quinta-feira, 19 de dezembro de 2019

Peregrino

Não, não havia mais sentido entre nossos olhares
Nada ali havia, mais que simples poeira, memórias
Pois, é de pó que somos feitos, nisto estão nossos reflexos
Perdidos no tempo, em algum tempo
Isto, uma pequena vela trêmula, a vida.
A vela se apaga, fica um cheio de pavio queimado no ar, por poucos minutos
Não mais, não menos
Porém, o ar permanecerá, o fogo iluminou a sombra
O ato perpetuará pra eternidade
A vela se apagará
A luz iluminará em outras sombras
Em outros quartos escuros
Entre outros olhares


Nós, minha querida, aqui estamos
Como velas no amanhecer sendo apagadas
Para que com o grande sol, sejamos todos iluminados.
E, mais além, para que uma luz muito maior nos transpasse o peito
Corte a sombra interior que é condição humana
Sombra ignorada pelos fracos, festejada pelos demoníacos, temida, pelos sinceros.
A vela se apaga, meu amor, como em nossos anos que passaram
Como todos os problemas enfrentados, filhos criados, casa ajeitada
Bens materiais, envelhecidos ou envernizados, também o são nossos ossos e músculos
Mas, a música permanece
O cheiro do pavio apagado
A manhã chega
O ato perpetuará em insondáveis caminhos
De mistérios sutis, ouvidos por quem possa
Abrir o coração
Ser mais que aquela vela
Apagada
Apagar-se
Peregrino no deserto, escuro e solitário
Vendo apenas outras velas
Pequeninas estrelas
Iluminar o caminho
Com o cheio da parafina
E as estrelas distantes

A vela se apagará
A luz, permanecerá.


sexta-feira, 6 de dezembro de 2019

Poucos lerão

Um bom leitor, com sua experiência acadêmica e mesmo sua elevação filosófica, pode não ter nada de bom escritor. Saber como dizer algo, como um elaborado passo de dança, ou um rocambolesco verso, um filme arrastado pode, ao final do julgamento do tempo, passar como uma mera febre.
Há algo na humanidade de febril, a novidade, vence nos primeiros rounds, passando a ser uma certa ressaca, azeda e trintona, cheia de ressentimentos pelo que nunca foi, cega sobre o que é. Porém, existem escritos, que com a sorte de bons editores e que suas bibliotecas não fossem queimadas - o que dá a verdadeira Arte e Literatura certo grau de Fortuna -, que atingem algum ponto do entremeio humano, naquele ponto em que a consciência está nos passos de certa eternidade, ou mesmo que um grande monstro está se criando... É ali que reside a atemporalidade de uma obra, em captar, muitas vezes contemplativamente em biografias (mesmo de personagens), 'panfletariamente' para algum fim específico que é distorcido ou mesmo, pelo puro ato do acaso, do acidente.
Ler bem não garante a celebridade da obra, garante a libertação do leitor, são dois atos diferentes do espírito, um que se abre, outro que esculpe. Às vezes, uma imagem singela, outras, um grande palavrório rebuscado e que se torna um belo elefante de louça. Logo, sinto que existem muitos que escutam, poucos que poderão falar mais do que a sua vida ativa e madura, uns vinte anos no máximo, permitir, cabe aceitar o silêncio. A boa leitura é uma das tecnologias do silenciar-se.
E, no Silêncio, lutamos o mistério.

sábado, 9 de novembro de 2019

Tua fronteira, casinha italiana

Frentes mapas
Que escrevi pelo teu corpo
Com letras de topônimos
De nossos encontros,
Daquela vista no ônibus,
Àquele sorvete sobre a mesa,
Na batata do botequim.
Planisfério definido em ti
Em teu traço para mim.

Faço as fronteiras que em
Nós enlaço
O próximo fronte a ser descoberto
A nova cascata nas Áfricas
A ser achada, para nascer o Nilo
É o teu sorriso!
Fronteiriço, corrente do rio
Seperas e calas
A alma contigo
Num abraço 'inimapeável'
'Inecontrável'
'De um lugar nenhum'
Sendo contigo todos
Todas as tardes em busca
Daquele próximo sorriso
Daquela fronteira de Paraíso
De um pequeno tesouro
Escondido em desbravamento
Dos dias, assim


---

Caminho pra casinha italiana

Olhinhos cintilantes
Viagem do céu ao peito
Com as estrelas cadentes
Sobre meus passos
Fulminantes, entre o dia
E a noite, quando te revejo
Entre os beijos
Daquele quarto qualquer
Naquela casinha à italiana
Onde se esconde, entre-meios
O meu peito.


A conversar com meu
Olhar, vejo estes cintilantes
Passeio, entre seu sorriso
Festejo, com seu abraço
Toco as pontas dos dedos
Tecendo com nossas mãos
O dia de amanhã
A noite de segunda, a manhã de terça
E, de tardinha
Uso seus olhos que cintilam
Em minha memória, farol, guia,
Para guiar a minha volta
À casinha, ao lar
Que trago contigo
N'meus olhos, q'agora
Cintilam

Cintilamos

---
































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sábado, 19 de outubro de 2019

Lar, Horizonte, Anamnese

O lar é aquilo que carregamos, não onde estamos. É a construção de um castelo sólido, numa vida que, para o tempo profundo, é vento e areia. Duma praia sem mar, em eclipse, velejamos e partamos, tendo a parca luz do outro como guia, o clamor à Caridade.
Não somos o melhor dos homens, muitas vezes é na solidão de piso frio, que fincamos as estacas de nossa barraca. Porém, mesmo lá não estou sozinho, pois alguém segura minha mão, no silêncio. Admitir o silêncio, por fim, é respeitar o som da vida, abrir à possibilidade de escutar alguma harmonia, mesmo polifônica, mesmo perdida na garganta de um marinheiro - naquela baía, de vento e areia.
O lar se carrega ora perdido, ora encontrado nos braços da Rosa, mas lá está, navegando, ao som do coração que bombeia, no tambor da vida, da possibilidade de estar presente. Da presença de estar conosco: fique.

---


Formas e linhas, linhas e horizontes
Jamais busquei minha rosa
No peito que não o meu
Na paisagem que é tua
Encontrei as retas de lá
Pra cá
Catou-me no vento, catavento
Da alma, correndo por lá
Aprisionado em linhas?
Assovia o vento, entre as janelas
Do coração

---
Aquele pequeno príncipe
Que começara a história de minha vida
Olharia no espelho de meus olhos e veria
O quê?

Quantos braços necessários para levantar o voo
De uma andorinha
De quantos abraços, aquece o meu peito
O sol do Verão
Lembrou-me dos Invernos, passa-se as rotações
As translações
As viagens
Permanece aquele avião, aquelas asas
De menino

Pequeno princípio
Que uma esperta raposa, caçada bailarinos
Me chama a cativar

Cativo aquilo que cultivo
Da cultura nasce alguma rosa
Com espinhos, mas n'alguma ponte entre cá e lá
A beleza reside nonde o véu se abre
E não é mais necessário ver
Pois, cativares
A verdade se mostra, estás aberto?

Olho ao espelho
Aberto aos olhos do lúdico toque do tempo
Passos num deserto de olhos e ventos
Rugas, lápis, abraços e cataventos
Arrumo meu avião, vou me embora
Dou adeus para voltar
Aqui mesmo, d'onde nunca sai
Das vistas daquele menino
Das vistas daquele menino
Que me perguntará sempre:
És tu?

