos nós, Órgenes, agora tu vai se chamar Órion, o Forte, pois, com muita força você venceu todos os cansaços, agora é praticamente invunerável, tuas mãos carregam a potência de todo um exército, ainda que sua boca não profira mais do que duas palavras por dia...
 Todos riram, eu não. A pequena Sinnix via minha cara de medo e eu percebi que ela me fitava, curiosa; por um momento nós nos entendemos, nós nos comunicamos e disse a ela que estava com medo, apenas no olhar...
             Medo daquilo que o Mestre fez, o terceiro toque
 -Você, mulher de Órion, a mais brilhante de nós todos... Não poderia deixar de te escolher... – Então, ele tocou no ombro de minha irmã e fez meu chão desaparecer sobre meus pés – Você, se chamará agora Astar, minha menina, - beijou a testa de minha irmã como um pai, e talvez, ele fosse isto pra nós, órfãos que não criam no destino... – tu sabes como tecer o caminho dos outros, com magas antigas aprendeu a Tecelagem de Vidas e Caminhos, faça teu caminho e o nosso cheio de glórias e energia...
 Então, em silêncio, no outro dia, eles partiram... Havia apreensão entre nós, pois o Mestre se fora com eles, iria até uma parte do caminho, depois de aceso o Aviso, voltaria para nos falar... Eu, encarregado de Sinnix, deveria guardá-la com minha vida, pois, ela era o “Selo” do acordo de Jaya com meu Mestre, ele que não se chamava mais assim, agora ele, nas palavras de minha irmã, era o Fundador, havia fundado algo que nem nós e talvez ele próprio soubesse a extensão que tomaria...

domingo, 12 de fevereiro de 2012

Quando o chapéu se viu no espelho #Agentes do Caos

MUSIQUETA DA POSTAGEM

 -Olá? …É você?
 Ela toca com seus dedos brancos no espelho, ele reaje e tremula, como um líquido, como uma onda
 -... ... –Nenhuma resposta
 -Você é a Batida?
 O som não existe naquele lugar, tudo parece um sonho. Um bad dream em que tudo é sombrio e escuro e, justamente por tudo estar escondido, não-descoberto, sua mente ferve... Nem meditações, nem amigas ou amigos, garotos numa balada, conseguem tirá-la daquele fosso... 
 Porém, nenhuma ajuda adiantaria, ninguém a auxilia de verdade. Todos fingem não ver e ela finge que não esta sendo vista... Assim como este sombrio sonho, percebe que não é nunca a luz de uma lanterna que ilumina seu caminho para que cada manhã acorde, mas sim, que tudo não passa da luz da lua refletida em sua pele... Seus olhos...
 -... Sim! Sou. -Respondo após momentos de silêncio. Virando para mim, Lúcia me fita, assustada... No entanto, não demonstra, só com suas grandes pálpebras me cega, pelo que dentro delas guarda. Lembro até hoje, de nossa primeira vez, do primeiro olhar.
 As primeiras décadas do novo milênio ditam nosso vestir, o que nós pensamos ser uma expressão de nós mesmos, nossa moda, nada mais é do que vemos no mundo, engolimos, soltamos dos dentes e colocamos no corpo. Ela tinha um grande cabelo loiríssimo, curto, mas armado, algo que me lembro dos anos 80... Mas, nunca liguei pra isto, nunca pra este tipo de coisa, veja só, agora ligo, depois de tudo...
 -Você... É a Batida... Do peito?
 -Sim... O que sempre estive aí, em você... -Uma mentira, eu era um Agente, não qualquer um Deles, sou o Homem do Chapéu, meu mestre é o Próprio Fundador; porém, com ela, não tinha vontade de lhe falar nada, não agora, aquilo me impelia.
 -Tem um grande chapéu, gostei dele... -Sorrindo, tocou neste tecido que enorme, parecia com os antigos "protetores de cabeça" do século XVII, das guerras entre os espanhóis e holandeses, das quais participei, como mercenário... No entanto, isto não é importante, só deve-se saber que era um grande chapéu que tinha três pontas...
                   Pontos de luz, acho que eram isto. Dois belos olhos sem cor alguma estavam na face de Lúcia; ela percebia quando os notavam:
 -Você também os viu? Bem, só não acho mais estranhos do que você... Por que está com uma máscara de gás e este chapéu enorme?
