segunda-feira, 21 de janeiro de 2019

Se chorar e Escrever atormenta

Se chorar, canta um tiquinho
Se sorrir, guarda no espacinho
Em que brilhe seu coração
Uma lembrança boa
Uma nota bela


Anda, aguenta firme
Existe sol na janela
A esperar que te conquiste
Um pouco de sossego nesta vida
Um pouco,claro, de momento triste
Uma paz com você
Que insiste
Em ver eu
Como eu
Não sei ver

Anda, aguenta
Que o coração não arrebenta
Se durar mais um dia
Se mantém a sonhar
A fazer
À tentar
Canta a música da sua alma
Pela janela, o universo
Sorri meu abraço

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Escrever, uma atormentação
Seja dos diabos
Seja a firmeza divina que me sustenta
Sejam estas palavras entrecruzadas
Escrevo mal, pois não quero ser lido
Tenho medo da descoberta deste produto
Deste pó, deste egoísmo que é meu estilo
Meu pedestal de artista é mínimo
Poucos amigos, poucos sorrisos desperto
Nada tendo para criar, repito
Repito o que encontro no meu peito
É lá que acho minhas palavras
E em alguns poucos livros
E em muitas conversas
E em caros amigos
Não espero mais nada desta vida escrita
Não escrevo nada que não circule
Entre a amargura
Ela entra, se instala e me diz sempre:
-Você fracassou, garoto... Olha os outros
Olho, vejo sorrisos, vejo a vida
Mas, não há, duvido, não a vejo em mim
Escrevo palavras mortas, não para gente só viva
Mas, para quem está um pouco morto
Tento aluminar uma laterna, acender um cigarro, lhe dar um café
E cortando as linhas como estrofes, busco lhes dar um fundo, mínimo, é verdade
De que é possível, mesmo para um inútil como eu
Dar esperança:
Voem, cresçam
Esta é a palavra dos mortos, daqueles
Que fundam e firmam a terra sob seus pés
Vá, escreva
Vá, voe
São as linhas de um moço que no fracasso, ainda escuta o som do infinito.

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-Deita teu ouvido no chão, pequenino, ascuta... A voz daqueles que firmam teus pés, aqueles por quem trilha seus passos. Honra os mortos com as linhas que escreve, bastião, na tua estrofe no livro da vida (Eduardo Ricieri, Os 9 Castelos, 2025)

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Os contos de Dalton e os haikai de Leminski combinam com nosso calar de poucas palavras curitibanas. São parte de nossa paisagem Geográfica Literária...