segunda-feira, 23 de setembro de 2019

A Geografia como Descoberta

 Venho aqui trazer um pequeno texto sobre algo grande, algo que não terminará a disciplina geográfica, porém, se apresenta como a redução atualizada de meus pensamentos sobre a mesma, depois de uma graduação e da aplicação da visão-geográfica pelo mundo a fora. Só nesta frase inicial, apresento o à-fora e a visão-geográfica, dois aspectos de minha estrutura, aos quais, porém, talvez um dia exemplifique de forma mais condizente.
  A Geografia enquanto um gradiente re-ordenado de operações realizadas para se transmitir um certo aspecto do De Fora, isto é, sempre tem algum fundo de linguagem tensionada ao real concreto: quando estou sobre uma paisagem que conheço, quando desejo ir a um lugar, mesmo que nunca irei no mesmo (mesmo em romances), ou quando não há desejo, mas, obrigação social de estar presente em dado momento (o que chamo de obrigação cronológica, ou cronotropia). Para este aspecto do que sei, ou do que sabemos, posso chamar e dou o seu primeiro nome de Radical e de Mapa-cenário
No primeiro, e o uso de forma a lembrar certamente Ortega y Gasset, existe algo de incontornável, e esta característica é fundamental: existe uma pedra, todo o meu sistema sensível e minha intuição e razão o fazem vê-la, não poderei atravessar aquela pedra, aquela coisa-objeto (e aqui me distancio do espanhol e fico confortável em ser coisista grego, pois foi deste coisismo que advém todo a Ciência Natural, curiosa sobre as coisas mortas). Porém, para fora daquilo que meu corpo não contorna, tem de enfrentar - logo, viver radicalmente é batalha -, existe a demanda de minha vontade, do desejo ou opinião, ao qual projeto ou tomo como projeto sobre o aspecto de um cenário. Este cenário me é dado e pode ser exemplificado em um mapa, logo, chamo de Mapa-cenário para diferenciar a ideia, pois não me surgiu par ordenado e a língua me limita, nestas horas da noite, a diferenciar melhor. Para um cenário, entendo como o desejo de que algo concreto possa ser conformado em linhas, polígonos, planos de metas, estatísticas ou nomes técnico-científicos bonitos e acachapantes, isto é, quero - logo, vontade de querer e ser querido, seja, assim, esta definição de "volanté" oriunda através do neotomismo de Gustavo Corção, seja sob o coração dos homens, com a vontade de poder, obediência, de um De Jouvenel, Nietzsche e afins. A expressão da vontade de domínio e organização e gestão é aspecto segundo, tirando momentos muito específicos da vida humana, como em guerras ou comércio, na maioria dos casos não me preocupo com o como chegar, tirando obstáculos - como a violência urbana, o trânsito, etc. - ou até aspectos belos - como um jardim que leve minha amada, um museu com meus pais, um parque com meus filhos (logo, a beleza é sempre total, uma presença total de Lavelle, a feiura, particular) - que afetem os meus passos imediatamente. Aquele aspecto segundo do mapear, logo, não é imediato, não é da vida humana, mas, de certa ação social, com efeitos históricos alardeantes por algum historiador, e que se traduzem na representação, cartográfica, estatística e mesmo literária (àquela mais próxima da vida concreta - e nisto, de certa forma me aproximo da fala de Olavo de Carvalho e do livro de Éric Dardel da importância da literatura -, devido à tragédia, comédia, drama, ou seja, seu meio de escrita, que é bem melhor que a esgrima do papel milimetrado do técnico); assim o ato de representar algo geograficamente demanda uma tradução para o futuro, do passado em vista de nossa limitada área condicional e ativa do presente, sempre tomado aqui como primordial, radical, seja com minha influência de Gasset ou de Lavelle. Tal tradução se dá, em vistas de minha leitura de Vilém Flusser, sobre certa demanda dos sistemas de necessidades sociais e da vontade do sujeito, sua organização, ao que chamo de "formação do mapa", demandaria outro texto meu (se é que voltarei no assunto geográfico).
  Deste longo parágrafo, uma tormenta para todos, já que não me limito a ter piedade de leitores (sou um "jovem-velho"), advém certas questões e palavras que são incontornável, querer e representação, para isto eu chamo do primeiro aspecto, do que sei ou virei a saber, do Cogito. Porém, existem mais dois aspectos que refleti, agora, nesta madrugada, que a Geografia se preocuparia: o ignóbil e o incógnito.
 Sobre o ignóbil, é todo aquilo inarticulado, presente no mundo, logo, a Geografia é sempre referente à um mundo - mesmo imaginário, ainda terá ligação com o incontornável, como uma representação -, que é possível de ser apreendido, porém, não possui o domínio da vontade humana, o é irreparável. Trata-se de tudo que nos chega, pelas leituras ou sentidos, que vai se perdendo, é, de fato, o esquecimento do que não importa no presente, o que passa, o trajeto - geralmente, se não encaixado naquilo que achamos Belo, raiz do fixar, do ruim, raiz do evitar, ou Útil, aspecto de fixação para o econômico. E fora do jogo de fixações e evitamentos está certamente o mundo de monstros - e esta coisa-criatura será agora importante -, mas também daquilo que vai nos ocorrendo e não guardamos, daquela série operativa que simplesmente não florescerá em nada, certamente, aí está nossa sustentação física que nos exerce o alimentar, o beber, o dormir, talvez em seu limite em ser representado, o prazer. Logo, o ignóbil é verbo, mas, apenas verbo, o que já é tudo, porém, não é percebido - ele o pode, com certeza -, mas, passa, logo, se usarmos as lentes do Tempo, o aspecto geográfico do ignóbil é passado (você passará por tudo aquilo, ao inarticulado e esquecido, mas, passará). Uma boa parte do pensar geograficamente, logo, fluindo por toda aquilo que chamam de Ciência Humana, busca erradicar o ignóbil, a Arte, busca esquematizá-lo, matizá-lo em cores e passos de dança, o aspecto ignóbil tem algo de passagem, algo de buscar o lúdico - no sentido que me traz Corção, do mito de Campbell, da sofisticação lúdica de Huizinga, do simbolismo de Eric Voegelin, presente fortemente na tensionalidade que trago neste texto -, assim, busca ser transformado em algo com sentido (palavra que tomo de Viktor Frankl) pela própria natureza humana (seja lá o que isto for, como diria um Isaiah Berlin), sendo o possível, porém, também o passado, que desemboca em nosso vazio existencial. E no par possível-passado, se dá o trajeto, o caminho, mas como um trajeto cego-surdo-mudo é a própria fonte permanente do ser humano em sua expressão no mundo, porém, é inarticulada, não está na categoria da razão ou por ser de difícil tradução, contém neste espaço a lenda, o causo, o costume, mesmo o sentimento, um lugar limítrofe. Porém, mesmo estas ferramentas me são incapazes de expressar o passado, são sempre deficientes por sua natureza, elas precisam ser deficientes, pois é a "geografização" do ignóbil, daquilo que mesmo esforçados, seremos ignorantes, porém, abertos para saber e expressar.
  Confesso que este parágrafo do aspecto geográfico do ignóbil é difícil, trata-se de texto recente, trata-se do meu agora escrito, porém, coletemos que o que temos: a Geografia do par Mapa-cenário e Radical, aquilo que chamo de Cogito (em uma piada séria com Descartes) e a Geografia do Ignóbil, do possível-passado em nossos trajetos cegos-surdos-mudos deficientes, porém, possíveis de serem fixados, evitados, mesmo que muito nos seja irreparável, poderia parar aí. Eu simplesmente poderia terminar meu texto e seria um Moderno, ser um definidor, organizador de palavas. Mas, busquei além, busque o Além. Estamos que o limite entre o ignóbil e alguma outra coisa é onde vivem os Mitos, os monólitos do tempo humano, aquilo que não se sabe a fonte, porém, que são mais fortes sendo sutis que a espada de qualquer rei - eu poderia dizer que são condições da espécie biológica, da estrutura ou da forma, se eu fosse um ateu ou do designer inteligente -, aqui não há possibilidade de história, nem mesmo há possibilidade nenhuma para o limitado humano. Na Geografia do Incógnito, tenho registros ignóbeis em contos ou grandes catedrais das religiões, ou mesmo nas limitações sociais mais básicas, em toda a fundação (e me lembro de Asimov), do instinto gregário; e é apenas pelas falas mais silenciosas que posso registrar o geográfico disto, posso fazer esquemas arqueológicos e antropológicos, posso imprimir o meu eu em canções ou simplesmente me impelir por certas atitudes morais, porém, nada é possível aqui.
 No Incógnito, não há apenas humanos, não é apenas o Cogito nem Ignóbil, mas, o jogo (sendo o lúdico disto já uma tradução) de sombras, cores, luzes, mas profundidade. A taxa de silêncio cresce ao ilimitado nesta região se comparado com Ignóbil, logo, lá é sem fronteiras, pois entende-se que teremos ali o infinito, algo parte de nossa imbecilidade em tentar conceber o infinito, claro. Lovercraft, Robert Howard me vem a mente, quando ali coloco, como limítrofe entre o possível de ser conhecido, análogo ao lúdico, o mundo dos monstros, da destruição primal, do temor, daquilo não apenas desconhecido, mas da tormenta em si dos elementos naturais, daquilo que habita nas sombras - com certa taxa de caos e entropia. A morte habita ali, morrer habita o incógnito, logo, um "espaço da morte" é mero slogan literário, pois, em si e este habitante do Incógnito é um bom exemplo de uma das características-chave desta região: é incompreensível, sempre o será, não há repetição, não existe em nós enquanto humanos, enquanto potência humana, logo, sem auxílio do ilimitado de Deus, uma transcendência pessoal do incógnito. Poderia chamá-lo de mistério, mas o próprio mistério já nos é a mensagem, já é a única voz que advém dali, ou melhor, de lá, do Altíssimo, isto é, Alguém que é mais que o incógnito, que o impossível de saber. Se neste ponto do texto, o leitor vir com ranger de dentes e choros sobre religiosidade, ou sobre como um cristão é limitado - apesar de considerar que os islâmicos, budistas e hinduístas me compreendam -, ou qualquer coisa do gênero, recomendo que aqui me responda o quanto possível que a própria estrutura de realidade do leitor não se limite apenas ao ignóbil e o que ele diria dos monstros em sua vida, pois, eles podem até não terem presas ou qualquer característica ficcional, podem apenas ser um julgamento de que as coisas dão errado na vida ou qualquer bobagem limitada de psicologia, porém, prefiro pensar na profundidade e na minha própria limitação, não só não minha, como sua e de toda a humanidade, seja lá o que isto for, no que se refere que todo este "pode" sobre o incógnito já seja este escritor tentando expressar o inexpressável. Se o milagre existe, se o monstro existe e se Alguém está conosco, cabe a cada um sua língua e responsabilidade por ela. O que não poderíamos saber, aquilo que nos está posto e será misterioso para o sempre, ainda está.
 Se algo está, pode ter sua Geografia, mesmo que esta se limite as fronteiras do Incógnito e do Ignóbil, mesmo que eu só a possa lhe mostrar como Cogito, em representações, o fundamento da ação geográfica é a Descoberta do estar, dos vários "estares". Fundamentos de palavras, gradiente re-ordenado de símbolos, impressões ideológicas, patológicas, literárias ou intuitivas, a descoberta no sentido de desbravar a efetividade dos símbolos registrados para a minha vontade, pela potência do outro afim de descobrir no ignóbil nossos trajetos passados e passos futuros. E neste salto, digo que a Geografia, é descoberta, se continuarei este texto, isto já não é mais meu, mas parte do incógnito.

sábado, 27 de julho de 2019

Indomável, Louça Chinesa, Vigia no peito

Indomável, presença
Daquilo que não mais nomeias
Das tempestades, em cadeia
Nacional de ser tudo, mas
Mais um pouco
Mesmo limitado, mesmo não original
Indomável, na honestidade
Fortaleça na crença
Faça você mesmo, lute
Contra todo o demônio dentro de si
Escapatória não há
Mas, sempre uma mão maior, fundamento
Te firmará os pés pra suportar o próximo soco
Sem que porém, jogue a toalha

Indomável
Indomesticável
Se proste à Verdade, deixe de ser escravo de muitos senhores
Indomine-se
Indenomine-se,
Nas épocas de Trevas
é que podemos ver as estrelas
E nos fazem valer, as lanternas

---
Louça Chinesa:

Um poema não pode ser engasgado
Se te faz ouvires calado
aquilo que esconde
nem o maior dos pecados
de um coração partido
por nosso próprio punho
tento, em vão, colar os pedaços
daquela louça chinesa
Que caiu da antiga mesa
de nossa velha casa
não tendo mais lar, nem louça
fiz uma barraca, no quintal
busquei fazer de Babel estas linhas

Perseguindo o céu, com poemas
tornei a fechar minha voz
à tagarelice do mundo
que oferece abraço, porém de serpente
que dá o beijo, porém na face da busca dos centuriões
que dá meu ouro, já apenas meu...
Nunca nada mais

E nestas minguadas fortunas que não tenho amores que nunca senti
palavras que perdem o verso
a pedra que afunda no lago
daquele velho quintal
sou eu
afunda ao fim.