 Olhei para ela, eram como dois faróis, não me cegavam, porém, pareciam que me chamavam para algo que há muito tempo não conhecia a minha língua em falar: a verdade, não a dos poetas ou sábios, a minha, a que realmente importa, no fim das contas...
 -Não sei... Eu realmente poderia estar ela, a máscara, mas, sou parte do chapéu, ele sou eu... E sou igualmente com ele a Vingan... -Me contive, aquilo era muito estranho, então aquilo que procurei era verdade, olhos que me dizem o Escondido, o sombrio, que próximo aquela torre de água parecia tão enorme, apesar da cidade estar tão próxima... Com suas luzes, no entanto, não eram luzes como dos olhos dela, eram, apenas, lâmpadas, que em seus raios liberados, velavam leituras, tevês e pc's ligados, olhares vidrados, corpos entrelaçados e alguém chorando... Fazia tempo que não me dava a ser sentimental...
 Tirei a máscara e revelei uma das minhas faces, a do carrancudo pistoleiro, porém, mais jovem e sem seu poncho, que usei em tempos e estórias passadas.
 -Qual o seu nome?
 -Não precisa saber, Lúcia...
 -Então, você me manda um bilhete depois daquilo... ... Eu não sou palhaça! Não posso ficar aqui, neste escuro e...
 De repente, mesmo tendo o 38 na cintura, lhe fiz o que deveria se fazer: um abraço.
 Nunca fiz isto, não... Faz muito tempo que abracei alguém... Antes mesmo de que eu fosse a Vingança...
 Assim, começou... Antes disto, ainda com lágrimas nos olhos, me perguntou:
 -O que você quer?! O que quis dizer naquele bilhete: "Você tem outra chance, basta treinar, pra ser?"... -Continuou o ataque histérico, eu a ouvi, mas, deixei-me ouvir por seu olhar as tristezas de nascer com aquilo... Diziam que ela tinha "olhos de espelho", que cada vez que falava com alguém, fazia-o falar a verdade, já fora espancada por isto, estava sendo no momento em que recebeu o bilhete por Extremistas-feministas que tinha feito parte, "- Não podiam ter aceitado alguém como ela", me disse a jovem de cabelos amarelos. Os seus intermináveis casos de bullying na escola e ainda quando adulta, mesmo sempre tentando pelas ruas desta cidade fria e úmida, que chamam de Curitiba -antiga Gran Pinus -, fazer seu caminho de cavaleiro errante que depois de pensar ter derrotado o moinho-gigante, torna-se trinfante, sempre com a realidade dava de cara, seca, áspera, real...
                 Falava comigo e depois dizia que da ponte se jogaria. Que eu deveria lhe dar um "tchau"
 Deixei isto tudo quieto em mim, lembrando de tempos passados, de cidades muito distantes e já esquecidas, em momentos que eu era daquele jeito, só que sem pontes como aquela... 
 Consegui salvá-la como salvei muitos outros desta ideia suicida: convidei-a para ir à um parque no outro dia, se não fosse, não saberia - nunca- o por quê de ter vindo me ver... A curiosidade, é algo que nos move, mesmo que, já no fundo, ou talvez seja a vontade de viver de nós, homens animais, mas, não me importo, pois, não sou bom com as palavras mesmo... Porém, sobreviver sei, tanto que me mantive aqui, para cumprir o que tenho de fazer
 No outro dia, em frente a um portal, vi alguém chegar... Com a garrafa de vodca, mas lá
 *           *          *
 Ventilador...
 Suas pás giram e libertam os corpos do calor infernal que aqui faz... 
 Era num verão. Sentado num muro, perto de um ponto de ônibus deserto, um ser de estatura humana, de sapatos pretos e meias listradas coloridas, não posso ver seu rosto. Eu paro e converso com ele... Com roupas normais, de motoqueiro, seguro meu capacete - na verdade, meu chapéu que agora era aquela forma protetora de cabeças
 -Olá!
 -Olá, mestre! -Lhe respondo, virado pro outro lado, pra fingir que ninguém está ali, pois ninguém poderia vê-lo...
 -Você está feliz, "1º Aluno"? -As vezes não me acostumava com sua voz, ela estava dupla, como de um homem e uma mulher, algo estranho, mas, é compreensível.
