sexta-feira, 6 de dezembro de 2019

Poucos lerão

Um bom leitor, com sua experiência acadêmica e mesmo sua elevação filosófica, pode não ter nada de bom escritor. Saber como dizer algo, como um elaborado passo de dança, ou um rocambolesco verso, um filme arrastado pode, ao final do julgamento do tempo, passar como uma mera febre.
Há algo na humanidade de febril, a novidade, vence nos primeiros rounds, passando a ser uma certa ressaca, azeda e trintona, cheia de ressentimentos pelo que nunca foi, cega sobre o que é. Porém, existem escritos, que com a sorte de bons editores e que suas bibliotecas não fossem queimadas - o que dá a verdadeira Arte e Literatura certo grau de Fortuna -, que atingem algum ponto do entremeio humano, naquele ponto em que a consciência está nos passos de certa eternidade, ou mesmo que um grande monstro está se criando... É ali que reside a atemporalidade de uma obra, em captar, muitas vezes contemplativamente em biografias (mesmo de personagens), 'panfletariamente' para algum fim específico que é distorcido ou mesmo, pelo puro ato do acaso, do acidente.
Ler bem não garante a celebridade da obra, garante a libertação do leitor, são dois atos diferentes do espírito, um que se abre, outro que esculpe. Às vezes, uma imagem singela, outras, um grande palavrório rebuscado e que se torna um belo elefante de louça. Logo, sinto que existem muitos que escutam, poucos que poderão falar mais do que a sua vida ativa e madura, uns vinte anos no máximo, permitir, cabe aceitar o silêncio. A boa leitura é uma das tecnologias do silenciar-se.
E, no Silêncio, lutamos o mistério.

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