---
A ponta travada do peito a garganta
Emudece-me na parede

Como um quadro de uma casa velha

Que é meu coração às terças

Mas, sempre às quintas
Prolongam às quartas
Mas, vigia
Vigia o pátio do meu peito
Um tritrinar afônico
Tritura a minha voz
Meu próprio, eu
Já nem sei muitas vezes se estou aqui
Ou nas paredes
Inanimado, quadro velho
Que se esqueceu de ser visto
Mas, de prego vacilante
Torto é seu esquadro
Na casa velha em que vive 'sta min'alma


quinta-feira, 27 de junho de 2019

Superar, Vício

Só se supera quando se entende ou se sabe o que viveu. A ciência advém de uma certa brutalidade consigo em uma guerra interna, mas também um acordo. Abraçar-se, você e a memória de seus atos e omissões, o nosso acesso ao passado, faz parte deste processo, severo, porém doce, de perdoar-se verdadeiramente e partir, assim, ao novo.

---
Ter o vício parte também do desejo de possuir para si uma experiência completa, o início e fim de um ato, que você presencia e lhe traz prazer. É a busca de completar a sua incompleta existência, pelo consumo de coisas, que você organiza, seja em atos, técnicos e cheios de maneirismos - como fumar um cigarro, beber uma bebida, manter uma relação com alguém tóxico, etc. - e que lhe darão o poder de terminar aquilo. Me parece uma busca por ser não apenas o criador, mas o viciado busca destruir/consumir a coisa em ato, busca o controle, em si, do tempo - a morada da alma - mesmo que este seja apenas o "tempo das coisas".

Coração severo, Esqueceu a Liberdade

A severidade no coração
Alimenta de si
Complacente dos outros
Faz do manto celeste

Seus sonhos cadentes
Veste a armadura de um castelo esquecido
Entre ruínas de desejos e fúrias
Um lampejo ainda se faz
Uma mão ainda te firma
Cristo ensina a solidão e sacrifício
Necessários pra ver o outro
Roma caída de senados e plebes
Morrendo nas províncias, invade
Império dentro do coração do homem
Na língua escondida das estátuas
Os césares traficam, sua alma por prata
Eu estive, Estige,
Sobre os rios egípcios, nas areias dos livros
Me livrei da ignorância, frutificando dúvidas
Agora, em ruínas, os anos acumulam
As portas de um coliseu de gente
Acumularam-se nos ônibus e trens
E eu, na estrada rotineira
Impérios, césares e a mão que firma
Terá força pra lutar?

Escreva, veja, severo

Escreva, veja, severo

---

O homem que esqueceu o que é liberdade
Permanece na sua prisão
Costumeira, em carne que vê o mundo
Apenas uma rosa, sem flor, cheia de espinhos
E viveu, como um cientista de outros tempos
Em um experimento, chamado vida
Um projeto de filósofo
Um pequeno escritor burguês
Um bom aluno, porém, nunca um professor
Um bom ouvinte, mas, nunca um conselho que preste


Aquele que esqueceu a liberdade
De não ser lido, de arriscar buscar a vitória
De sair pra fora de casa, pela janela
Pois, temia que não lhe dessem bom dia na porta
Viveu trinta anos preso dentro de si
Murmurando palavras, escrevendo versos
Preso, naquilo que chamava de lar
Por, não ter mais memória do que é impossível
Contentou-se, com o imaginável
-Não é possibilidade, se não há mais como tentar!
Me disse o cão-de-guarda, em algum banho de sol

A liberdade é um mal para a cabeça, você a tem
Quando começa a ver as correntes
Quando sente o que não sentiu
Quando dói, mas, ainda assim, você pode voar
Por mares de nuvens tempestuosas
Alguma fênix existirá? Ou será apenas imaginação
Daquele prisioneiro de si, escrevendo em carvão
Achado em algum canto de fogueira
Esquecida, esqueceu-se, de seu coração
Pulsante, preso no peito




---
Incompletude daquele que perde-se
Nos montes
À vistas de achar os gigantes
Escondidos sob as capas dos livros
Deve calar-se e amiudar
O tempo sob as barbas de seus anos
Em regresso de força e vitalidade
E buscar guardar o que foi bom
Para transmitir que tentou de bem
Que buscou o bom combate
Que travou, contra os demônios de si
A caça nas sombras
Mesmo sem mão amiga, mesmo calado
O trecho no caminho que jamais cede
Mesmo sendo isolado


Sabedoria sê resposta, mesmo o que não ocorreu, por mais do que me acontecera!

sexta-feira, 14 de junho de 2019

Segredo da Esfinge, Tarde feliz triste manhã, América Latina

E a honestidade consigo é a verdadeira honra


---
Pitágoras me escreveu uma carta
Nela, alheio li, fora de meus
Pensamentos, pelo deserto
Por suas areias, o festim do tempo
Cada passo pesado dado
Voltou a ser leve e aquecida
Memória de um homem
E seu menino
Jogando pinball, num boteco
Numa vila, duma cidade temperada
Ao sul do mundo
Donde já não estou

Me diz a Esfinge, a resposta
(Secreta para Édipo):
-Jamais voltarei a ser menino
Jamais estarei a ser de todo homem
Logo, velho, morrerei nestes passos
Mas, pra sempre deixarei pegadas
A quem as queira contar nas areias

Fechei o livro, com a carta do matemático
Contei as horas: eram 2 da tarde
Não sei de qual domingo
Era o aniversário de meu pai
Já não era mais aqui
Mas, lá que estava
Lá no meu coração
Aonde vaga o deserto que não o alcança?
Pois, solto é o infinito
Dos passos que jamais serão mapeados
Na areia
Do tempo
Da língua da Esfinge
Do vento, no peito
Que vira as páginas do meu livro.

---

Dois montes de concreto
Abriram o céu azul
Azul das tristezas melancólicas
Latiam os carros, gritavam guardas e vagabundos
Meu peito estava silencioso
Aos olhos dela
A garota que olhava para o céu
Pintava as estrelas seus pontinhos
Sardinhas no rosto do universo
Recheios das nuvens de algodão
Que sopradas pelo tingir
De brancos ossos
Levaram a preocupação do marinheiro
De oceano profundo, mas que secou
Olhava a garota nele e ele nela
Algum ponto cardeal secreto
Escondido, incerto
Na vida presa nos novelos
De um céu azul
Vazio de nuvens, estrelas
Porém, como o mar, posso navegar?

Te amo, naquele dia.
A chave caiu, a porta escancarou
O José não pergunta do agora, mas de ontem
E meus olhos de Capitu, ressacam
O mar seco do marinheiro
A muse olhar ao céu
Pesca a chave, dos Argonautas
Abre o tesouro e firma
Como o bem que pode ter

O abraço do instante, do Eterno Presente
Que não nos prende, nos dignifica
Envio a você, moça que olha o céu
Azul como a tristeza, terminada
Em toda a aventura que poderás ter
O abraço e beijo infinito
No instante, sem mito, poesia ou enseada
Pois, navegar é preciso, e navegando
Sem parar

Olha o céu, pequena, olha
Que brilha todo o teu ser
Obrigado
Pelo porto seguro
No céu do oceano azul, de mim e nós.

Segunda, 10 de junho.


---
A gente morre sozinho, ao sol e ao escuro
Aproveite
Abra-se
Pois, fechei-me em casa
Joguei a chave
Esqueci-me


---
César, vencido entre as pedras
Foi acorrentado nas caravelas
Foi tomar noutro lado do mar
As terras da Cidade do Sol
Ao Norte, nasceu as 13 Colônias
Ao Sul, um Império Espanhol fragmentário
Em centrípeta força
Vai de reto ao sul ainda
O Gigante de língua portuguesa dorme
Sonhando em acordar
Mestiço, centrífugo e munido de cetro férreo
Um povo que já não crê no esforço de anos
Mas, quer tesouros em dias
Pirataria nacional
Corsários, de favela ao asfalto
Do café até a soja
Planta, mas apenas colhe
Agricultura sem semeadura
Que livros se queimem
Para fazer o carvão em dias frios


César, bêbado de vinho
Não reza mais para cruz
Pois, os meios findaram em fins
E vidas terminam no eu
Eu revolto em si
Oceano tempestuoso
Engole as caravelas
Morre o náufrago que de livros sem páginas
Tem fome.


quinta-feira, 6 de junho de 2019

Lápide ao Sol, 27 anos

Me enterrem com o rosto
Virado ao sol
Que banhado sobre aquelas tardes
Refletiu a vida

Das estrelas que jamais morreram
Mesmo tendo sido, há tempos
Desaparecidas no espaço frio e negro
Aonde busca os homens?
Sua própria divindade
Nesta mortalidade?
Nesta múltipla estrada, de uns poucos caminhos
Mas, que será sempre feita
Das tuas pegadas
Dos teus passos, alguns dos mais dolorosos
Serão os jamais dados


Me deitem finalmente
No alto daquela montanha
Ao qual estive preso na minha filosofia
De voar por aí, nas palavras ao vento
Escutadas de seus espíritos
Num peito vazio, de mil ventos
Mil montanhas a correr atento
O lar que carrego comigo

Me deixem naquela tarde
Onde o sol aquece o rosto
Já calvo e antigo em 27 anos
Mas, eterno
Na transcendência da comunhão
Dos laços e do amor
Que tentou escutar
Mesmo pequeno
Mesmo fraco
Este homem que agora é d'outrora
Agora jaz em uma caveira, que mesmo ela
Jaz ao sol
Mesmo a lembrança dos amigos e amores que se vão
Que te esquecem
Permanecerão

Pois, no além navegam apenas os fortes
Que deste mundo sabem não se contentar
E, banhado ao sol
Daquela tarde nos mares de montanhas
Aceitam que a estrada só termina
Quando o sol deixa de brilhar

Me enterrem, sem epitáfio que não seja
"Banhado ao sol"


---

Hoje, conto mais um ano em minha linha

De passos frente ao abismo
Na borda desta
corrente de desespero
Equilibrista do nada interior
Com alguma coisa pro Outro
A estrela brilha e alumina, dizem
O espaço de matéria negra dentro
de si
A Terra gira, ela nunca para,
esperança de um porvir
Numa pólvora acesa de fúria,
Numa cama deitado em pavor
Nada reflete-me no espelho
Que não o vento
Frio, neste primeiro dia de sol
Numa semana insólita de chuvas
Busco a pessoa que fui numa imagem
Na frase amiga de verdadeiras companhias
Mesmo instantâneas, como a vida o é.

