sábado, 9 de março de 2019

Vender-se

"Algumas pessoas usam seus corpos e sua imagem, como pinturas ou performances (sejam íntimas ou públicas, pois hoje mesmo isto já está perdendo o sentido), ficam se enrolando àqueles que se acham muito espertos ou o são, realmente, por possuir por algum tempo a disposição destas pessoas. Porém, o comércio de si, este utilitarismo das existências, toda este troca-troca me parece uma perda de tempo... Realmente, perdi muitos dias de minha juventude buscando profundidade nas coisas, achei que este comércio de si fosse algo dos jovens, me enganei, os velhos também o fazem, porém, por falta de oportunidade, força física ou beleza, resolvem amadurecer. Talvez as crianças não o façam, mas, nelas tudo é tão espontâneo que talvez seja isto, tolhido por esta lógica comercial, logo não passe de uma simples memória estúpida, que é o que chamo a nostalgia sobre a própria vida.
Porém, talvez buscar profundidade nas coisas e não em meu interior, seja o meu erro. Ao menos, ainda me atormentará toda esta geração de vendidos, mesmo que eu ainda me venda, as vezes, por simples poder do hábito ou cansaço intelectual. Todos estes anos acumulados, com lágrimas falsas, sorrisos de fotografias, depressões por falta de sentido na vida, todo este mal-estar humano me causa tristeza, pois sou parte de toda esta decadência materialista e não existem mais ordens ideias no mundo que não te puxem ou pra baixo, em profanas neuroses, ou pra cima, em coletivismos que hora ou outra vão requirir a destruição do gênero humano.
Enfim, são só algumas palavras que anoto neste caderno, de alguém que tentou voar como gavião por cima das nuvens um pouco... Mas, não pôde, não é mais possível, a força não está em nós que nos possa levantar, assim como a profundidade das coisas, está nelas e não em nossos véus de atitudes, muitas delas simplesmente vendidas, entre gente que não gostamos e um ou dois amigos e amores.
Que se vendam, que se amadureça por falta de capacidade, que sejam tomados por este mal-estar de 2019, ainda buscarei algum pouco água ao que possa mergulhar, mesmo em um oceano que, no fim, eu demonstre ser apenas uma poça. Já não se pode deixar-se ferir e não acreditar em si mesmo pelas práticas dos outros, deixe-os livres e fale, não se cale, não deixe de demonstrar em suas faces que tudo tem seu grau de falsidade, mesmo que demorem as máscaras para cair, mesmo que você morra sozinho, ainda estas palavras serão lidas, machucará este hedonismo e talvez lhe dê até um prazer, se fizer errado, mas, se fizer certo, você mostrará a este mundo de comércio de consciências um sorriso estranho... O sorriso de ser livre, ser real, limitado e improvável, que alguém sobreviva, mesmo que por apenas 27 anos, a todo este mal-estar venenoso e comerciável."

---

sexta-feira, 8 de março de 2019

Chuva, gavião, amor fruto

Chove, como em m'alma
que escorre entre as paredes
duma vila sem nome, qualquer uma
cai a chuva, que pinga n'entre os ouvires
gotas ilimitadas de si
cata cada gole d' água
alma que escorre
chove lá fora
chove aqui dentro
forma rio
corre, vaza, escoa
no delta dum mundo qualquer
de terra salgada de lá
me escorre de cá
passo, escorro
o rio permanecerá
a água choverá
eu, riofico

---

Por um momento, vi um gavião
Nele, foi meu coração
Por aqueles horas, vi o tempo
Nos olhos do gavião, para os meus
Vi o ilimitado de meus limites
Do alto, vi pequeno eu mesmo
Todos nós
Nos sonhos imanentes, instinto de gavião
Abri a tudo meu olhar ao mundo
Por um tempo, dois dias ou mais
Pareceu-me que sabia muito
Mas, apenas olhava com os olhos do pássaro
Não os meus
Não há ordem nesta cultura da desordem
Neste galope de cavaleiros bêbados
Já estou ébrio de mim
Já me assola o gavião
Me lembra teus olhos:
Sou pó, mas sereis sal desta terra?
Pode resistir a olhar tudo
Falar nada
Voar, poderá voar, gavião?
Até que o sóis apaguem e
a luz deixe o sem limites
Voa, gavião
Por um momento
Nos vimos.