 -Sim... Eu estou, Mestre...
 -Me conte, então...
 -Eu não sou mais a Vingança, meu senhor... Desde que há muito tempo, tudo aquilo aconteceu... Desde que minha irmã morreu e...
 -Eu sei, eu estava lá... Mas, e esta moça, esta Lúcia?
 -Ela... Bem, ela tinha uma missão... Eu estive treinando ela por todos estes meses, como segurar uma espada, atirar, saltar como o vento e bailar como as folhas...
 -... Além de beijar como as fúrias dos mares? Veja só... Conheço este poema também, o autor foi nosso amigo, há muito tempo... -Falou meu mestre. Eu fiquei calado, olhando para baixo, eu não podia lhe responder que não para com a última parte do verso
 -Ela sabe o quê ela deveria fazer? Acha que ainda pode cumprir com isto?
 -...Sam não vai existir mais... Ele foi longe quando quis apenas nos usar... Ela já sabe quem e o que ele fez... Ela será a Nossa Mão sobre ele
 -Ele é forte, você o treinou
 -Sim, mas apenas um aluno do mestre pode derrotar outro que aprendeu com o mesmo a sobreviver...
 Ele, o Fundador, olhou para o longe, dava para ver um parque ali... Era o Parque de Chien, que eu levara Lúcia - isto fazia alguns meses... De repente, ele sentiu algo, viu algo... Desceu do muro, começou a seguir a direção contrária da rua
 -Aluno, você está livre...
 -O quê? Senhor?!
-Você agora tem escolha, 1º Aluno... Você mereceu isto... -Virou-se para trás, vi com espanto, enquanto -como chegou- ele se foi... Virou uma folha verde e plainou com o vento, para outro lugar
 Apertei um comando num controle, um sinal de som saiu e localizei minha moto: modelo antigo. Subi, estranhando tudo... Tinha de vê-la em um Jardim na frente do Quartel Central. Pus o capacete, fui...
 Talvez nunca precisasse ter visto o que vi lá, a Vingança renasceu
 Cresceu
 E dois quarteirões daquela cidade desaparecem

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

São Paulo Abandonada parte 1 #Agentes do Caos

MUSIQUETA DA POSTAGEM

Estava em 2046, depois do nascimento de nosso senhor – o do Livro Vermelho, e não de outros pagãos por aí -, sentado na cama para dez pessoas num apartamento de meu amigo Robson Glezoé, em São Paulo, a Maior Cidade do Mundo (apesar de estar atrás daquelas pertencentes ao grupo do Dragão Asiático e das pobres Índia e África). Nunca vira tanto concreto em minha vida e, mesmo vivendo lá apenas 3 meses, nunca penso ter visto mais de uma vez uma pessoa... Vi apenas uma vez um momento de suas vidas, como desejo, do fundo de meu core [coração], ter vivido aquele momento terrível também apenas uma vez... Aquela chuva...
Era comum pra eles, mas não pra mim, habitante de uma simples metrópole de 4 milhões de habitantes, pequena, interiorana. Não. Aquilo era surreal... Foi numa das primeiras semanas de janeiro, como acontecem há mais de 100 anos aqui nas terras do Parlamento Brasileiro – incrível como ainda nada fora feito... Por isto, votarei a criação do Nosso Grande Império! Mas, isto é história para outra hora, n’outro lugar... A tal chuva, que mudou minha vida, ocorreu nesta época e eu nada sofri com ela
                                                          Fiquei seco
                                                          Embaixo de cobertas, com medo
-Acontece toda a vez mesmo! – Disse meu amigo, depois do que aconteceu...