quarta-feira, 16 de janeiro de 2019

Amadurecimento materialista

Amadurecer me aparenta, ou talvez seja efeito de nossos dias, perder a capacidade de chorar ou sorrir por qualquer coisa. E como coisa, digo que este efeito de empedramento do deslumbre se foca nas pessoas - e até em alguns casos, saudáveis, nas instituições -, mas, geralmente no círculo íntimo: vamos ficando com poucos amigos, vamos nos fechando na família, para aquelas que tem a felicidade de encontrar uma companhia amorosa, e não mais rimos ou choramos por qualquer coisa que alguém faça, não o ato em si da pessoa, mas sim o que nós pensamos deste ato.
Amadurecer é ficar mais íntimo de si, ver seus erros e, na maioria dos casos, lembrar mais destes do que dos acertos - ao qual, geralmente nos pensamentos religiosos pregam um agradecimento, no entanto, como não é chique hoje falar de religião (ou em uma dimensão espiritual), é considerado tolice -, transformando-nos em um efeito reflexivo gigantesco. Poucos passos não são dados sem as dores do passado, ou, minimamente as feridas do mesmo, se quando jovens não formos apresentados à aventura, a capacidade de batalhar - não o que hoje se chama de resiliência, ou, teimosia e falta de educação, na maioria dos casos -, tendemos a uma inércia.
Amadurecer, é emocionar-se com si mesmo, com o efeito do mundo externo que é produzido em nós: já não escutamos uma música, lembramos de algo com ela, já não rimos de uma piada (menos as de gags físicas), correlacionamos com uma situação que aconteceu em nossas vidas, não buscamos outros pontos de vista ou entender o outro, buscamos ver o outro pelo nosso prisma. Não nos movemos nem para imaginar que a outra pessoa existe, ela nos parece algo produzido, quando não achamos que o problema é nosso, apenas colocamos o outro em uma cápsula de raiva, ou é apenas um filho-da-puta.
Amadurecer é ser mais rígido, principalmente consigo, pensar mais em si, lembrar de si. Porém, não me aparenta isto ser um efeito contra a bondade ou a caridade, não, é um efeito da vida, de nossas feridas. Não poderia reduzir os efeitos da idade ou das vivências apenas à palavra amadurecer, porém, posso dizer que cada vez mais vejo esta amadurecimento se tornar, para além do pensamento em si, algo que chamo de um "projeto materialista". Tudo se compõe de acumular ou objetos, ou "vivências" (turisticamente falando) ou contas.
A isto se trata viver sendo "realista" como dizem, se fechar em si, nos efeitos que me produz algo, e dentro deste espaço diminuto em que eu existo, apenas me focar nas obrigações (familiares, de saúde, de trabalho, de administração do lar), ou seja, restritivas, naquelas das vivências, ou seja, àquelas ou socialmente aceitas como que agregam na memória, seja uma viagem, um namoro não usual, um desafio esportivo, etc., dadas como agregadoras ou cumulativas, e, finalmente, a acumulação de objetos, relatados aqui de forma larga, sejam pessoas, sejam coisas inanimadas, seja mesmo dinheiro, seja, finalmente, o status (a "coisa de ser alguém", "ser o fulano de tal", "doutor nisto e aquilo"), resultando em um efeito "possibilista", ou permutativo - emprestando um termo que ouvi na contabilidade -, isto é´, estes objetos se prestam a serem trocados externamente a nós, para que possamos nos "realizar", mais e mais, porém, sempre de uma forma temporal, sempre nesta vida.
Assim, a maturidade também traz, contraditoriamente, um grau de incerteza, ao qual, me parece, vai diminuindo com o tempo, talvez, na velhice e senilidade, períodos aos quais preciso ainda meditar. Se esta curva de incerteza aumenta até o momento de nossas doenças de ansiedade e depressão, não posso dizer, o vazio psicodinâmico é poderoso hoje e isto talvez tenha efeito nesta questão. Me restrinjo, neste comentário-ensaio, a dizer sobre o amadurecimento (dado hoje) como pensar-em-si, após os sofrimentos, um endurecimento do coração, e um acúmulo de restrições, agregados positivos e de meios, ou permutas, tudo em uma perspectiva que me faz muito lembrar da meta utilitária, da felicidade.
Queiram me perdoar a delonga, bom dia.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2019

Porta e mais 2 ou Anita e a Rosa Negra


PORTA

Abriu a porta, sem medo
Viajou pelo tempo
Até quando nasceu
Viu tudo que não fez
Fechou a porta
Convocou seus próprios demônios para uma guerra
Me abraçou e disse:
-Adeus, meu amigo


Eu lhe beijei a face
Entreguei-o aos romanos
Disse adeus
Me disse adeus

E em poucas linhas, toda a vida estava
Morta
Movimento transpassado
Pontos no céu, que chamavam de
Estrelas
Apagaram-se entre a porta
Que se fechava

Vi tudo que eu fiz
E tudo que eu não fiz, m'oprimia
Mais do que a extensão de mim mesmo
Perdi a guerra contra meus demônios
Perdi meus braços para abraçar
Vi o passado
Sonhei com o futuro
Temi o presente

Chego ao corredor, sigo para a próxima
Porta
Pelo próximo, adeus
Estaremos condenados à despedida?

Apenas agradeço agora
Apenas isto, estou vivo
Eu beijei-lhe a face, mas jamais
O entregarei
E nas poucas linhas, que fazem parte
De minha vida
Pude provar que estou vivo
Não mais, nem menos
A porta se fecha, eu agradeço
Obrigado por tudo.