Somos instantes, preenchidos de infinito
E não queiramos percorrer à beira
Sem antes ver o mar do mundo
Navegar é preciso
Resistir-se, mais um dia, também
Mesmo niilista de mim, meu mundo é platônico
Mesmo emotivo, sou gélido como aço
Mesmo místico, severo comigo
A tensão, tensionar-se sem morrer
Sem matar-se
Pois, você está aberto
Se fechado, abra-se, abrace
Aquele amigo, aquela mãe, aquela amante
Ou ninguém, como eu sempre estarei
Navegando nos oceanos profundos
Aguardando e vendo o mundo
Mostrar, pandórico
O infinito a quem busca humilde
Não ser nada mais que superar-se
E ver a unidade
A consciência
A minha presença
Te abraçando agora, se sofres leitor
Compartilho contigo as lágrimas
E com elas, façamos mar de Camões
Pois, o desterro é a ordem
Dos que tem o lar no coração.


Aquieto-me nas palavras
O poema está se fechando
Completo 27 anos de Fernando Pessoa ou Augusto dos Anjos
Completo, estou vazio
O vento gélido curitibano trespassa
Cristo, em minha praça
Deus, à Ágora, calou-se
Pois, o seu reino não é deste mundo
E agradeço a Ele, nesta oração poemada

A caneta descansa, pois no peito
Um poema se lê.


quarta-feira, 15 de maio de 2019

Honesto, andar, Galope do Enforcado

Ventrículo, de seu coração
Pesa ao levar a água
Que compõe o meu sangue
Você que se esconde nas sombras de meu ser
Busco imediatamente, como procuro
Palavras para descrever que:
O que é original é prisioneiro de si
O honesto, é livre ao mundo
Corre fluído, máximo possível expresso
Nesta língua que escrevo
Aviva do ventrículo ao poeta
Que pelo poema, se fará o mais falante
da mudez que existe na palavra
Que diga tudo o quanto possível
Naquele que pode não ser original
Mas, honesto consigo.

---
O que faz andar é aquele passo ainda não dado.

---
Enforcado na beira-da-estrada
Passei por ele, condenado
Eu a cavalo, a galope
Ele, porto de pássaros, pendurado
Livre de meus passos, preso em meus pensamentos
Já dele não obtinha respostas, era mudo
Surdo estava seu peito
Como eu cego do que tinha feito
Pensei mesmo que ele era mais livre
Pois eu, preso neste terreno de possibilidades
Delas, só abraçava a angústia

Condenado, ele era eu
Na beira de uma estrada
Me achei cavaleiro viajante
Como enforcado pedante
Entre Quixote e Judas

Passou-se o tempo em meus passos
Já nada mais ali havia pendurado naquele poste
Nem eu, meu cavalo
Não saberia dizer se sonho ou não
Me ver enforcado cavaleiro, errante-pendurado
Sabia daquela estrada
Ela ainda estava lá
Era minha vida
A única mantida, contida
Entre cavalos e cordas

O próximo passo
É aquele que ainda será dado.

"Galope do enforcado"

Moro no bosque, Domingo furioso

Eu moro naquele bosque
Perto da serra
Onde um riacho se esconde
Entre o meio de meu peito
Silenciosa, melancolia
Alimenta meu espírito
Com aquilo que não tive
Obtendo
Alguma ou outra alegria
Mas, apatia
Tudo apatia

---
Na fúria, de um domingo
Qualquer
Famílias voltam com sua criançada escandalosa
Em pais mais escandalosos
Tudo, um bravio de bestas
Mecânicas, ônibus, parques moldados
Tudo, um qualquer
Sol de outono coroa a cabeça com calor
A gritaria das máquinas e crianças permanece
A serra de minha casa está longe
O lar do meu peito, desbastado de novas
Árvores está
No mundo
Máquinas e crianças-pais, tagarelam
Tagarelar pra não deixar-se o silêncio
Tomar de si
A voz mecânica
E num coro preso, sem tom ou som
As vozes se abafam, na barulheira
De domingo

---

domingo, 28 de abril de 2019

Tagarelice, Testamento, Escrita dentro

Cada vez mais acredito na auto educação. Exige mais disciplina e a pressão social do meio - amigos, colegas e professores - do é difusa ou diluída pelo contexto das obras de referência.

Não é apenas estudar e ler, é saber quando calar a boca e refletir, silenciosamente e consigo (se bem que as vezes parece que se topa com gente de interior vácuo), porque coisas como este mural são como amplificadores de vozes: milhões de vozes, esperneando em busca da atenção que não dispendem consigo, repetindo chavões e slogans.
Talvez esta seja apenas uma voz mal-educada, verdade, assim como isto não vai ser lido e talvez seja só esta "tara pós-moderna" com opinião, mas em alguns momentos quero ver uns vídeos de gatos ou memes normais, usar as redes sociais pra rir... Porém, realmente eu deveria ficar no silêncio, assim se ouve, mas tente aguentar a tagarelice infernal.


---

Por dentro tudo, por fora, nada.
Na tensão em ser e parecer
e sendo inútil,
me despeço nestes passos
Perdidos em algum deserto
De prédios
Sem almas abertas
Só portas trancadas
Na janela escancarada
Deste farrapo aqui
Triângulos místicos pitagóricos
Não fazem efeito
Slogans de Marx e Mises
Biografia patife de Nietzsche
Nada surte efeito
Neste rigor consigo
Misericórdia débil com outro
Imbecil coletivo
Estou sempre tido incluído
Enquanto, nenhum fármaco
De mister
Parece reduzir a dúvida
Cartesiana
Sobre onde termina meu eu
Começa o seu
Mas, indo além
Terei eu confessado em Hipona?
Terei eu os cavalos de Vontade Potente?
Terei?
Sem ter tido, sofro em ser
Reduzo à aparência
Coletando evidências
Escrevo esta carta testamento
Pretérita
Que dentro do peito não pare a guerra
Pois, a paz de, me diz Tostói
Nele está
E rogo fortaleza
Rogo por você, leitor em sua mesa
Sê diferente, sendo honesto
Com você.



---
Escrever, sem parar, em busca
Da tensão, linha presente
Numa mera aparência imprimida
Impressão do mundo
Impressa nestas palavras

Achei ser doente uma vez, pela palavra acometido
Mas, não mais
Minha doença nada tem haver com a cura
Que a escrita me traz
Sem parar
A tensão permanecerá
Entre o ser e o buscar o todo
A tensão elétrica das máquinas não irá parar
A abertura do espírito, por alguma música da alma

Posso permanecer azedo
Paralisado
Conformado, estatizado
Libertado estarei aqui
Nesta pena
Nesta pena e café
Ao meu lado, triste gato, ágora cachorro
Pássaros na janela
Sol lá fora
Assim como a lua caminha
Numa natureza
Ou na cidade-fortaleza sob meus pés
Os passos de uma escrita ilimitada
A partir da palavra indizível
Indescritível
Que é viver
Vivo impresso
Impreciso
Na tensão, sem parar
Escrever, é lutar
Dentro de si, pros outros.

Poente, Fantasma, Ronda da Madrugada

Poente.
Odeio... Estar assim
Morto de esperar
Esperanças afogadas
Nas lágrimas que já estão secas
Como um riacho que não mais
Desemboca num mar
Não mais quero morrer apenas,
Quero virar solo, ser útil
Porém, silencioso
Porque o som do meu peito
Dói numa desarmonia de minha alma
Irrefletido num espírito
Que se perde
Entre os dentes
Vociferando palavras erradas
De um cara errado
Deprimido, entre o sol
Poente

---

O fantasma atormentava seu coração
Mas, eterno é o presente
Que se lembra da solidão
Dos passos cansados,
Ar parado no peito
Quando, insuspeito
Abriu-se às vestes
De um abraço solar
Abraço amigo
Fazia tocar, o coração fantasma
Desperto estava
Naquele presente




---

Há um silêncio pela casa
Ronda a madrugada
Firma na noite
Não é alvorada, nem tu
Oh face iluminada
Deixa de ser contada
Há um silêncio da penumbra
Mesmo com a lâmpada ligada
Tudo permanece ali
Eu, ali, preso
No eterno presente
Na função arbitrária
Julgamos um passado que esquecemos
Esperamos futuros possíveis
Mas, estarei eu sendo juiz implacável
Sem direito à me deixar em paz?
Mas, estarei eu sendo possível
De sustentar pernas, sonhos e bocas
Quando às tempestades passar?
O presente, lhe sou preso
O presente, lhe sou grato
"Sê tudo naquele que crê"
Que pra Ele se deixe o julgo,
Mas, dá força
Pra segurar minha espada
De ferir a mim mesmo
Que eu esteja presente no que sou,
No erro
No acerto
Posso estar presente, pra mim mesmo?
Peço, rogo
Naquela morada há silêncio
Naquele lar, o meu coração
Ouço a harmonia da canção muda
O eterno presente é caminho
Não apenas, um simples fractal
Pois, sou passarinho
Pois, voo na noite
Daquele silêncio, um mundo um cantinho
Naquele aquietamento
Não sou o universo
Escuto o verso
O presente da alma




Escuta, amigo
Escuta o silêncio

quarta-feira, 24 de abril de 2019

Veste, Rosário, Raminho, Lua e Sol

Nas vestes de sua boca
Teci a minha renda
Do soldado cansado descansa
Rendido aos teus braços
De menina, que aguenta.
No perfume no ar
Que tu voz desperta
Há não mais que esperar
Àquela rosa
Que vi naquele pequeno
Jardim d'espírito meu
Me chama
À aventura
De ver o céu, contar as estrelas
E ver que nele falta uma
Sol que é você

---
Douta moça, sábia
De um deserto em rosário
Levava nas contas
Cada livro e mister
Orava por mim
Orarei por ela
Neste deserto, que em horas
Tem flores carmim
Outras é o vermelho do sangue
Pude escrever neste oásis
Temporário de palavras
Pois, as palavras são vento
Mas, o vento infla os peitos
Respirando e dando efeitos
Mando a ti este feito, sábia
Em meu rosário conto os pontos
Cardiais do nosso caminho
À Ele
Em nossos vacilantes passos
Sempre vacilantes
Estarei sempre contigo
Sábia
A ler-te os livros
Das palavras ao vento
Agradeço, obrigado
De um transpassente
De um deserto, que também
Há de ter suas flores
Com rosários"