-É, acontece... –Minha voz saía fraca, trêmula, porém, nada mais via naquela rua a não ser uma gigantesca massa de lama e barro, ao qual nada atravessava e que braços mecânicos – em uma solução temporária – encaixados nas laterais de todos os prédios iriam tirar partes da lama negra, lama que fedia, fedia cidade; cerca de quase 1 metro, ela veio escorrida dos fundos dos esgotos abertos, misturava-se com montanhas de terra postas estrategicamente próximas as gigantescas bocas de galerias, que eram fechadas ao público e que serviam para barrar a energia da água, pois este lamaçal criado era uma maneira de deixar “mais pesado” o líquido, permitindo que alguém na rua, ao menos por alguns segundos, pudesse se esconder em pequenos bueiros que a cada duzentos metros se vê pintados de vermelho e amarelo dizendo: “Perigo de Chuva! Corra aqui!”. Avisos já gastos pelo tempo, arranhados e pichados... Como tudo por aqui... Ai, ai, estas pessoas precisam é do (dum) senhor... Como a água que corria enlameada das galerias para os canais artificiais gigantescos... Sintia que precisava fazer algo, naquela época, não sabia o que...
Mas, então, numa manhã, lá perto das nove horas, me encontrava esperando no apartamento de meu amigo Glezoé, meus pais me encontrariam ali e eu iria minha terra de novo, iria parar de viver na casa de meu amigo, um pobre homem que trabalhava a noite e por isto, não poderia ser recebido pelo bolo que minha mãe trazia à ele – o bolo, no entanto, podia esperar, iria ficar na geladeira, este evento revelador, não. Ela começou, fraca, tomando cada parte da cidade, uma bela chuva...
Chúa, chúa, chúa!
Fazia ela... Era lindo ver todo o mar de prédios e concreto se encendo com aquele ar úmido e abafado, presente nos verões daqui.
                Então, ela ficava, mais forte, ela ficou mais presente nos meus ouvidos...
Chúuuuua, chúuuuua, chúuuuua!
                Foi aí, e justo aí, que vi uma coisa assustadora... Pois, perto do prédio do meu amigo, havia um matadouro; eles ficaram localizados ali, agora dentro da cidade, a fim de suprimir a demanda e contrastavam com a imagem das boates e casas para homossexuais que haviam na região, pessoas adoráveis que trabalhavam lá, também moravam aqui, no prédio... Porém, as insuportáveis também... Elas, no entanto, deveriam estar essopadas, mas sairiam é correndo, se vissem o que eu via ali
Dois gigantescos bovinos, nunca vira aquilo antes... Um negro e parecia um macho, com chifres cerrados, vomitava baba negra, enquanto fortes homens tentavam levá-lo para o outro lado da rua... Ele não conseguia, pois era gordo demais, babava e vomitava... Na frente da rua, uma vaca branca, com chifres enormes e que mugia de dor... Eu conhecia aquele mugido, morara muito tempo na fazendinha de um avô... Ela ia parindo, tentava, ao menos... Líquido meio aquoso saiam de seus fundilhos e jorrava pela rua, aquela pequena rua de sete metros era quase toda tomada por aqueles dois animais e seus tratadores, homens barbudos e rudes, não deveriam nem ter passado da Faculdade Técnica... Porém, lá estavam, brigando com seres de dois metros, mais que isto... Gordos, tanto o humanos quanto o animal... Tentavam levar para o outro lado da rua, onde um senhor chinês velho, berrava com a porta entreaberta de um refúgio...
Os animais mugiam, sofriam... O touro vomitava e babava e a vaca tremia e por vezes caiu no meio da rua...
                                                   Olhei perplexo, tinha que fazer algo
Peguei meu telefone celular e liguei sua câmera, foquei nas caras dos homens e fiquei ali, filmando eles... Enquanto açoitavam os animais, açoitavam a nossa comida. Comida esta produzida através do Ato de Necessidades nº4, que estipulou ser preciso o uso de fertilizantes alimentícios potentes para a engorda rápida dos animais para abate, de forma que eles se transformassem em montanhas gordas de pele e banha –gordura boa, que lambuzava meus dedos todo o fim de semana, ficava por dentro da carne, por dentro de nós, ao menos, quando era inculto, sem cultura entremeada.
...Então, enquanto gravava... Ouvi:
-Maldito! Está me gravando de novo?! Pensa que vai me denunciar, aí se te pego! Te mato!
Horrorizado, foquei no gordo de barba que apontava pra mim com um facão de serra, algo cortante, algo mortal... Olhei em seus olhos, ouvia a chuva, abracei o terror...
Chúuuuuuua! Chúuuuuuua! Chúuuuuuuua!