---

Frutifica no peito
do seu amor
Aquilo que ele
Quis ser
Paciente, veja ele
Livre
Abraça, beija e deixa
Voar com você
No imenso
Céu presente em todos nós

sexta-feira, 1 de março de 2019

Liberte os outros

Não se afete pelos outros, admita-os como outros para que você ganhe a consciência sobre sua parte com eles. Ser caridoso é também saber o que você é consigo, é estar aberto a lutar com o outro e morrer com ele. A morte da fraqueza e depressão, é ser amigo àqueles que precisam e tentar, o máximo que puder, ouvir e acreditar no outro.
Se a arrogância bater a porta, observe o que fez que despertou no outro suas flores, seus cardumes de potências, aquilo que você pôde fazer e despertar a constelação do outro. Deve se aceitar a sua pequenez no universo, porém que você faz parte dele e só isto representa que você poderá participar de toda a sua possibilidade limitada por você ser pequeno, porém, e aí está o encanto, por ser você.
Você será pro outro em muito o que você é consigo. Nossos símbolos são limitados, mas estarmos abertos, é caminho do infinito.
...
Seja amigo, o que não impede o inimigo, mas firma sua mão na batalha



---
Ouvir é sacrificar a fala. Porém, quando nos comparamos com o outro, não com as ações ou força, mas com a banalidade, a putaria e a materialidade, a dor corrói o egoísmo, o pior deles, que é a ambição- o não entendimento de seus limites, que é o que constituirá nós mesmos


---
Entre minhas rugas, corre um menino, porém com dor nas costas.


---
Nunca fui um homem, uma pessoa. Sempre o estranho, o esquisito, ou no mínimo o inteligente... Um sujeito apenas adjetivo, fui um símbolo, mas a solidão permanece. Apenas eu como alguma pouca coisa pra alguém e a realidade, o resto, me traz a dor do nada.

domingo, 17 de fevereiro de 2019

Três aforismos, Flores de Emma, Trecho de sexo, Fome

Amigos são pilares que sustentam o céu

---
Em nossas feridas podem nascer flores de aço

---
Triste, porém, vivo

---



Apenas sinta, meu amor
Apenas sinta, em seu corpo que adormece
Em seus olhos que se mexem, sonhando em quando éramos jovens
Ou quando éramos um simples corpo
Em busca do infinito?
Descanse, meu pequeno pedaço de céu
Enquanto te vejo aqui, nesta cama fria
De um mundo mais frio
Pois, meu sol está indo embora
Mas, ele está no meu peito
Em busca do infinito?


Apenas sinto, meu amor
Minha pequena Emma, nossos anos acumularam
Nos dedos enrugados selados numa aliança
De uma liga metálica
Que preenche todo o vácuo de nossas vidas
Apenas sinto, meu amor
Por todas as desculpas, por toda aquela palavra que não pude dizer
Mas, que agora é apenas um pequeno nada
Frente a nós, simples poeira, das estrelas
Do universo de tudo que existe
Em busca do infinito estava?
Toda e qualquer estrada, tem suas feridas estancadas
Quando nascem as flores de aço

Durma, que eu sonharei sempre contigo
Até nos vermos
Emma
De seu pequeno, Romeu, aos 78 anos

---


O homem que jamais sorriu
Triste, porém vivo
O aço de sua face, festim das chamas
Olhava cinicamente
A mulher a sua frente
Perdida na solidão do desejo
Apenas entregava seu corpo
Queria entregar tudo para ele
Jamais sorrindo
Já não mais ela perde-se
Encontram-se
Furiosamente
No duelo do deserto de seus espíritos


Cai o raio de sol, corta seu rosto, o homem, com o calor
Treme a mulher, pelo fio condutor do suor
Um beijo sela, aquele ato de ferver os mares aos céus
Numa única...
Encaixe cósmico

---


FOME
SINTO FOME
Entre as estepes, cacei meus sonhos
De ser o imperador de toda a terra conhecida
Entre meus dois olhos!
Nos mares, cacei os tesouros
Escondidos nas ilhas mais secretas, das brumas
Dos cabelos daquela pessoa mais linda
Nas cidades mais cheias de gente,
Pensei ser eu alguma coisa, quando não era nada!
SINTO FOME
E ela é de vida
Viver em cada momento uma vida, gastar à força meus anos
Consumi-los numa fagulha
Nenhuma vela acendeu
Nenhum foguete se levantará
E a Guerra Mundial cessará
Nas sombras criadas pela luz
Síntese eletrônica de meu coração
SINTO FOME
Já somos máquina, robôs da história
Folias de outros reis
Espíritos que perseguem a si mesmos, exorcizando-se
No baile de máscaras que é o mundo
SINTO FOME
Das vidas que me fizeram querer
Mas, não ter


Assim, vomitou os anos o jovem com fome.