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CAVALEIRO

Com as últimas forças
O cavaleiro, deixa
Seu corpo cair
Queda.
Apenas traz pequenas
Chamas
Ao último suspiro
Caminhante
Por aí


Eu estava lá, eu vi
Quando ele voou
Entre as campinas, escreveu na rocha
Lascou a pedra com seu próprio espírito
Escreveu:
-Aqui jaz, um pequeno homem, num universo de tudo o que mais há, haverá e está, mas, um homem que esteve

Compreendi, que tudo o que as vezes vale
Ter vivido
Tudo o que viveu
Todo o sofrimento, toda a lágrima
Todo o sorriso, todo o caminho
Todo o encontro e batalha
Jamais sairá ou deixará

Então, eu, o algoz daquele cavaleiro
O enterrei com a honra que pude
Obrigado, meu amigo

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ANITA

                      

Minha pequena russian girl
Esta flor vai pra você
Ela é cor do céu, o entardecer
Vermelho como meu sangue, quente
Como teu abraço
Mas, jamais tenho algo mais para te dar
Desculpe a pobreza
Anita
Seu sangue agora é óleo
Sua pele, metal
Seus olhos, ainda me vêem
Mas, eu poderei vê-los?
Sou capaz de muitas coisas, cacei em mil mundos
Cacei muitos na minha mente, outros com minha lança
Encontrei tesouros, outros perdi
Encontrei um coração em uma máquina
Chamada gente
Não mais encontrei pessoas
Cada vez com mais óleo que sangue
Metal que pele
Cada vez mais sozinhos em si mesmos
Não percebi, Anita
Eu estava sozinho


Procurei por um mundo inteiro
Procuraria pela galáxia
Mas, não preciso, não mais

Aqui está o meu presente pra você
Uma flor
Uma rosa da noite
Pregue teu espinho, serás novamente humana
Me desculpa, Anita
Já não estar mais contigo
Alguns tesouros, precisam
De tempo
Outros, jamais se encontra
Mas, se vive com eles, ainda
Dentro da gente

Aqui está, Anita
A rosa que me tornou gente
Viva bem, abra o mundo
E se um dia sentir que uma destas não-gente
Te olhar com olhos verdes perdidos
Saiba, lembra do meu nome
Cuida do meu ser
Anita
Um beijo

terça-feira, 8 de janeiro de 2019

Céu Vermelho

O céu está vermelho
Meu peito está preso
Em um lágrima perdida
Dentro do meu próprio oceano
De outras lágrimas
Caladas
Seguro, no último ponto do meu bote
Olhando para o Céu
Olhando para você, sol que cai de volta ao horizonte
Já não posso apenas deixar de ver
Sentir, ouvir
Nada nos sentidos, ocupa apenas um momento, mas, todos aqueles
Todo o tempo, todo o vento
Da brisa a tempestade
O peito preso do grito
Grito de liberdade
O Céu está vermelho, meu sangue corre por ele
E no mar noturno, escuro como o meu interior
Brota a luz
Brotará a minha força
E já não mais ficarei apenas dependente dos sentidos
Ainda há como navegar, e sempre será preciso
Navegue pelas nuvens
Navegue pelos corpos
Navegue pelas palavras de carinho
Fortaleça o mundo, derrote sua tristeza
Convivendo com ela
Naquele mar profundo, naquela minha mão que segura o bote
Naquele céu que está vermelho
Crepúsculo


sábado, 5 de janeiro de 2019

Sabiá


Sabiá que voa pelos mares
De Lisboa
Encanta meu caminho náufrago
Destes mares tempestuosos do Atlântico Sul
Já não posso mais navegar como antes
Ai de mim seguir esta minha pirata vida
Entre os portões de chamas
Os trovões dos incultos
As espadas cantantes

De sua voz
Sabiá
Única lembrança
Daquilo que nunca fui, sendo
Eu te vejo crescer, entre as campinas, as ravinas
Te vejo em meu barco naufragar em meu próprio fosso

Mas, limpo o meu chapéu
As botas mais secas
O ar do mar invade meu peito
O som das batidas do coração
São os mesmos
Da batida das ondas
São o tocar da viola
Cantando uma canção qualquer
Clara, limpa, mais forte

Mais velho, estou
Muitos nãos foram dados por várias mãos
Mas, nunca me foi negado o mar
Por ele sigo, de Lisboa à Cabo
Do Cabo à Bombaim
De lá, até Pequim
E chego aqui, na tempestade d'mim
Pra te ouvir de novo, sabiá
No peito peito, cantar