Um vazio me tomou e eu apenas podia continuar a gravação... Antes iria disponibilizá-la na Grande Rede, ou em algum site da Baixa, não sei... Polemizar e talvez aparecer em algum dos canais subterrâneos de mídia como: “O herói das vaquinhas”... Mas, não, não adiantaria... O vazio que produziu o temor de poder morrer pelas mãos daquele homem me tomou, de baixo pra cima eu suava, eu temia a serra me cortando, pois isto ocorreu com a vaca. Parindo, não havendo tempo para mais nada, o barbudo que me ameaçou cortou a barriga do ser, enquanto o outro fincava uma furadeira grossa utilizada nestes matadouros ilegais para o abate... A morte instantânea do bicho não fora seguida pela vaca, pois, de sua barriga saíram seis filhotes... Ela era modificada, um ser modificado em locais de beira de esquina e que viravam meu bife... Pensava em ser vegetariano, mas, não, ainda teria o mesmo veneno... Algo que deveria mexer com nossas mentes, nos deixar loucos, já que eu estava assim, em silêncio, sozinho e gravando aquela cena, numa megalópole.
Não havia mais tempo, ouvia-se o
Bluong, bluong, bluong...
Era a corredeira chegando, era a morte para qualquer um nas vias públicas naqueles dias... Isto porque a água corria com lama, mesmo mais lenta, derrubava o que estivesse no caminho e, justamente por estar enlameada,  sugava tudo para o seu fundo, para o fim.
O fim da gravação se deu com a ligação de meu amigo, quebrando meu estado de perplexidade, ao ver a gigantesca massa de água vermelha, correnteza que agarrou a vaca e seus “filhotes”, assim como levou o touro morto, tudo pra longe, a sujeira fora pra longe. Porém, os dois que levavam os animais, em pulo rápido com igual agilidade do chinês velho, trancaram a porta isolante – que tinha uma abertura embaixo, deixando os pés molhados – escaparam, meus inimigos, inimigos pelo acaso da megalópole.

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Cappello Nero procura #Agentes do Caos

 MUSIQUETA DA POSTAGEM
http://www.youtube.com/watch?v=lwHpLDgWonM


 "Procura-se Cappello Nero"
 Escrito no cartaz amarelado preso na venda do Seu Noel, na velha e triste Acapulco. O cheiro de praia trazia o deserto do interior, o velho Oeste que trazia apenas a areia e o cansaço. Era isto que eu queria, queria ser velho de novo, não imortal, queria poder ter vivido uma vida que não tinha mais, uma coisa que perdera há séculos...
                                Agora, eu era a Vingança. Um senhor dentro da mortalidade
E o cartaz ainda me intrigava, nunca vira ele assim - um dos meus nomes, meus vários -, estava preso naquela porta; logo, uma triste memória, enquanto pegava o navio para ir à Londres. Era perto do Natal, as guirlandas nas portas me deixavam um pouco triste, eu realmente devo ser um cara triste...
 Uma parte do cansaço vinha do fato de que há muito tempo eu procuro por alguém que me substitua. Sou membro de uma organização antiga, ou melhor, sou um dos fundadores desta organização. Podem chamá-la de Agentes, os Agentes do Caos. Tenho um nome perdido, em algum deserto do Velho Mundo eu perdi como meus pais haviam me chamado quando o sopro da vida tocou meus lábios - porém, isto não importa mais.
       Sou Cappello Nero agora, fui o primeiro Líder dos Agentes (nós não temos um chefe na verdade, mas, antigamente, isto foi necessário, as guerras foram sangrentas, aprendi muito, desde manejar uma arma à deixar a mulher amada...); me conhecem como o 1º Aluno, fui aluno do Fundador, posso aniquila-lo com apenas uma mão, porém, não tenho vontade de fazê-lo... Não tenho mais vontade de nada...
 Deprimido? Não, só cansado...
 Dizem que agora é o ano de 1889, não estou me importando a mínima com isto, já passei tantos calendários que não ligo mais pra nada... Apenas tenho uma missão agora: encontra um certo Lancester, ele será o meu substituto. Por quê? Quem liga... Agora eu não ligo mais pra nada... Ligamos quando temos uma vida, eu tinha uma, faz alguns milhares de anos... Hoje, sou apenas Vingança, perdi o que tinha, ganhei uma Missão
 ...