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2019

Homem na Lua, Viajante, Estrada da menina

Entre o espaço de seus olhos
Viajei por todos os oceanos, das profundas Marianas
Aos altos céus de Everest
Cruzamos os olhares naquela esquina de Paris
Naquele ônibus em São Paulo, na capital dos desolados
Na pequena estrada de alguma vila, em Portugal
Ou nas plantações de flores secretas, no Paquistão
Entre o espaço de minhas mãos
Te abracei e senti o toque do mundo inteiro
Me sustentando às pernas
Os ombros cansados se repousaram
Minha voz se calou
E eu viajei
Entre o espaço de seus olhar, com o meu
Meus pés se firmaram no solo
Caminhando por uma estrada de outro
De outros mais que caminharam
Que falharam ou governaram
Que venceram ou resistiram


Entre o espaço de seus olhos
Já não mais precisei me ver no espelho
Pois, estava completo, contigo
Vi eu mesmo


---


Saudação de um homem na Lua

-Dentro do seu corpo
Dentro de meu corpo
Um raio de fogo percorre do pecado até minhas entranhas
O festim de um foguete
Iluminando a noite escura
Aqui ao sul dos trópicos


-Te vejo vir, com seu jeito
Com seu todo o seu você
Não posso mais sentir ou demonstrar o que sinto
Calou minha boca
Fazendo falar a minha alma

-Também já não posso mais, resistir a tal fusão
Que traz a sua boca
Para a minha
Forja o aço de uma lança, que furou o céu
Que chega a até a Lua
...
Agora estou aqui, nesta terra pálida de cor açúcar
Como tua pele
Vejo a Terra, ela é azul, solidão verte dos mares
Mas, a força, a força de tantos que estão aí
Enterrados
Eu os sinto, eu os vejo, eu estou com eles
Estarei com eles, como estou contigo, Aquela que Olho

E na Lua, o Olhar se perdeu
Aquela que olhou, espera por ele
Assim como ele espera por ela
O tempo para para os dois
Quando vêem um ao outro
Mas, a Lua e as estrelas continuam em seus movimentos
Misteriosos

Dentro dos corpos celestes, haverá luz?
Dentro das vistas dos homens, haverá escuridão?
Agora estou aqui, nesta pálida terra cor de açúcar
Devaneios mil, azul de meu peito, cor anil

Minha alma fala
Quando a boca cala
E a palavra escreve




---
Caminha, jovem menina
Caminha, corre
Busca aquilo que falta no seu peito
Que a estrada se faz na caminhada
Na batalha que forja
Aquilo que na paz falta
Não desista
Continua
Que a vida é contínuo
Pode sofrer
Mas, ainda há pelo que sorrir
Sempre haverá
Sempre caminhará
Mesmo que com passos lentos na velhice
Ou afobados, na juventude
Fugindo d'onde está
Ou atacando com a carga de um cavaleiro
O inimigo a sua frente
Estará ali, menina
Dependente de seus passos


Agora, me abraça
Dorme bem comigo em sua cabeça
Pois, estou aqui contigo
Sou aquele que segura sua mão sempre
Que você precisa sempre estar contigo
Me vê no espelho,
E neste olhar amigo espera
Eu que sou você
Te fazer um pedido:
Continua e caminha
Que só na estrada se faz e se enfrenta o perigo

Vento


Eduarodo, nunca vai poder falar à ninguém
Vivemos no silêncio
Tumular de nossos sentimentos
Alguns apenas sentem demasiado
Isto é errado
O que não indica se é profano ou sagrado
Ora o que se sente transcende o habitual
É arte
Ora converte em espúrio, o banal
É grotesco
Porém, é silêncio que todos temos
Para com todo o outro
Não para com Ele, que tudo conhece
Se crê nisto
Em débeis frases congelamos o pouco
Do sentido que compreendemos
Alguns, com sua estrada, buscam
Fazer uma escada para o sol
Iluminar a tudo consigo
Outros, cavam a terra, em busca de dureza
E de pedra, erguer castelos e famílias
Outro erra, viaja como a água
Espalha continente, de sentimento
Eu, Eduarodo, apenas sou o vento
A brisa que traz algum alento
Alguma primavera
Mas, sou ar, so'vento
O vazio em que me atormento
Pura tempestade tumular
Daquilo que todos não podemos dizer
Daquele que não pôde mais amar.


---
Suicidou-se
No copo de água que era sua alma
O inútil perdido na terra do tempo

---