"Quando você cai de um penhasco com as asas de Ícaro, de cera, se acha a maioral, não?"
Mesmo que ela não quisesse, já sentia-se ligada ao cara, ao tal do Ulisses Joyce
Porém, não havia muito sentido isto, pois ela voava com suas asas de metal ainda, em movimentos constantes de uma borboleta flamejante. A chama azul que emitia a sua alma infante não condizia com aquele lorde que esbanjava opulência e nunca, jamais, tinha vertido uma única lágrima de alegria... Havendo apenas conduzido seus líquidos dos olhos por motivos tristes, ou ainda, de ira. Tinha uma pele de bronze ele, ela gostava de sua barba ao sol... O que naquele tempo havia muito, pois ainda não se falava dos buracos no céu, nem dos grades tubos que vomitavam a fumaça negra que copulava com as nuvens e nos dava como infante o câncer em nossos pulmões.
Ela, em um dia de paixão exacerbada, ao andar numa rua de Julgamento -viela suja e suada de proletários de uma fábrica próxima de barris e de piche-, cai no chão... Ela parece desorientada... Sente o cheiro do perigo e tentando correr, é agarrada por homem franzino e muito estropiado, ele a joga no chão e logo mais três se juntam a ele... Ele esta com uma cara triste, mas ainda assim, tira o pequeno vestido branco da moça e, os quatro carrascos tiram dela aquilo que ela nem ligava muito... Algo que por sua ignorância de nunca frequentar uma Escola ou Oficina de Ensino, nunca lhe fora revelado ser preciso guardar para que o marido -disposto de toda tradição e pompa deplorável- "fizesse o serviço"... Mas, nada destes Valores que sempre xingamos em tudo e todos e depois, em época próxima, acostumamos e aceitamos estava ali em discussão com aquele moça... Dor, apenas isto, dor visceral e por dentro das dobrinhas da pobre ex-moça...
LEMBROU UMA VEZ
...A menina de franja cospe a pílula branca que a dei... Esta mais pálida que a fórmula que a dei, ou mesmo um céu de setembro... Os olhos negros e brilhantes me fitam, nunca percebi como eles eram profundos e me tomavam por completo... Não pensei em mais nada, peguei outra pequena pílula, agora vermelha, e dei a ela...
*
Passou-se alguns meses depois, logo, era uma pessoa muito magra aquela que um dia parecia um ser alado e brilhante. Quieta, a idade não correspondente em um número de anos, mas de peso das tristezas e perdas, caiu seu belo corpo em um monte de ossos e carne parca.
Ulysses a encontra, tem um óculos redondo e uma careca crescente, porém, ainda admira a coragem dela... Ela, tentava arrumar o cabelo embaraçado, o vestido de bolinhas sujo, fora de moda... Nada tirava a sua cara de tola...
O Maior Amor dela diz:
-Minha querida, fora eu.
-... - A mudez dela é profunda... O silêncio que fez assustou até mesmo a este narrador; quieto, sofrido, cada costela do corpo magro que uma vez fora belo foi pegando fogo, a pele parecia querer que o resto fosse vomitado... Porém, não foi... Ela, em silêncio
-O que acha que podes fazer, além do ódio e a sua cobiça de Vingança? -O homem baixo e de chapéu de coco a assusta
-Por quê?
-Você me pergunta razões? Bem, eu deitaria com você... Entretanto, queria terminar uma história, você seria uma personagem perfeita... Acompanho teus passos e escrevi grosso romance sobre tua vida... Desculpe, nunca tive muita imaginação, logo, usei você... Fora uma simples e tão boba personagem...
LEMBROU DUAS VEZES
...Ela me olhava e chorava, não aguentava mais ficar sentada naquela cadeira... Pensei em parar com aquilo, não dar a 3ª pílula, a verde e comprida... Minha instabilidade passou e ela percebeu minhas mãos suando por fora do terno... Ela aperta minha mão, com olhos ainda em lágrimas... Diz:
-Um beijo em sua face pelos seus pensamentos... Um beijo em sua boca, para que me deixe ser o que preciso ser...