---
Numa noite, um passarinho
Levava um raminho
Na boca
Era o mar da escura treva
E ele atravessava-o
A achar terra
Meu passarinho voou
Um galho achou
Dele plantei minha árvore
Dela fiz minha morada
Meu passarinho, minha amada
Vive comigo
Eternamente, enlaçado
Nos ramos de meu lar
Naquela nova Terra
Ao quais os mares
Já não mais cobriam
Apenas banhava
---
Aspecto de uma Lua
Que beijava o oceano, numa mágoa
das cinzas praias
Viu-se, pouco a pouco
Ser Lua Nova
Sua luz, vinha do Sol
Seu coração, aquecia
Mostrando novamente
Sua face com aluz dos dias
Oh Sol, tu que me beijava na boca...
Poderei eu, disse a Lua,
Te acompanhar nos dias?"

quinta-feira, 18 de abril de 2019

Insônia, Espião, Lanterna inspirada

Insones, suicida
Cada gota que caiu
No mar da tua vida inútil
De um mundo de falatório
De uma gente má com algum outro
De fé e esperança que chamo de amigo
Mas, que no fim, estamos sozinhos
O caminho é solitário de gente
Só Deus é presente
Ai de mim, pensar em expulsar
Mas, duvido de mim
Não mais que em mim
Nesta egolatria alcoólatra
Ídolo do Eu
Subjetivo aparente, insones

Não acordo, pois nunca dormi
Não sorrio, pois pouco me alumina
Não beijo, pois amar é uma lembrança
Já não abandono o barco, este barco
Do negativo
A negação de que posso, virou a droga
De que tenho
Disponho-me como algo possível de ser feliz
No passado
O futuro, me traz pavor
... Já não penso, atuo
Já não ajo, vejo
Não me escuto, estou em silêncio

O suicida abraça em si
O futuro como eterno passado
O fundamental lhe é invisível aos olhos
Duvida poder ouvir Ele efetivamente
Duvida sobre o presente
Como que fosse teoria hipócrita
Da gente hipocondríaca
Atrás de sua porta da alma
Não, o inferno não sou os outros
Débil
É o eu
O arrogante não o vê
O arrogante real, já se perdeu
Eu, aqui no meio
Silencioso
Insone
Suicida
...
São seis horas da manhã, suportei mais uma noite sem sono. Descanso depois, num canto da minha rotina, no abraço que não tenho.
Durmo, vejo o mundo, durmo-o
Insone, na Alma do Mundo

---

Expiatório
Atrás da porta, na fresta da janela
O espião avista a pena
Que escreve à linhas retas
O que o Mistério lhe fez por tortas
Arregaça, escritor
Que escrever a teoria é pôr-na linha
Aquilo que é disperso
Fala, cantor de gente
Mas, ajoelhará ao Temor
Ri, só ri criança
Que a risada é a constante
Nos liga a todos nós em todas as fases
Meio maligna, mas honesta
Como o choro jamais será igual
Pois, o choro é rio meandro
Afunda por várias partes
Mas, meu riso, no espanto
Treme o universo do homem
Aquele que acaba nas estrelas
Que não é o nosso
Daquele que ri,
Mas, que também pode chorar

No papel, cai lágrima
Que expia ao espião
Será o riso? Ou o coração?
Da janela, jamais saberemos
Abre a porta o personagem
A pena, jamais para...
---

Inspiração, numa inadequação.

Frente fria, numa gente de coração quente.

Lanterna sem bateria, refletindo em espelhos, pra tentar achar qual não o é: bater no verdadeiro, que mostra a terra. A alma do mundo, porém, é única real, topa no meu peito, me puxa aos ouvidos e diz:
-Olha, a linda flor de cerejeira, é linda por você estar aqui e vê-la! Aquieta o peito, que o perfume está aí, fora de você, tenha-se respeito!
Afago a barba, tomo o café quente sem queimar a boca, durmo, no torpor do sabor. O sol daquela manhã é belo, mas agradeço pelo todo, ser bem maior que o mundo.


Jardim descobri a Rosa

Andei pelo jardim, passeando em trilha de sombras mestres
filósofos mortos há muito
andaram, refletiram, decuparam
um mundo ocupado de si

Só eu me senti só
clamei às estrelas, mas, elas sempre serão em silêncio
clamei em mim mesmo, inocente de minhas forças
perdi-me em abraçar o mundo
pedi mais uma vez, a totalidade
de todas a frases, nos livros e palavras
ao vento, minha prece se fora
parei de pedir, vivi
e num ato, naquele jardim
vi uma rosa
ela me olhava, com olhos profundos
de algum mar distante
que naveguei por algum momento, instante
em que lhe disse: -Bom dia, querida rosa, em que pensas?
- No sol que brilha no Céu, na Lua que corre ao mar a noite, mas, que eu, aqui, ainda estou, instante
permaneço, parada
mas, nada de mal seria isto, pois mesmo
assim, vejo todo o mundo!
Naquela rosa plantada, colhi o broto
de uma justa poesia
nestas linhas, partilho a minha filia
e dei àquela rosa daquele jardim secreto
sempre, todo o seu bom dia


---

"Odeio sempre este sol, me faz lembrar quem eu sou"


domingo, 7 de abril de 2019

Girassol na Praça, Caminho de Amar, Sob o Mal

O amor não era pra ele, preferiu continuar caminhando. Olhou a paisagem, sorriu, guardando nisto cada lágrima do vazio que sofreu. Deitou-se, dormiu, na eternidade.
Amar não fora coisa dele, nunca foi bom nisto. Esperou, errou, jamais se perdoou.
Estes dias, o vi dormindo na relva daquela paisagem, ficou preso num novelo de sonho.
Amar não era coisa que acreditava, a porta se fechou, a luz apagou, e ele dormia.

---
Na Praça, no sábado,
Vi um girassol, cair do céu como uma neve, andou por aí como menina.
Cresceu à luz solar
Bailou como mulher, com ursos e lobos, aprendeu psicologia com raposas,
viveu a voar, com os passarinhos roxos,
Azuis e amarelos, aqueles
Que hora me pousam no bolso
Aquele girassol, me contou um segredo:
"Da vida não tenhas medo, de mudar o seu caminho, desde que no vento
Leves consigo sempre ao sol"
Saiu ele, com capinha e espada, à lutar no seu passinho
Eu fiquei, ali mesmo, no bolso, passarinhos

Fiz da conta um colar
E dos anos minha estradinha
Passei entre vários matos e muito aprendi
Na minha pracinha
Hoje, o vi,
O girassol menina, com seu reininho
de amiguinhos e flores
mandei um oi, tomamos sorvete e comemos pipoquinha
E num domingo mágico qualquer
Deu-me nova luz, aquela amarela, plantinha

Olha, girassol, olha
Que a luz é eterna
Enquanto caminhas

---
Não busque as emoções e sentimentos. Livre-se do julgamento, daquilo que pensas precisar fazer para amar, pois, isto será veneno.
Provamos o amor por atos, não palavras. O sentimento virá, pois o amar é maior que uma palavra: Amar é um caminho, o meio à vida.
---
À guerra dentro da cabeça
Da gente
Quando passou a tempestade
Teu navio está naquela névoa
Aquela mística nuvem, que encobre as paixões
Que me fez perde o desejo de mim
Que me fez odiar o cheiro do mar
Que, naquelas noites de domingo intenso
Me afoga no oceano que sou
O combate cessou, não há mais tambores
O sorriso da moça, me veio a cabeça
Naquele dia de chuva
Ensopado até os ossos, aquele momento icônico
De qualquer história contada
Pois, a história é contada sempre, queira o que diga
O estúpido acadêmico, sacerdote
Que jamais será capitão de nada
Será sempre após, sempre um depois
Antes, antes houve a crise, a revolução
Agora, haverá os mortos
As lágrimas
A ferida dói depois do corte
E quando você vê, sente
Mesmo naquele momento, a adrenalina passa
(Seja isto o que for)
Mas, daí, enquanto o navio está
Névoa matutina
O sorriso parece pequeno
Pois, questiono o que eu fiz
Ser culpado pelo temporal que quase virou o navio
Encharcou-me até os ossos
À guerra me levou
Dentro da gente
Dentro do peito, os tambores vibram
Chamam pela batalha que passou
Que eu sobrevivi
E que talvez, torça o nariz, como torço o espírito
Por ter superado
Levado com leveza
Beijado a princesa
Ou, apenas, ficado

Daí, ela veio
Como de mansinho, não me convenço
De merecer agrado
Busco motivos, pra no oceano morrer afogado
Mas, ir para a guerra, meu amigo
Meu criado, minha Alma
É lutar, não brincar com o cajado
Livra
Leve
Tenta voar como o pássaro, capitão
Pois, você consegue
A ferida doerá apenas depois do corte
A lágrima, depois do não-dito
Mas, o sorriso
Aquele sorriso
Dela, da sua Alma
Aquele sorriso é ao Infinito
---
Os males se espalham pelo mundo, queimam a tudo, corrompem o que foi belo, o que estava em nós, aqueles que eram bons. Duvidaremos, porém, não é errado, temeremos, porém, temer Aquele que É nos trará coragem, buscaremos algo que sustente, mas, a verdadeira base é a estrada.
Sim, o mal é em maior número, mas, diga, meu amigo, aquilo que é bom, mesmo que único, mesmo que secreto, mesmo que você não creia em nada que lhe faça ajoelhar-se e ser humilde, mesmo que você nunca o veja operar, ele está lá. E a bondade está em menor número, porém, é insuperável, frutifica, pois não precisa nada mais que se deixe por ela infundir, é duradoura, mesmo com todo o açoite, toda a mágoa, toda a solidão... Você poderá durar, não será bom sempre, não seremos nunca, mas, nosso mal não remediará o bem, pois, mesmo perdidos, podemos achar o caminho, e se perdidos novamente, ainda estaremos seguindo.
Admita-se aberto e receba.

domingo, 31 de março de 2019

Céu azul, quatro amigos, voz de Deus

Sofrer no eu de andar por aí
sobre a sua sombra
esconder-se
mas, falta o meu abraço
que ocupa meu próprio peito
segura m'alma dentro
não me deixar pra que eu voe
não me deixar
que voe
até você


---
Eu falei com Deus e Dele apenas ouvi o silêncio, apenas ouvi a minha própria voz. Pensei ser Ele, pensei que estávamos todos destinados a sê-Lo. Deus, então me derrubou, pois minha fraqueza se revelou, pois sou humano, limitado e frágil, um castelo de muralhas abertas ao mundo, não mais precisa de guarda que não seja o teu próprio coração. Eu falei com Deus e esperei ouvir a Sua voz, então, compreendi, eu o ouvi pelas coisas. E não precisei mais ter esperança, nem tanta fé, tive certeza.


