sábado, 16 de abril de 2011

Um dia no banco #Agentes do Caos

 Estávamos eu e Ricardo no carro, modelo antigo, eu de tênis de pano preto, ele seduzindo... Muito amor corria por aquela cena... Como suor, lágrimas e risos. Dirigia, eu, com a metralhadora... Sempre me lembrou um "T", a forma desta arma, não sei, talvez seja o ácido. A festa, a paixão.
 *Isto foi às 9 da manhã, perto do centro.*
 Lá estou eu... Sentado no banco do banco, trinta anos de serviço hoje, segurança respeitável, de bigode branco e três netos, estou feliz, mesmo minha velha com tossinha e eu com esta dor nas costas desgramada! Arma 38 pesando, estranho, acho que é a idade... Tanto tempo de trabalho, nenhum tiro... Bom.
 *Isto foi às 10 da manhã, no Banco Rapina SA*
 Ai minha Nossa Senhora! Tenho que comprar as roupas dos meninos! Num sábado quente, chato e mormaço por tudo; eu aqui, sapato de salto, vestido vermelho, ai como esta horrível! Por que não o de bolinha! Lá vou eu, tirar meu dinheirinho do trabalho da madame, depois, calças boca de sino... Onde é que vamos parar? No meu tempo nossos bailes de formatura, quando tinha, eram com terninho e vestido e, as vezes um casaquinho! Este meu filho Ramiro! Só tá fazendo isto pra aquela safada da Ana!
 *Isto, às 10 e 15 da manhã, numa rua movimentada do centro, próximo a um banco*
 Enfim, estava eu lá: Banco Rapina SA, rua Cândido Anjo, centro, quase 10 e meia... Esperando encontrar certas pessoas que me levariam ao tal Mestre... Era minha missão, deveria cumpri-lá, encontrar o tal Panda Vermelho, eliminá-lo! Sei que era difícil, mas tinha que tentar!
 Minha barba coçava e pensei em ir embora, já há duas horas esperando, o velho guarda já me olhava estranhamente... Na pasta, nada de mais, só uma pistola e uma granada, eu era do Maio Vermelho, mas, era mais dos Agentes, deveria cumprir minha própria missão -quero liberdade destas coisas!
 De súbito, entraram dentro do banco dois caras, um maior, mal encarado, outro, menor, mais frágil... Este segundo tinha uma maleta grande, o outro, era mal educado, empurrou uma velha de vestido vermelho...
 A velha esbravejava...
 De repente, o grito: "-Isto é um assalto!", muitos gritos se seguiram, o velho pegou sua arma, o mal encarado colocara sua mão no bolso interno, tirou a pistola e liquidou o senhor... Eu abaixado e perto do antes vivo guarda, vi em sua face com grande bigode branco as manchas de sangue espalhadas... Triste...
 Pensei na arma na pasta
 O mal encarado pegara a velha que antes falava aos montes de refém, o mais frágil, sacou uma metralhadora da bolsa, gritavam por dinheiro, a atendente respondera ao pedido... A ordem, na verdade. Colocava as notas e os dois mais irritados, eu, com a pistola da pasta na cabeça: e se...
 Alarme toca, o gerente acionara, os dois bandidos são amadores, porém, viram o gerente fazer o sinal, o botão embaixo duma mesa. O frágil pula o guichê e, com olhos brilhantes, descarrega nele e em outra funcionária... Pânico.
 O seu amante mal encarado berra em reprovação: "Temos que ir! Chamamos a atenção!!!"; o outro, ainda meio desnorteado de sua chacina, demora entender, mais pega um monte de pacotes de dinheiro, o outro, também, começam a ir pra porta... Vão passar por mim, eu...
 *Cheiro de incenso no ar*
 -Olá! -Me diz com sotaque francês. Viro pra trás, pras cadeiras e me espanto: um homem com cabeça de gato preto! Terno e coletes pretos, cara de gato preto, só os olhos, isto sim, mudavam de cor... Eram cinzas.
 -Meu nome é Neuf, e sou seu contato. -Me diz o ser.
 -O quê?
 -Seu trabalho, lembra? Deveria ficar quieto... Só isto... Este é o jeito, este é o recado.
 Percebi erros.. Comecei a lembrar que há coisa no mundo que não controlamos, tudo, na verdade, não há controle, não há ninguém por aí... Há Caos? É isto? Devo me ater ao que então?
 Fiz esta pergunta a ele: "-Devo me ater ao que então?"
 Já tinha saído...
 Eu ouvi tiros, sirenes haviam tocado... Levantei calmamente, vi a cena tranquilamente, como a um filme: o frágil corria pra dentro de novo, ele chorava, a metralhadora zuniu perto da porta, ele correu mais um pouco, vi ele lateralmente... Pápápá!
 Tiros fizeram ele se contorcer, ele derrubou a arma, caía... Andou metros, até mim, caiu em meus braços, chorava... Vi o medo, vi seu erro, vi sua paixão... "-Amo Ricardo...", ouvi ele dizer... Guardas entravam, militares e civis, com suas metrancas, pedindo para sairmos...
 ...
 Engraçado, levantei, deixei ele lá, minha roupa ensanguentada... Só pensei na Mariazinha, lembrei que amei ela uma vez... Deixei minha pasta lá, com a arma, granada e papéis do grupo... Possivelmente, achariam aquilo e diriam: "Terroristas", meu amigos estavam ferrados... Eu seria perseguidos pelos dois lados... Mas, e daí, estava aéreo naquele instante, estava muito estranho... Acho que descobrira algo, e não era a roda...
 A liberdade, enquanto passava pelos corpos da velha e do mal encarado, era estranha, cada um tem uma história e cada um se perde nela, como uma ópera trágica e estúpida, uma comédia pros outros... Caminhamos por ali e acolá, sem muito o que fazer a não ser caminhar...
 Eu segui a rua, caminhando, triste pelas perdas, na verdade, feliz, por não me perder... Ao menos, não perder o meu corpo...
 "E as metralhadoras cantaram", como ouvi uma vez.


 MUSIQUETA DA POSTAGEM

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