segunda-feira, 12 de março de 2012

Sessão de cinema esquecida na película #Agentes do Caos

MUSIQUETA DA POSTAGEM


 Olhos-de-Espelho com touca negra vigia aquele que não lhe ajudou nunca, o grande Gumb. O homem acariciava seus bigodes de gato, mas, não estava planejando nada, a questão é que ele nunca planejava... Nem para a pequena Olhos, nem pra ninguém, ele não ligava... Este homem tinha perdido seu amor no Vietnã, com uma bala na cabeça que chocou em seu coração um ovo de serpente - sentimento de desgosto -, frio com o mundo, foi dada a ele a tutela da pequena Lúcia, que tinha olhos brilhantes como dois diamantes, mas, que não lhe desperatava carinho algum... Apenas não aguentava a sua existência, preferia os filmes, prefiria morrer ali, naquela sala de cinema
                 Os dois, aliás, estavam ali, na sala de cinema, e o filme, noir, na tela
 Havia uma última cena e tanto a menina de 13 anos, Lúcia, escondida na última fileira e com óculos grossos pra que seus olhos-de-espelho não refletisse tudo por ali (ou melhor, o canhão de luz que projetava os sonhos dos outros e até os dela, como já ocorrera quando tinha 6 anos e quase foi linchada, sem que Gumb nada lhe ajudasse), quanto Gumb, que parara de acariciar o bigode, ficaram estáticos, segurando a respiração, seus olhos estavam quase secos naquela cena, ela durou apenas alguns momentos, alguns instantes apenas, porém, tão grandes e absurdos que nenhum dos dois iria esquecer por suas curtas e degradantes vidas...
 O homem de chapéu e terno ao qual não lembro o nome do artista diz:
 -Então, é isto... Não?
 -Sim, é isto... Eu não posso aguentar mais... - Fala a moça de franja e vestido tubinho, comum nas épocas antigas, infelizmente não lembro o nome dela, mas, chamemos de Gi Paola, desculpem, mas escolho pelo nome de minha família porque... Bem, por que quero ser famoso uma vez na vida, oras! E todos não querem? - Você perseguiu seus sonhos até aqui, até a Suécia, eu vim contigo... - Fez a mãozinha da já famosa atriz Gi Paola um movimento engraçado, caricato até já, de tristeza e desolação
 -Eu tinha que fazer este doutorado era... Era... Meu sonho. - Silêncio.
 -... ... Seus sonhos eram diferentes dos meus, - ela olha para o espelho e a câmara também, continua - sou uma contadora, tinha um cachorro e queria uma vida tranquila... Queria ter uma vida... Com você...
 -Mas, eu te levei a outros mundos, eu te resgatei de se perder naqueles remédios que você se afundava, eu...
 -Com você... - Ela se vira e o fita - ...Eu não tenho uma vida...
 Uma triste melodia de violinos corta a sala de cinema, eu continuo a observar a tela e me esqueci de Gumb e Olhos-de-Espelho, ou Lúcia, se preferir, enfim...
 -Marie, você quer...
 -Sim?
 -Quer casar comigo?
 - ! - Todos na sala fazem isto, eu quase caio da cadeira
 -Mas, Ferdinand, iremos nos separar... E...
 -Sim, eu sei... Por isto mesmo... Eu não sou bom com as palavras e minha memória é fraca... Porém, você não pode passar por mim como se fosse apenas mais uma, você já foi pra mim, uma vida inteira, então, se eu tenho que te deixar, que te deixe sorindo por ter um anel na minha mão que sempre me lembrará de você...
 -Ferdinand...
 -Sim, Marie...
 -Por que você tenta ser perfeito numa hora destas? Por que sempre consegue fazer isto... - Ela o abraça, ele a tira de seus braços e olha para ela, a afasta e segue para a porta, a câmara registra sua face enquanto ele diz:
 -Ser perfeito não é tão bom assim, ao menos, eu sendo chamado disto, mesmo não me reconhecendo assim... A perfeição só nos traz uma única coisa, a solidão... E a solidão por ser considerado um homem perfeito é uma das que mais dói...
 Fecha-se a porta, ninguém se mexe