---
São nas palavras dos gestos e atos, que se escondeu o mister dos novos caminhos


---
Quatro pontos cardeais
caminham pela rua
calam estrelas pela estrada
daquela via suja
quatro pequenos caminhantes
entre espíritos dançantes
de um qualquer largo
passaram pela vida
afilharam os passos
nos muros em murros
de qualquer Centro perdido
duma capital do sul
quatro cavaleiros
cadentes de assuntos mil
fazem do coração amigo
via da amizade
n'eu céu anil


---

Olhei no céu azul
De um sábado em que eu
Estava um qualquer
Em algum momento, entre
Uma crise de choro ou um grito de fúria
Era o mesmo céu
O mesmo pra você
Meu leitor
Que voa como pássaro
Está aí, eu aqui
Nesta toca, caverna de Platão
Aqui, eu raposa
Aí, você passarinho, sabiazinho
No aguardo por alçar vôo
Canta melodia secreta
Que anoto no sigilo de meu pensamento
E escrevo na discrição das palavras
Jamais as letras do céu ocuparão
Tudo que contém o voar de um passarinho
Toda a cor azul que daqui
De minha toca raposa, enxergo
Não em letras de pergaminho
Mas, azul de uma canção
Que se fez poema
Entre nós dois, nós todos nós
Que lemos de verdade
Lemos com a vida
Pois, a permanência, o mesmo céu
Ocupa e cai sobre nossas cabeças
Séculos dos séculos
Contados em quilômetros, de linhas
Descritas
Porém, impossíveis de serem lidas
São aquelas que tocam pelo coração
Quando escuto meu passarinho
Neste céu azul de um sábado
De um escritor qualquer
Este mesmo céu
Que cai descrito, sobre nós


Pare, respire
Toma fôlego e voa
Que onde estamos sempre será pedacinho
Do infinito céu, que nos abarca
Nos permitindo voar
Passarinhos.


---



Num fio, que tu nunca se encontra
Apenas tromba com outros
Olhares
Que não serão nunca pra você
Mas, sempre de um outro qualquer
E você, está ali, andando
Por aí
Fantasma em seus próprios passos
Um ser neutral que usa suas próprias botas
Respira um ar que pesa
Que parece levar aos pulmões de um condenado
"Há estar aí"
Já não mais estava, anda
Trilha, nunca se encontra
Apenas uma fila de vários outros
Por aí
Por lá
Em alguma cidadezinha fria, contida numa metrópole
Um jovem ou uma jovem
Trombou em mim
Não soube jamais seu nome
Porém, soube que era eu
Num fio, que não mais se tece
Achei meu duplo
Um reflexo do espelho
Derretido entre o olhar do outro
Que escorre entre minhas tripas
O olhar que era meu, o refletido
Reflexivo


Trombe-lhe, e, quando vi
Havia sumido
Pois, não há nada meu ali
Que um sonho, devaneio
De uma juventude gótica
De uma cidadezinha ao sul do mundo
Passada num fio da Moira

Passei
Trombei
E você nem me viu?


sexta-feira, 22 de março de 2019

DEZ POEMAS, Ontem, Nice

Dez poemas escrevi
três para meus pais
quatro para meus amores
dois para próximos amigos
mas, um, aquele que esteve sempre comigo
este eu perco sempre de vista
este poema para mim
é mister que me faz seguir
meus próprios passos
---
Quis hoje acordar atrasado
Mal dormido, cheguei cedo
Me doeram as costas
Do continente de uma alma qualquer
Ao qual meu espírito banhava, com frases
Soltas

Comprei um novo All Star
Ele viera sem cadarço
Eu, como ele sem par
Quis hoje não me apressar
Terminei meu livro do Pessoa
Terminei-me com a vida, com o tênis All Star
Sem o cadarço
Sem o laço

Quis anteontem, me matar
Quando o mar não tinha sentido
E amarrado eu estava no navio
Me doendo por sereias de voz morta
Ontem dormi pouco
Mas, estava sem laço
Fui achá-lo num abraço
Numa portuguesa de Pessoa
N'qualquer bem-estar contigo
Seguindo passos com amigo

Hoje, quis me atrasar
Cheguei cedo
Resisti, ao medo
Em aqui neste mundo estar
Estado oceânico de mim mesmo
Banhei o espírito na alma
Navego trêmulo, porém sonâmbulo
Firme, porém em dúvida
Fractal, porém eu. Eu?

Geógrafo dos mapas das linhas
Circunavego, o poema
Alma do mundo
Ascuta
Estou aqui
No silêncio a buscar, navegar
Navegar é preciso
Quis atraso, acabei por navegar

---
Cante, que reúne a estrada, pequeno infante
Que já não mais trará apenas glórias
Serás em devaneio, cantante
A própria musa da memória?
Passarei por você, Nice
Em minha vela aos mares da Terra Sagrada
Portarei armas contra o infiel na caminhada
Mas, já agora, agora ele n'alma minha vaga
Pois, estamos sobre o mesmo Deus
Porém, difere a palavra
Em qual Verbo cantará?
Estou aqui em minhas obras, deposto a espada
Lutei, morri matando
Pois, sobrevivi na espreita
Mesmo te olho agora, Nice
Nos olhos de cada alma
Na boca de Mulher feita
O corpo de minha força, assim se deita
Cruzado como cruzei aquela rua
Em que vi teus olhos, dita feita
Venha comigo, cidade Nice
Tome comigo um café desta empreita
Cavaleiro das doze quadras
Cantar apartilhada


---
Todo o gênio morre na véspera.


sábado, 9 de março de 2019

Vender-se

"Algumas pessoas usam seus corpos e sua imagem, como pinturas ou performances (sejam íntimas ou públicas, pois hoje mesmo isto já está perdendo o sentido), ficam se enrolando àqueles que se acham muito espertos ou o são, realmente, por possuir por algum tempo a disposição destas pessoas. Porém, o comércio de si, este utilitarismo das existências, toda este troca-troca me parece uma perda de tempo... Realmente, perdi muitos dias de minha juventude buscando profundidade nas coisas, achei que este comércio de si fosse algo dos jovens, me enganei, os velhos também o fazem, porém, por falta de oportunidade, força física ou beleza, resolvem amadurecer. Talvez as crianças não o façam, mas, nelas tudo é tão espontâneo que talvez seja isto, tolhido por esta lógica comercial, logo não passe de uma simples memória estúpida, que é o que chamo a nostalgia sobre a própria vida.
Porém, talvez buscar profundidade nas coisas e não em meu interior, seja o meu erro. Ao menos, ainda me atormentará toda esta geração de vendidos, mesmo que eu ainda me venda, as vezes, por simples poder do hábito ou cansaço intelectual. Todos estes anos acumulados, com lágrimas falsas, sorrisos de fotografias, depressões por falta de sentido na vida, todo este mal-estar humano me causa tristeza, pois sou parte de toda esta decadência materialista e não existem mais ordens ideias no mundo que não te puxem ou pra baixo, em profanas neuroses, ou pra cima, em coletivismos que hora ou outra vão requirir a destruição do gênero humano.
Enfim, são só algumas palavras que anoto neste caderno, de alguém que tentou voar como gavião por cima das nuvens um pouco... Mas, não pôde, não é mais possível, a força não está em nós que nos possa levantar, assim como a profundidade das coisas, está nelas e não em nossos véus de atitudes, muitas delas simplesmente vendidas, entre gente que não gostamos e um ou dois amigos e amores.
Que se vendam, que se amadureça por falta de capacidade, que sejam tomados por este mal-estar de 2019, ainda buscarei algum pouco água ao que possa mergulhar, mesmo em um oceano que, no fim, eu demonstre ser apenas uma poça. Já não se pode deixar-se ferir e não acreditar em si mesmo pelas práticas dos outros, deixe-os livres e fale, não se cale, não deixe de demonstrar em suas faces que tudo tem seu grau de falsidade, mesmo que demorem as máscaras para cair, mesmo que você morra sozinho, ainda estas palavras serão lidas, machucará este hedonismo e talvez lhe dê até um prazer, se fizer errado, mas, se fizer certo, você mostrará a este mundo de comércio de consciências um sorriso estranho... O sorriso de ser livre, ser real, limitado e improvável, que alguém sobreviva, mesmo que por apenas 27 anos, a todo este mal-estar venenoso e comerciável."

---

sexta-feira, 8 de março de 2019

Chuva, gavião, amor fruto

Chove, como em m'alma
que escorre entre as paredes
duma vila sem nome, qualquer uma
cai a chuva, que pinga n'entre os ouvires
gotas ilimitadas de si
cata cada gole d' água
alma que escorre
chove lá fora
chove aqui dentro
forma rio
corre, vaza, escoa
no delta dum mundo qualquer
de terra salgada de lá
me escorre de cá
passo, escorro
o rio permanecerá
a água choverá
eu, riofico

---

Por um momento, vi um gavião
Nele, foi meu coração
Por aqueles horas, vi o tempo
Nos olhos do gavião, para os meus
Vi o ilimitado de meus limites
Do alto, vi pequeno eu mesmo
Todos nós
Nos sonhos imanentes, instinto de gavião
Abri a tudo meu olhar ao mundo
Por um tempo, dois dias ou mais
Pareceu-me que sabia muito
Mas, apenas olhava com os olhos do pássaro
Não os meus
Não há ordem nesta cultura da desordem
Neste galope de cavaleiros bêbados
Já estou ébrio de mim
Já me assola o gavião
Me lembra teus olhos:
Sou pó, mas sereis sal desta terra?
Pode resistir a olhar tudo
Falar nada
Voar, poderá voar, gavião?
Até que o sóis apaguem e
a luz deixe o sem limites
Voa, gavião
Por um momento
Nos vimos.