Dei a pílula
*
Dois meses, parcos dois meses num início de século em que as máquinas substituíram os homens, as ferramentas da Rede de Cobre, os cérebros, os cães, as crianças... Apesar d'eu ter um cão chamado Rufus. Neste impressionante sistema gangrenado e que parecido mal distribuído para uns, muito pouco para outros e nada pra alguns, nada como uma Prisão Municipal, e lá a ex-moça, ex-velha e agora destruída residia... Sobre as cinzas paredes e o sol escaldante de um verão chato, ela reflete sobre como acabara ali... Ela não sabe... Só lembra que uma vez tentou voar quando criança... Pois, pensava que era uma borboleta...
Houve uma visita, no início de setembro, era o governador... Homem magro, um pouco alto, óculos redondos... Imagens que se formam, novamente, algo que se diz como esperança se alia as lembranças de uma amor rubro e sanguíneo, assim como faz suas bases sobre uma pureza branca a muito perdida... Ela o olha, sorri, o velho não a reconhece... Ela nada mais é que um farrapo humano em tempos de Terceira Peste, porém, Ulisses Joyce tem medo, algo tão visceral como fora aquele irromper da proteção do feminino dela forçadamente para o seu puro prazer... Ele não sabia o por quê, mas, tratou de fugir dali e ficou num hotel naquela noite...
A prisão era protegida, porém, não tanto como deveria ser... Uma faca improvisada, uma pequena distração - uma presa em chamas -, tudo para que o leão saia da jaula e pegue seu domador, aquele que criara a sua Fúria.
Descobrir o Hotel, fácil, apenas um era 5 estrelas na pequena Julgamento, algo para o crime... As mãos, os dentes, os joelhos, apenas o corpo que o demônio caído havia maculado com um plano de escrita... Um escritor que usou uma vida para ascender a altos céus e discursos para ascender à altas cadeiras não mereceria mais que isto... "Um corpo e alma por corpo e alma, um dente por dente, literalmente", foi com este pensamento que ela achou e entrou no quarto.
Escuro, um recinto escuro, um careca dorme e acorda... Vê um fantasma de seu passado... Este ser pavoroso a luz uma vela, diz:
-Por quê? Porque eu te amei demais, te odiei demais... Logo, minha paixão deve ser respondida com este último beijo...
Ela salta sobre o homem, ele, em pânico, tenta alcançar uma mesa, aonde na gaveta, um 22 pode salvá-lo, ela o abraça e beija mortalmente, mais e mais sangue se espalha... Abre-se a gaveta, a garganta já pedindo arrego... Ouve-se um estrondo
LEMBROU TRÊS VEZES
-...
Fiquei sem palavras... Olhava para ela, em estado catatônico... Repeti seu nome muitas vezes:
-Karmem! Karmem! Mily? Pode me ouvir?
O terno suado me fazia parecer um pinguim... Nunca deveríamos ter tentado aquilo... Eu quase chorei sobre as asas de Ícaro de minha maior criação... Presas, as grandes fagulhas de metais brilhantes, nada ali fora feito por mim... O que fiz foi fabricar com ela uma grande coisa, sem nome ainda, mas que me fez lutar em diversas batalhas... Nada demais seria se ficássemos cada um com suas memórias, mas, ela me mostrou o que tinha por dentro, por cada pílula que dei, cada coisa que lembrou... Não sabia se eram dela, ela era uma criação, uma máquina que voava pelas ideias de muitos e que esbarrara por acaso com um louco.
-Estou bem... -Ela sorri e me beija
-O quê, ou o que é aquela mulher? Quem é Ulisses?
-Ele, ele é o que cada um de nós poderia ter sido... Ele é o que esta em nós, muitos nomes, para a mulher e para Joyce nós temos... Os mais comuns, damos muitos valor, os mais complicados, são esquecidos...
-Então, só foi um sonho?
-Nada é um sonho quando se acredita que ele existiu... Assim se fez com sua vida, assim eu fiz com a minha...
-O que existe além do que nós vemos?
-Ora, tome a pílula e veja... Cada uma te leva a um lugar e vida específica...
-E por que tudo pareceu com a tal mulher e o tal Ulisses?
-Hm... -Ela sorriu e se espreguiçou, lindo e com um bom corpo, completou - Tudo as vezes é um sonho, e os sonhos não tem regras...
Um beijo e eu tentei dormir, tentei sonhar aquela noite... Ou acordar de um sonho
MUSIQUETA DA POSTAGEM
http://www.youtube.com/watch?v=0t5nJsH9rM4&feature=player_embedded
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