 Descendo do navio, um guarda da alfandega me sonda, eu não ligo, entrego os meus bilhetes e vou em direção à um bairro suburbano... As casas estão coladas umas as outras, colado está o fedor das indústrias e das crianças que morrem de tifo em minhas narinas... No coldre, escondido por um casaco, minha pistola, na cabeça, um chapéu negro - "o chapéu", ele é importante... Guardem ele na sua memória, assim poderão me reconhecer na rua -, levo apenas uma valise e um contrato dizendo:
 Existe apenas um único suspiro entre o Grande e o Pequeno, todos estão no mesmo ar, aquecessem no mesmo fogo, tomam da mesma água e andam na mesma terra. Não me importa o que haja entre os dois, pois agora, o que há entre mim e o deus é apenas uma assinatura.
 Ass.: ___________
 Desculpe, nunca fui poeta, então, inventei estas baboseiras... O tal Lancester tinha que admitir querer ser um Agente, depois, eu lhe daria meu chapéu... Estaria tudo acabado, pronto, era só isto que eu precisava fazer... Ele ficaria como meu substituto e eu me vingaria, teria alguns meses pra isto, mas, pra quem já viajou tanto pela Terra, alguns meses se tornam anos, quando se sabe o caminho.
 Estava num bonde, que nesta terra eles chamam de ônibus. Vi que a rua estava próxima, estavam morando na casa 20, na rua 5 com 78, logo, falaria com Eleven, o novo Primeiro Aluno...
 E então, algo é visto
 Como uma pequena centelha divina, um fogo azul se expande da janela do segundo andar
 Típico, era na casa 20
 Chutei o peito do menino que com jornais estava na minha frente, desci furioso a rua, as pessoas gritavam assustadas. Abria a porta com um soco, derrubei a velha senhora que tentava abrir, desesperada pelo que viu acima, nas escadas; todos se reuniam na porta, com medo - algo que eu perdera há algum tempo...
 -O vaqueiro subiu ali! -Gritaram, mandavam eu sair, não liguei.
 A porta do lugar estava intacta, nada havia ali, apenas um cheiro forte de gordura queimada. Com um chute, a entrada foi feita, olhei para o cubículo, olhei fixamente, mas não acreditava muito bem...
 Era aquela sensação, aquele impacto que se sente, estava perplexo... Eleven, menina de 13 anos, tinha uma faca na mão, deixou ela cair... Nos meus pés...
 Havia fogo ali, muito fogo, azul anil
 Não queimava nada, apenas uma cadeira de balanço e
 O corpo que lá ficava em descanso
 Mortal, silencioso
 Via apenas os chinelos nos pés do homem - parecia um homem, enfim
 Levei ela para fora, enquanto o corpo era consumido...
 ...39 nove minutos depois, olhei no relógio de bolso, estávamos na delegacia, estávamos perto de uma, o que explica a rapidez. Aqui os delegados não usavam estrelas, estranho.
 Eleven seria levada para internato para moças, me disse um jovem guarda, fiz cara de paisagem e olhei para a menina.
 -Tão jovem? Apenas 13 anos? - Falei no meu mau inglês
 -Senhor, deve haver um engano, ela tem 18 anos...
 Olhei pro meu papel no bolso do casaco, estranho... Não havia isto na ficha que peguei aleatoriamente no orfanato de Santa Cruz... A data não estava borrada, eu sabia disto...
 -Ela só é um pouco pequena para a idade, enfim... - Continuou o rapaz - D'onde o senhor conhece a jovem?
 -Eu?
 -Sim, o senhor... - O garoto segurou no seu coldre, pois vira o meu objeto de brilho metálico, um erro
 Senti que não sairia dali, não queria isto... Um bigodudo estava querendo me cercar, dei-lhe um golpe no pescoço, ele caiu; o jovem, tentando usar seu apito, foi recebido com um soco que o fez engolir o objeto de metal, corri pela rua. A suja via me fez desaparecer sem usar um pingo de mágica que está no meu chapéu...
 Por alguma razão, agora estava ali, ligado à moça, Eleven. Eu precisava ajudá-la para que eu fosse libertado para minha Vingança, esta era a hora.
 ...
 O Internato de Santa Joana D'Arc, escuro lugar, lugar fétido. Tudo fedia para mim, que permaneci anos no deserto, na Marcha para o Oeste, apenas algumas flores no jardim me eram caras, mas, isto não importavam...