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Frutifica no peito
do seu amor
Aquilo que ele
Quis ser
Paciente, veja ele
Livre
Abraça, beija e deixa
Voar com você
No imenso
Céu presente em todos nós

sexta-feira, 1 de março de 2019

Liberte os outros

Não se afete pelos outros, admita-os como outros para que você ganhe a consciência sobre sua parte com eles. Ser caridoso é também saber o que você é consigo, é estar aberto a lutar com o outro e morrer com ele. A morte da fraqueza e depressão, é ser amigo àqueles que precisam e tentar, o máximo que puder, ouvir e acreditar no outro.
Se a arrogância bater a porta, observe o que fez que despertou no outro suas flores, seus cardumes de potências, aquilo que você pôde fazer e despertar a constelação do outro. Deve se aceitar a sua pequenez no universo, porém que você faz parte dele e só isto representa que você poderá participar de toda a sua possibilidade limitada por você ser pequeno, porém, e aí está o encanto, por ser você.
Você será pro outro em muito o que você é consigo. Nossos símbolos são limitados, mas estarmos abertos, é caminho do infinito.
...
Seja amigo, o que não impede o inimigo, mas firma sua mão na batalha



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Ouvir é sacrificar a fala. Porém, quando nos comparamos com o outro, não com as ações ou força, mas com a banalidade, a putaria e a materialidade, a dor corrói o egoísmo, o pior deles, que é a ambição- o não entendimento de seus limites, que é o que constituirá nós mesmos


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Entre minhas rugas, corre um menino, porém com dor nas costas.


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Nunca fui um homem, uma pessoa. Sempre o estranho, o esquisito, ou no mínimo o inteligente... Um sujeito apenas adjetivo, fui um símbolo, mas a solidão permanece. Apenas eu como alguma pouca coisa pra alguém e a realidade, o resto, me traz a dor do nada.

domingo, 17 de fevereiro de 2019

Três aforismos, Flores de Emma, Trecho de sexo, Fome

Amigos são pilares que sustentam o céu

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Em nossas feridas podem nascer flores de aço

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Triste, porém, vivo

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Apenas sinta, meu amor
Apenas sinta, em seu corpo que adormece
Em seus olhos que se mexem, sonhando em quando éramos jovens
Ou quando éramos um simples corpo
Em busca do infinito?
Descanse, meu pequeno pedaço de céu
Enquanto te vejo aqui, nesta cama fria
De um mundo mais frio
Pois, meu sol está indo embora
Mas, ele está no meu peito
Em busca do infinito?


Apenas sinto, meu amor
Minha pequena Emma, nossos anos acumularam
Nos dedos enrugados selados numa aliança
De uma liga metálica
Que preenche todo o vácuo de nossas vidas
Apenas sinto, meu amor
Por todas as desculpas, por toda aquela palavra que não pude dizer
Mas, que agora é apenas um pequeno nada
Frente a nós, simples poeira, das estrelas
Do universo de tudo que existe
Em busca do infinito estava?
Toda e qualquer estrada, tem suas feridas estancadas
Quando nascem as flores de aço

Durma, que eu sonharei sempre contigo
Até nos vermos
Emma
De seu pequeno, Romeu, aos 78 anos

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O homem que jamais sorriu
Triste, porém vivo
O aço de sua face, festim das chamas
Olhava cinicamente
A mulher a sua frente
Perdida na solidão do desejo
Apenas entregava seu corpo
Queria entregar tudo para ele
Jamais sorrindo
Já não mais ela perde-se
Encontram-se
Furiosamente
No duelo do deserto de seus espíritos


Cai o raio de sol, corta seu rosto, o homem, com o calor
Treme a mulher, pelo fio condutor do suor
Um beijo sela, aquele ato de ferver os mares aos céus
Numa única...
Encaixe cósmico

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FOME
SINTO FOME
Entre as estepes, cacei meus sonhos
De ser o imperador de toda a terra conhecida
Entre meus dois olhos!
Nos mares, cacei os tesouros
Escondidos nas ilhas mais secretas, das brumas
Dos cabelos daquela pessoa mais linda
Nas cidades mais cheias de gente,
Pensei ser eu alguma coisa, quando não era nada!
SINTO FOME
E ela é de vida
Viver em cada momento uma vida, gastar à força meus anos
Consumi-los numa fagulha
Nenhuma vela acendeu
Nenhum foguete se levantará
E a Guerra Mundial cessará
Nas sombras criadas pela luz
Síntese eletrônica de meu coração
SINTO FOME
Já somos máquina, robôs da história
Folias de outros reis
Espíritos que perseguem a si mesmos, exorcizando-se
No baile de máscaras que é o mundo
SINTO FOME
Das vidas que me fizeram querer
Mas, não ter


Assim, vomitou os anos o jovem com fome.

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2019

Homem na Lua, Viajante, Estrada da menina

Entre o espaço de seus olhos
Viajei por todos os oceanos, das profundas Marianas
Aos altos céus de Everest
Cruzamos os olhares naquela esquina de Paris
Naquele ônibus em São Paulo, na capital dos desolados
Na pequena estrada de alguma vila, em Portugal
Ou nas plantações de flores secretas, no Paquistão
Entre o espaço de minhas mãos
Te abracei e senti o toque do mundo inteiro
Me sustentando às pernas
Os ombros cansados se repousaram
Minha voz se calou
E eu viajei
Entre o espaço de seus olhar, com o meu
Meus pés se firmaram no solo
Caminhando por uma estrada de outro
De outros mais que caminharam
Que falharam ou governaram
Que venceram ou resistiram


Entre o espaço de seus olhos
Já não mais precisei me ver no espelho
Pois, estava completo, contigo
Vi eu mesmo


---


Saudação de um homem na Lua

-Dentro do seu corpo
Dentro de meu corpo
Um raio de fogo percorre do pecado até minhas entranhas
O festim de um foguete
Iluminando a noite escura
Aqui ao sul dos trópicos


-Te vejo vir, com seu jeito
Com seu todo o seu você
Não posso mais sentir ou demonstrar o que sinto
Calou minha boca
Fazendo falar a minha alma

-Também já não posso mais, resistir a tal fusão
Que traz a sua boca
Para a minha
Forja o aço de uma lança, que furou o céu
Que chega a até a Lua
...
Agora estou aqui, nesta terra pálida de cor açúcar
Como tua pele
Vejo a Terra, ela é azul, solidão verte dos mares
Mas, a força, a força de tantos que estão aí
Enterrados
Eu os sinto, eu os vejo, eu estou com eles
Estarei com eles, como estou contigo, Aquela que Olho

E na Lua, o Olhar se perdeu
Aquela que olhou, espera por ele
Assim como ele espera por ela
O tempo para para os dois
Quando vêem um ao outro
Mas, a Lua e as estrelas continuam em seus movimentos
Misteriosos

Dentro dos corpos celestes, haverá luz?
Dentro das vistas dos homens, haverá escuridão?
Agora estou aqui, nesta pálida terra cor de açúcar
Devaneios mil, azul de meu peito, cor anil

Minha alma fala
Quando a boca cala
E a palavra escreve




---
Caminha, jovem menina
Caminha, corre
Busca aquilo que falta no seu peito
Que a estrada se faz na caminhada
Na batalha que forja
Aquilo que na paz falta
Não desista
Continua
Que a vida é contínuo
Pode sofrer
Mas, ainda há pelo que sorrir
Sempre haverá
Sempre caminhará
Mesmo que com passos lentos na velhice
Ou afobados, na juventude
Fugindo d'onde está
Ou atacando com a carga de um cavaleiro
O inimigo a sua frente
Estará ali, menina
Dependente de seus passos


Agora, me abraça
Dorme bem comigo em sua cabeça
Pois, estou aqui contigo
Sou aquele que segura sua mão sempre
Que você precisa sempre estar contigo
Me vê no espelho,
E neste olhar amigo espera
Eu que sou você
Te fazer um pedido:
Continua e caminha
Que só na estrada se faz e se enfrenta o perigo

Vento


Eduarodo, nunca vai poder falar à ninguém
Vivemos no silêncio
Tumular de nossos sentimentos
Alguns apenas sentem demasiado
Isto é errado
O que não indica se é profano ou sagrado
Ora o que se sente transcende o habitual
É arte
Ora converte em espúrio, o banal
É grotesco
Porém, é silêncio que todos temos
Para com todo o outro
Não para com Ele, que tudo conhece
Se crê nisto
Em débeis frases congelamos o pouco
Do sentido que compreendemos
Alguns, com sua estrada, buscam
Fazer uma escada para o sol
Iluminar a tudo consigo
Outros, cavam a terra, em busca de dureza
E de pedra, erguer castelos e famílias
Outro erra, viaja como a água
Espalha continente, de sentimento
Eu, Eduarodo, apenas sou o vento
A brisa que traz algum alento
Alguma primavera
Mas, sou ar, so'vento
O vazio em que me atormento
Pura tempestade tumular
Daquilo que todos não podemos dizer
Daquele que não pôde mais amar.


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Suicidou-se
No copo de água que era sua alma
O inútil perdido na terra do tempo

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segunda-feira, 21 de janeiro de 2019

Se chorar e Escrever atormenta

Se chorar, canta um tiquinho
Se sorrir, guarda no espacinho
Em que brilhe seu coração
Uma lembrança boa
Uma nota bela


Anda, aguenta firme
Existe sol na janela
A esperar que te conquiste
Um pouco de sossego nesta vida
Um pouco,claro, de momento triste
Uma paz com você
Que insiste
Em ver eu
Como eu
Não sei ver

Anda, aguenta
Que o coração não arrebenta
Se durar mais um dia
Se mantém a sonhar
A fazer
À tentar
Canta a música da sua alma
Pela janela, o universo
Sorri meu abraço

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Escrever, uma atormentação
Seja dos diabos
Seja a firmeza divina que me sustenta
Sejam estas palavras entrecruzadas
Escrevo mal, pois não quero ser lido
Tenho medo da descoberta deste produto
Deste pó, deste egoísmo que é meu estilo
Meu pedestal de artista é mínimo
Poucos amigos, poucos sorrisos desperto
Nada tendo para criar, repito
Repito o que encontro no meu peito
É lá que acho minhas palavras
E em alguns poucos livros
E em muitas conversas
E em caros amigos
Não espero mais nada desta vida escrita
Não escrevo nada que não circule
Entre a amargura
Ela entra, se instala e me diz sempre:
-Você fracassou, garoto... Olha os outros
Olho, vejo sorrisos, vejo a vida
Mas, não há, duvido, não a vejo em mim
Escrevo palavras mortas, não para gente só viva
Mas, para quem está um pouco morto
Tento aluminar uma laterna, acender um cigarro, lhe dar um café
E cortando as linhas como estrofes, busco lhes dar um fundo, mínimo, é verdade
De que é possível, mesmo para um inútil como eu
Dar esperança:
Voem, cresçam
Esta é a palavra dos mortos, daqueles
Que fundam e firmam a terra sob seus pés
Vá, escreva
Vá, voe
São as linhas de um moço que no fracasso, ainda escuta o som do infinito.