 -Ninguém se mexe! - Grita a jovem Lúcia... Sem os óculos, todos nós somos cegados pela luz que seus olhos refletem do projeto, tudo está claro e vejo que ela aponta uma arma para a cabeça de Gumb, enquanto está em cima da poltrona atrás dele
 Ele a vê, esta com os olhos cheios de lágrimas...
 -Não poderia nunca ser perfeito pra você... Não é, Lúcia?
 -Não, não poderia, jovem pierrot... Você nunca sorriu, nem chorou, apenas me deu ração feito um animal, apenas me tratou como se eu fosse um perdido, uma coisa sobresalente pra você, uma missão dura e áspera...
 -Não me chamo pierrot... Me chamo Ferdinand, o Gumb, como o do filme... Lucinha, sejemos razoáveis... Você estava tão lindinha ontem e - sua perna toca a perna com tênis de borracha da menina ... Era agora! A hora de agir!
 -PÁ!
 O tiro é oco e ele cai, imediatamente, a pequena sai correndo...
 Há um problema aí, ela não chega a lembrar que este filme seria transmitido na 7ª Comissão dos Policiais de Rio Bravo, eu sabia, pois era um. Ela sai e dá de cara com alguns, bate com coronhadas e pulos, consegue se desvincilhiar deles... O fato de não atirar me intriga, eu que vejo isto da porta do cinema, volto e toco no pescoço do gordo Gumb, ele vive, inesplicavelmente, ou melhor, por uma simples bala de borracha ao invés das de verdade, das que matam...
 Sigo ela até a porta do cinema que se lota de policiais, houve muito barulho de quem saiu da sessão e viu Lúcia, pois, o tiro mesmo, ninguém ouviu...
 Três, três homens a agarram, ela é jovem, não sabe largar a arma, não sabe fingir que está tudo bem, não sabe ser uma Marie que viveu com seu Ferdinand por quatro anos num país frio e nórdico apenas por... Não sei, amor? Ou qualquer coisa como é isto...
 Não a chance, nós a pegamos, finalmente...
                           Porém, não pode ser agora, não, não pode ainda Ferdinand fechar a porta e deixa Marie com seu peito na mão de uma tela em preto e branco! Meu braço desce firme na cara de um, de outro, Olhos-de-Espelho está livre e eles brilham como nunca, eu sorrio com isto.
 Mas, o que a horda de guardas não faz por ela, eles surgem de moitas e a agarram, sinto que também farão isto comigo, sinto seus bafos quentes a me torturar nas explicações de quem é o meu chefe, de quem é Serj Gógol... Eu sei que estes bafos são na verdade maçaricos, mas, não sabem que eu também sou um...
              Levanto a mão, dela brilha arco de luz, disto os olhos da menina se cegam, só há silêncio, eu estou em silêncio
                            Espero a última fala, a última cena derradeira
                            Talvez só esteja esperando outra coisa, talvez um passo em falso ou uma vida que borbulha... No mínimo, um pedido de casamento...
                                                                 *
 -Bom dia, Lúcia...
 -Bom dia, Homem que me ajuda sempre...
 -Esta bem?
 -Por que estou num banco de praça? O que é isto? Cadê meu gorro?
 -Aqui... - O homem chamado Rámon Gi Paola lhe dá o gorro encardido, diz com isto:
 -Você escapou duma bela enrascada, pelo que fez, poderia ir até pra fria GrindPunch...
 -Uma prisão de elfos das historinhas de Esopo? KSDKLKSLSDKSLDKSDL
 -Bem, até a próxima...
 -Hein, Homem-Estranho...
 -Sim, Olhos-de-Espelho...
 -Pode não me deixar mais num banco de praça imundo como este? Minhas costas doem e...
 -Então, a senhora, antes de tentar matar seus tutores, não me faça perder o final do filme!
 A menina sorriu com os dentes a mostra, pôs seu gorro e ficou ali, olhando os patos na lagoa, que se chama inteligentemente Lagoa dos Patos... Fui saindo sorrindo, daquele lugar, aquele sol matutino na mesma direção em que eu me dirigia parecia um final de filme, talvez fosse...
 Talvez o final feliz estivesse em continuar ali, sobrevivendo pelos olhos daquela menina...
 E a película em preto e branco que me perdi há muito tempo...