 -Onde esta a nova moça que chegou aqui?
 -No quarto 22! -Respondeu a freira com medo, ela viu também a minha arma... Deveria escondê-la melhor!
 Sabia que não tinha muito tempo, tinha que ir logo, segui pelos corredores... Ouvi ainda a freira - uma boa mulher - dizer:
 -Ela está com alguém! Um homem negro!
 O temor em dizer a cor do homem me demonstrou seu racismo, coisa estranha desta época, algo bem condizente com os humanos... Eu já fora um deles, ainda era, na verdade... Um pouco mais... "Vivido", isto é fato...
 Abri a porta devagar, 38 em punho
 Olhei o homem, era um padre... Não um da Igreja Cristã, mas, alguma Batista, usavam roupas diferentes... A dele era negra, e não vermelha, como a dos outros...
 -Vire-se! -Disse
 Um foco luminoso tomou conta da sala, não atirei por impulso, nunca faria isto.
 -AAAAAAAAAAHHHHHHHHHH!!!!
 O grito da menina me fez atirar no pé do homem que tentava correr... Tudo ficara iluminado pelas velas novamente, olhei para sua face, me transmitia paz, porém, a paz dos mortos...
 -Calma amigo! Calma! - Me fez ver seu "livro santo", era preto, as páginas também... Muito estranho... Apenas a forca - o símbolo do martírio para as duas religiões - era amarelado e destacava-se com brilho incomum.
 Olhei a menina, estava babando, estava com os olhos virados e em choque...
 Sem me alterar no porte da arma, disse:
 -O que fez com ela?
 -Senhor, eu não fiz nada... Eu apenas...
 Senti ele tentar me acertar com o livro, atirei
 Uma, duas
 Ele pulou para um canto, caindo, levantando-se depois
 Estranho, não acertei, eu nunca erro, nunca.
 Dois pesos caíram no chão, o homem estava perto da porta, imóvel - suava de temor.
 Vi um par de sombras, parecidas com cães, logo, sumiram... Eu deveria achar estranho, mas, isto ficou comum pra mim...
 -Você... Você é um "deles"?
 -"Deles"?
 -... -Ele engoliu seco, jogou o livro no chão, uma fumaça danada saiu de dentro das páginas. Me mantive firme, olhando entre a fumaça, ouvi a porta bater, não atirei, seria fácil, afinal, a única saída seria meu único alvo para acertá-lo, porém, se o fizesse, acertaria uma área vital, não podia matá-lo, não ainda...
 As freiras vieram em seguida, olhavam desoladas a menina, como pedra, ela me fitava. Parecia morta, talvez estivesse; não liguei, senti que não precisava dela ali, o corpo apenas haviam, sua mente não estava sendo sentida por mim...
 -Qual o nome daquele homem?
 -O quê?! -Perguntou a madre que berrava para as outras por um pouco de água
 -O nome... Qual é?
 -... É... É Bournie, ele é pastor... -Ela segurou no meu braço, ainda disse, vendo minha pistola na mão - Senhor, espere a polícia! Digo que o senhor tentou ajudar a pegar aquele... Aquele feiticeiro! Espere a justiça, por favor!
 -Senhora, -eu a respondi - numa situação destas, eu sou a Justiça
 Sai, desci a rua, nada achei... Precisava achar aquele homem...
 A menina, a moça, Eleven Lancester, acabava de morrer no hospital, soube pelos jornais que tentavam relacionar isto com o caso de combustão instantânea ao qual viram no começo desta estória. É fato que eu vi o que aconteceu com ela... Havia fotos de mulheres nuas em volta do dono do lugar... Um homem que se vestia e portava como mendigo, pelo que disseram... Ele entrou em chamas antes de consumar o fato... Porém, não sei se por "alegria demais" ou se algo tinha ver os jovens olhos azuis de Eleven...
 Fato é que Bournie sabia, e se sabia, eu também saberia...
 Havia vindo para esta viagem sem uma vida, apenas com uma missão
 Agora, tinha uma, tinha que conseguir uma novamente
 A de Eleven, a menina de 13 ou 18 anos...
 Mesmo que para isto, a do tal Pastor, fosse tragada por meu 38!