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-Deita teu ouvido no chão, pequenino, ascuta... A voz daqueles que firmam teus pés, aqueles por quem trilha seus passos. Honra os mortos com as linhas que escreve, bastião, na tua estrofe no livro da vida (Eduardo Ricieri, Os 9 Castelos, 2025)

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Os contos de Dalton e os haikai de Leminski combinam com nosso calar de poucas palavras curitibanas. São parte de nossa paisagem Geográfica Literária...

quarta-feira, 16 de janeiro de 2019

Amadurecimento materialista

Amadurecer me aparenta, ou talvez seja efeito de nossos dias, perder a capacidade de chorar ou sorrir por qualquer coisa. E como coisa, digo que este efeito de empedramento do deslumbre se foca nas pessoas - e até em alguns casos, saudáveis, nas instituições -, mas, geralmente no círculo íntimo: vamos ficando com poucos amigos, vamos nos fechando na família, para aquelas que tem a felicidade de encontrar uma companhia amorosa, e não mais rimos ou choramos por qualquer coisa que alguém faça, não o ato em si da pessoa, mas sim o que nós pensamos deste ato.
Amadurecer é ficar mais íntimo de si, ver seus erros e, na maioria dos casos, lembrar mais destes do que dos acertos - ao qual, geralmente nos pensamentos religiosos pregam um agradecimento, no entanto, como não é chique hoje falar de religião (ou em uma dimensão espiritual), é considerado tolice -, transformando-nos em um efeito reflexivo gigantesco. Poucos passos não são dados sem as dores do passado, ou, minimamente as feridas do mesmo, se quando jovens não formos apresentados à aventura, a capacidade de batalhar - não o que hoje se chama de resiliência, ou, teimosia e falta de educação, na maioria dos casos -, tendemos a uma inércia.
Amadurecer, é emocionar-se com si mesmo, com o efeito do mundo externo que é produzido em nós: já não escutamos uma música, lembramos de algo com ela, já não rimos de uma piada (menos as de gags físicas), correlacionamos com uma situação que aconteceu em nossas vidas, não buscamos outros pontos de vista ou entender o outro, buscamos ver o outro pelo nosso prisma. Não nos movemos nem para imaginar que a outra pessoa existe, ela nos parece algo produzido, quando não achamos que o problema é nosso, apenas colocamos o outro em uma cápsula de raiva, ou é apenas um filho-da-puta.
Amadurecer é ser mais rígido, principalmente consigo, pensar mais em si, lembrar de si. Porém, não me aparenta isto ser um efeito contra a bondade ou a caridade, não, é um efeito da vida, de nossas feridas. Não poderia reduzir os efeitos da idade ou das vivências apenas à palavra amadurecer, porém, posso dizer que cada vez mais vejo esta amadurecimento se tornar, para além do pensamento em si, algo que chamo de um "projeto materialista". Tudo se compõe de acumular ou objetos, ou "vivências" (turisticamente falando) ou contas.
A isto se trata viver sendo "realista" como dizem, se fechar em si, nos efeitos que me produz algo, e dentro deste espaço diminuto em que eu existo, apenas me focar nas obrigações (familiares, de saúde, de trabalho, de administração do lar), ou seja, restritivas, naquelas das vivências, ou seja, àquelas ou socialmente aceitas como que agregam na memória, seja uma viagem, um namoro não usual, um desafio esportivo, etc., dadas como agregadoras ou cumulativas, e, finalmente, a acumulação de objetos, relatados aqui de forma larga, sejam pessoas, sejam coisas inanimadas, seja mesmo dinheiro, seja, finalmente, o status (a "coisa de ser alguém", "ser o fulano de tal", "doutor nisto e aquilo"), resultando em um efeito "possibilista", ou permutativo - emprestando um termo que ouvi na contabilidade -, isto é´, estes objetos se prestam a serem trocados externamente a nós, para que possamos nos "realizar", mais e mais, porém, sempre de uma forma temporal, sempre nesta vida.
Assim, a maturidade também traz, contraditoriamente, um grau de incerteza, ao qual, me parece, vai diminuindo com o tempo, talvez, na velhice e senilidade, períodos aos quais preciso ainda meditar. Se esta curva de incerteza aumenta até o momento de nossas doenças de ansiedade e depressão, não posso dizer, o vazio psicodinâmico é poderoso hoje e isto talvez tenha efeito nesta questão. Me restrinjo, neste comentário-ensaio, a dizer sobre o amadurecimento (dado hoje) como pensar-em-si, após os sofrimentos, um endurecimento do coração, e um acúmulo de restrições, agregados positivos e de meios, ou permutas, tudo em uma perspectiva que me faz muito lembrar da meta utilitária, da felicidade.
Queiram me perdoar a delonga, bom dia.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2019

Porta e mais 2 ou Anita e a Rosa Negra


PORTA

Abriu a porta, sem medo
Viajou pelo tempo
Até quando nasceu
Viu tudo que não fez
Fechou a porta
Convocou seus próprios demônios para uma guerra
Me abraçou e disse:
-Adeus, meu amigo


Eu lhe beijei a face
Entreguei-o aos romanos
Disse adeus
Me disse adeus

E em poucas linhas, toda a vida estava
Morta
Movimento transpassado
Pontos no céu, que chamavam de
Estrelas
Apagaram-se entre a porta
Que se fechava

Vi tudo que eu fiz
E tudo que eu não fiz, m'oprimia
Mais do que a extensão de mim mesmo
Perdi a guerra contra meus demônios
Perdi meus braços para abraçar
Vi o passado
Sonhei com o futuro
Temi o presente

Chego ao corredor, sigo para a próxima
Porta
Pelo próximo, adeus
Estaremos condenados à despedida?

Apenas agradeço agora
Apenas isto, estou vivo
Eu beijei-lhe a face, mas jamais
O entregarei
E nas poucas linhas, que fazem parte
De minha vida
Pude provar que estou vivo
Não mais, nem menos
A porta se fecha, eu agradeço
Obrigado por tudo.

---
CAVALEIRO

Com as últimas forças
O cavaleiro, deixa
Seu corpo cair
Queda.
Apenas traz pequenas
Chamas
Ao último suspiro
Caminhante
Por aí


Eu estava lá, eu vi
Quando ele voou
Entre as campinas, escreveu na rocha
Lascou a pedra com seu próprio espírito
Escreveu:
-Aqui jaz, um pequeno homem, num universo de tudo o que mais há, haverá e está, mas, um homem que esteve

Compreendi, que tudo o que as vezes vale
Ter vivido
Tudo o que viveu
Todo o sofrimento, toda a lágrima
Todo o sorriso, todo o caminho
Todo o encontro e batalha
Jamais sairá ou deixará

Então, eu, o algoz daquele cavaleiro
O enterrei com a honra que pude
Obrigado, meu amigo

---
ANITA

                      

Minha pequena russian girl
Esta flor vai pra você
Ela é cor do céu, o entardecer
Vermelho como meu sangue, quente
Como teu abraço
Mas, jamais tenho algo mais para te dar
Desculpe a pobreza
Anita
Seu sangue agora é óleo
Sua pele, metal
Seus olhos, ainda me vêem
Mas, eu poderei vê-los?
Sou capaz de muitas coisas, cacei em mil mundos
Cacei muitos na minha mente, outros com minha lança
Encontrei tesouros, outros perdi
Encontrei um coração em uma máquina
Chamada gente
Não mais encontrei pessoas
Cada vez com mais óleo que sangue
Metal que pele
Cada vez mais sozinhos em si mesmos
Não percebi, Anita
Eu estava sozinho


Procurei por um mundo inteiro
Procuraria pela galáxia
Mas, não preciso, não mais

Aqui está o meu presente pra você
Uma flor
Uma rosa da noite
Pregue teu espinho, serás novamente humana
Me desculpa, Anita
Já não estar mais contigo
Alguns tesouros, precisam
De tempo
Outros, jamais se encontra
Mas, se vive com eles, ainda
Dentro da gente

Aqui está, Anita
A rosa que me tornou gente
Viva bem, abra o mundo
E se um dia sentir que uma destas não-gente
Te olhar com olhos verdes perdidos
Saiba, lembra do meu nome
Cuida do meu ser
Anita
Um beijo

terça-feira, 8 de janeiro de 2019

Céu Vermelho

O céu está vermelho
Meu peito está preso
Em um lágrima perdida
Dentro do meu próprio oceano
De outras lágrimas
Caladas
Seguro, no último ponto do meu bote
Olhando para o Céu
Olhando para você, sol que cai de volta ao horizonte
Já não posso apenas deixar de ver
Sentir, ouvir
Nada nos sentidos, ocupa apenas um momento, mas, todos aqueles
Todo o tempo, todo o vento
Da brisa a tempestade
O peito preso do grito
Grito de liberdade
O Céu está vermelho, meu sangue corre por ele
E no mar noturno, escuro como o meu interior
Brota a luz
Brotará a minha força
E já não mais ficarei apenas dependente dos sentidos
Ainda há como navegar, e sempre será preciso
Navegue pelas nuvens
Navegue pelos corpos
Navegue pelas palavras de carinho
Fortaleça o mundo, derrote sua tristeza
Convivendo com ela
Naquele mar profundo, naquela minha mão que segura o bote
Naquele céu que está vermelho
Crepúsculo


sábado, 5 de janeiro de 2019

Sabiá


Sabiá que voa pelos mares
De Lisboa
Encanta meu caminho náufrago
Destes mares tempestuosos do Atlântico Sul
Já não posso mais navegar como antes
Ai de mim seguir esta minha pirata vida
Entre os portões de chamas
Os trovões dos incultos
As espadas cantantes

De sua voz
Sabiá
Única lembrança
Daquilo que nunca fui, sendo
Eu te vejo crescer, entre as campinas, as ravinas
Te vejo em meu barco naufragar em meu próprio fosso

Mas, limpo o meu chapéu
As botas mais secas
O ar do mar invade meu peito
O som das batidas do coração
São os mesmos
Da batida das ondas
São o tocar da viola
Cantando uma canção qualquer
Clara, limpa, mais forte

Mais velho, estou
Muitos nãos foram dados por várias mãos
Mas, nunca me foi negado o mar
Por ele sigo, de Lisboa à Cabo
Do Cabo à Bombaim
De lá, até Pequim
E chego aqui, na tempestade d'mim
Pra te ouvir de novo, sabiá
No peito peito, cantar